Pastores relatam perseguições e até ameaças de morte por voto em Lula

Pastores relatam perseguições e até ameaças de morte por voto em Lula

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“Hoje eu sou um pastor de certa forma isolado”, diz Usiel Carneiro de Souza, 59 anos, à frente da Igreja Batista da Praia do Canto, em Vitória, no Espírito do Santo. Ele conta que vem sofrendo perseguições e chegou a enfrentar um processo judicial que pedia seu afastamento do cargo, por assumir voto na esquerda.

A Agência Pública conversou com pastores e lideranças evangélicas, de várias denominações, entre elas batistas, assembleianos, presbiterianos, pentecostais e neopentecostais, que relataram sofrer represálias por declararem voto no ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nestas eleições. Eles representam um grupo dissidente dentro do eleitorado evangélico, onde Jair Bolsonaro (PL) lidera.

Na tentativa de conquistar mais apoio dos religiosos, Lula assumiu compromissos como o respeito à liberdade de culto, respeito à família e o combate às drogas, em uma carta aos evangélicos, apresentada nesta quarta-feira (19). Mas o atual presidente ainda conta com apoio das cúpulas das principais denominações brasileiras, como a Assembleia de Deus, maior denominação evangélica do país, cuja principal convenção apresentou resolução para punir pastores que “defendam, pratiquem ou apoiem” pautas de esquerda.

Os casos localizados pela reportagem envolvem processos judiciais contra os sacerdotes, afastamento dos pastores de suas funções, constrangimentos, ataques e xingamentos nas redes sociais, e até ameaças de morte. As pressões sofridas causaram adoecimento psicológico para alguns dos entrevistados. Eles também disseram temer pela própria vida e dos seus familiares. Com medo de represálias, alguns pediram para ter suas identidades preservadas.

Por causa dos ataques envolvendo política, o pastor Usiel passou três meses afastado dos seus compromissos na igreja, no começo deste ano, e começou um acompanhamento psiquiátrico com uso de medicação. “Os xingamentos chegam na maioria das vezes pelas redes sociais. Minha postura é de não trazer temas de eleições ao púlpito, até porque tenho membros que votam em Lula e em Bolsonaro. Tenho meu posicionamento pessoal na minha rede pessoal, onde posto sobre política”, explica.

Em uma postagem no Instagram, no dia 12 de outubro, intitulada “Lula ou Bolsonaro? Cristão ou Comunista?”, o sacerdote escreveu: “Não sou Lulista, mas segundo minha visão política o reconheço como melhor opção para os próximos 4 anos. Isso faz de mim um comunista? De forma alguma.” Entre os comentários críticos, um homem respondeu em tom ameaçador: “melhor se arrepender, Jesus está voltando e os ministros da palavra serão mais cobrados no juízo final”.

O pastor Usiel também enfrentou um processo judicial por divergência política. Ele conta que em 2020, dois anos depois da eleição de Bolsonaro, um grupo de 30 membros [a igreja dele tem 500 membros no total], todos apoiadores do atual presidente, foi à Justiça pedir o afastamento dele do cargo. “Eles fizeram um dossiê contra mim pedindo minha saída. Me caluniaram, me acusaram de desvio doutrinário, esquerdista, comunista. Também de que eu estaria desviando recursos da igreja”, diz.

A ofensiva encontrou apoio da Convenção Batista do Estado do Espírito Santo, o principal órgão da denominação no estado. O afastamento do pastor da congregação só não aconteceu porque a outra parte da congregação se posicionou a favor de Usiel. Eles assinaram uma carta de membros contra o posicionamento da convenção e do grupo bolsonarista, que diz: “Se pela voz injusta e colimadora daqueles poucos esta Comissão se sente motivada a acolher suas queixas e agir, esperamos e solicitamos que, pela voz de inúmeros irmãos, que esta Comissão respeite as decisões da IBPC [Igreja Batista da Praia do Canto] tomadas corretamente por nosso Conselho e mostrem respeito pelo nosso pastor, cujo ministério tem ricamente abençoado nossas vidas.”

O grupo bolsonarista terminou deixando a congregação e respondendo a processo disciplinar do Conselho Batista. Mas, este ano, com as eleições, o pastor diz que voltou a sofrer ataques e coações. Ele conta ter visto ex-membros da igreja filmando o culto. “Como se quisessem me incriminar”, narra. “Minha preocupação é essas situações saírem do ambiente virtual e virarem violência física”.

Nestas eleições, o caso de outro pastor batista, Sérgio Dusilek, do Rio de Janeiro, se tornou símbolo da perseguição a cristãos de esquerda. Ele sofreu pressão para renunciar à presidência da Convenção Batista Carioca (CBC) depois de participar de um encontro de Lula com evangélicos em São Gonçalo, na região metropolitana do Rio, realizado em um ginásio de um clube, no dia 9 de setembro. Na ocasião, Sérgio disse que “a igreja tem que pedir perdão ao presidente Lula”. O vídeo com a declaração viralizou.

*Com Brasil de Fato

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