“Episódio Moro” revela: Direita já busca repertório para um novo Golpe de Estado

“Episódio Moro” revela: Direita já busca repertório para um novo Golpe de Estado

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As peças do tabuleiro já começaram a se mexer na guerra que se trava no Brasil, conflito iniciado há praticamente dez anos. Partindo das Jornadas de Junho de 2013 como parâmetro do início deste acirramento das tensões históricas, sociais e econômicas do Brasil, já podemos estabelecer alguns critérios analíticos fundamentais para tornar a complexa realidade brasileira em algo inteligível. E este conflito se dá naquele que é um dos países mais importantes do Mundo atual, membro dos BRICS e completamente imbricado numa disputa internacional de poder. Isso significa que os acontecimentos políticos domésticos não são fenômenos isolados, também estão subordinados ao aumento das tensões geopolíticas internacionais. Este dado é importante de ser colocado em relevo porque muitos brasileiros não possuem uma visão ampla do quadro político brasileiro.

É claro que, assim como em qualquer sociedade contemporânea Mundo afora, as lutas dos variados interesses materiais da população brasileira se manifestam no emaranhado de situações-problema nas altas esferas do poder institucional. Entretanto, o que foge ao olhar de muitos é que os conflitos locais estão interconectados com um quadro geral, de natureza geopolítica.

A percepção de que a Direita reagiria cedo ou tarde de maneira articulada para derrubar todo e qualquer governo de inclinações populares ou nacional-desenvolvimentistas já é de conhecimento da Esquerda muito antes do desfecho das Eleições de 2022. Se preferir, para a maioria dos historiadores, essa noção já é compreendida “desde sempre”. No que se refere ao entendimento político mais recente da parte mais consciente da população brasileira, o esclarecimento de que impera uma luta de classes regional e global vem desde a experiência histórica vivida com o Golpe de Estado de 2016 (hoje reconhecidamente um dos maiores casos internacionais de Guerra Híbrida aplicada num país do porte e magnitude do Brasil). E como toda e qualquer Guerra Híbrida (conceito importantíssimo na política contemporânea) as manobras políticas mobilizam não somente um número gigantesco de articulações e vetores de ação como também apresentam um custo total ao Capital financeiro considerável. Ainda assim, um Golpe de Estado via Guerra Híbrida costuma ser muito mais barato e prático que um Golpe Militar clássico que é uma modalidade de ruptura vista como defasada (pelo menos este é o entendimento que o Pentágono tem da guerra global desde ao menos a década de 1990). No período pós-Guerra Fria, um Golpe Militar clássico é jogada arriscada e perigosa pela instabilidade que esta pode desencadear e os custos físicos e materiais dela decorrentes.

Na era da Guerra Híbrida, mais do que a ameaça física para impor os interesses da classe dominante sobre a classe dominada (a classe trabalhadora no seu geral), o grande ativo não é apenas o monopólio da ameaça física propriamente dita e sim o controle da opinião pública. Ganhe a opinião pública e jogue com ela, atire-a contra seus adversários e manobre a situação por meio dos vetores já existentes e vistos como soft power como imprensa, algoritmos de redes sociais, Congresso e Sistema Judiciário. Controlar e manobrar todo este corpo de informação e ação (um controle que somente as elites econômicas dispõem) é a grande sacada para atingir os objetivos almejados. O Golpe de Estado de 2016 que teve por objetivo interromper a revolução silenciosa que se delineava no Brasil rumo a um caminho de soberania nacional, maior distribuição de renda, direitos sociais em ascenso, desenvolvimento de infraestrutura e até mesmo autoestima da população foi uma Guerra Híbrida que não se estabilizou por completo. Tanto não se estabilizou que parte da Burguesia se viu obrigada a recuar para impedir que a crise do Golpe levasse o país a desmoronar numa convulsão social generalizada. E quando falamos em “desmoronar” não há melhor exemplo a ser citado que o próprio ex-Juiz responsável pela Operação Lava-Jato, Sérgio Moro que desmoronou perante a opinião pública e até mesmo dentro da esfera do Direito quando o escândalo da “Vaza-Jato” foi revelado, ou seja, a Operação Lava Jato como já se suspeitava era um jogo de cartas marcadas idealizada pelo Departamento de Justiça dos EUA em parceria com setores brasileiros dispostos a derrubar o governo do PT e prender o principal líder de esquerda do Brasil, Luís Inácio Lula da Silva. Ocorre que o escândalo embora abafado em partes contribuiu também para o desgaste e derretimento da situação do Brasil após o Golpe de 16. Diante disso era melhor esfriar o ambiente antes que a coisa saísse do controle. Provavelmente é exatamente isso que setores da Burguesia golpista calcularam quando decidiram apoiar Lula e não Bolsonaro nas Eleições de 2022.

Ocorre que as Eleições passaram e a descompressão do ambiente se fez presente. Em que pese os ocorridos de 8 de janeiro (tentativa constrangedora de Golpe de setores alucinados) a Grande Burguesia calcula que a melhor alternativa para o momento é aguardar a conjuntura para uma nova ofensiva. Entretanto, para preparar e pavimentar a estrada para esta nova ofensiva é necessário colocar em marcha os ingredientes para escrever um novo roteiro. Tão logo o segundo turno do pleito eleitoral de 2022 passou e grandes veículos monopolistas de comunicação como CNN Brasil e num grau mais tímido o Império Globo já começaram, da noite para o dia, a mobilizar uma narrativa de desestabilização do governo Lula. O movimento repentino de mudança na tônica editorial destes jornais foi tão chamativa que o governo Lula não tardou a perceber que está novamente no centro do olho do furacão e tenta responder as provocações da mídia hora de maneira cautelosa e estratégica ou hora de maneira direta e assertiva. Não houve até o momento uma única semana sem que estes grandes veículos de comunicação não pautassem riscos de “rombo fiscal” do governo Lula com o objetivo de jogar o telespectador desinformado médio (o famoso palpiteiro de condomínio paulistano) contra o Partido dos Trabalhadores.

Junto com esta série de ataques semanais, o Banco Central sob o controle de um dos remanescentes do Bolsonarismo no poder – Roberto Campos Neto – utiliza o órgão público para corroer o governo Lula por dentro a partir da injustificada Taxa de Juros a 13%, uma das maiores do Mundo sem que haja a real necessidade disso. Mas o sinal de que a ofensiva deve ser agora intensificada partiu após a recente entrevista de Lula ao portal de esquerda TV 247. A entrevista acompanhada de perto pelo poder econômico brasileiro que pressiona dia e noite por uma “âncora fiscal” do governo, Lula demonstrou publicamente todo o seu descontentamento com os setores que o golpearam e o encarceraram. Falando com a audiência do 247, uma audiência grande e crítica que cresceu muito no período do Golpe de 16, Lula indicou que tomará medidas assertivas contra a privatização da Eletrobrás e, para desespero dos setores que apoiam os EUA, indicou que irá novamente estreitar os laços do Brasil com a Rússia e a China (relação que estava em baixa desde o Golpe de 16 coordenado pelos EUA). Estas falas não só enfureceram a Burguesia como já provocou a primeira grande ofensiva desta, a acusação via insinuações da imprensa de que o Partido dos Trabalhadores teria “relação” com o crime organizado. O episódio de Moro supostamente ameaçado pelo crime organizado é a primeira grande plataforma de sensibilização da opinião pública para agredir Lula e o PT. Esta é uma tática velha mas que a Burguesia ainda vê como promissora haja visto que muitos brasileiros médios incapazes de entender a luta que se trava no país ainda são altamente vulneráveis a cair nesta armadilha moral que é acreditar nesta “trama policialesca” de que o PT teria conluio com PCC e etc. Reparem que se trata mais uma vez da velha tática que já foi vista nos episódios do sequestro de Abílio Diniz em 1989 (em plena corrida Eleitoral de 1989) e do episódio do assassinato de Celso Daniel pelo crime organizado, ou seja, martelar dia e noite uma suposta vinculação de Lula com a bandidagem. Estas palavras fortes e de efeito soam como feitiço aos ouvidos da classe média idiotizada do país.

Mas ao contrário do Golpe de 2016, a Burguesia terá que remar muito para conseguir um novo Golpe via Guerra Híbrida. A experiência que os brasileiros conscientes e politizados já tiveram de 2016 foi didática e valiosa, a experiência serviu para desnudar a fábrica de mentiras e manipulação de vários setores do país que tentam levar o Brasil para o abismo em meio a tensões geopolíticas internacionais cada vez mais críticas. Não passarão!

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