Na abertura da aula aberta com Lula e Haddad na FFLCH USP, Mauricio Terena, indígena mato-grossense fez uma fala significativa: “Se hoje faço doutorado na USP, é porque em 2014 pude fazer faculdade com FIES sem fiador”. A lembrança das políticas públicas, especialmente as educacionais, embalaram a aula do presidente e do ministro da Educação dos governos petistas.
Quando o nome de todos os professores e políticos presentes foram anunciados, as reações variaram de intensidade conforme a personalidade anunciada. Gritos e muitas saudações positivas para Guilherme Boulos, uma pequena vaia para Márcio França e uma estrondosa salva de palmas para Luiza Erundina.
Haddad relembrou sua atuação como ministro da Educação e falou do “brilho nos olhos das pessoas a cada inauguração de campus universitário federal no interior do país – muitos deles em cidades de 100 mil, 200 mil habitantes”.
O candidato a governador lamentou o elitismo da universidade pública: “Não tive colegas negros na minha graduação em Direito aqui na USP. 30 anos depois, é bom ver essas instituições se transformando”. Haddad comentou de como queria muito que Lula visitasse a USP.
Lula começou sua fala fazendo uma comparação direta entre os projetos de país em disputa: “vamos decidir se o Brasil vai querer um país que distribua livros ou faça propaganda de armas”. Segundo Lula, “esse país já provou que pode ser bom. Se nós nos omitirmos, o Brasil irá repetir o último resultado, um país que era a sexta economia do mundo e virou a 13a”.
“Tinha medo do país quebrar na minha mão e nunca mais deixarem um peão ser candidato a algo. Nós reduzimos a inflação a 4% e reduzimos a dívida pública de 70% para 40%”, continuou Lula. Para ele, o país está pior do que há 20 anos atrás: “Antes, 90% dos trabalhadores recebia aumento acima da inflação, agora 90% nem a reposição inflacionária consegue”.
No momento mais dramático da aula aberta, Lula falou da fome no país e não segurou o choro: “Não vai ter mais mulher na fila do osso, vai poder comprar carne para comer. Não vai ter mais família comendo carcaça, vai comer frango. As pessoas não vão estar mais na rua pedindo comida, pedindo esmola. Criança dormindo na rua… a gente tinha acabado com isso”, afirmou.
Marilena Chauí, professora de Filosofia da FFLCH, foi a primeira docente a falar. “Temos 680 mil mortes por covid, 33 milhões de pessoas passando fome e 22 milhões desempregados”, enumerou. “A covardia é a mãe da crueldade. Isso é a justificativa das ações de Bolsonaro”, disse ela, citando o Discurso da Servidão Voluntária, do filósofo francês Etienne de la Boétie.
“Hoje, há um ódio ao pensamento no Brasil. É algo deliberado em não distinguir a verdade da mentira e isso produz um governante cínico”, disse Marilena, continuando a citar o pensador francês. “Precisaremos institucionalizar todo o governo, remontar políticas públicas, estabelecer um Legislativo sem compra e venda”. Será preciso reconstruir o Brasil, resumiu a filósofa.
De acordo com Marilena, “cabe a nós, de esquerda, comunicar ao povo quem lutou para que o Auxílio-Brasil fosse de R$ 600. Os dispositivos eletrônicos são pequenos, mas podem ser usados para erguer nossa voz”. “Essa recuperação será lenta e gradual, erguer a Economia para recuperar direitos sociais”, disse ela ao final de sua fala.
Ermínia Maricato, professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, falou sobre o papel da universidade na defesa da democracia e na formulação de programas de governo. “Precisamos mergulhar nos problemas concretos da população. 85% das construções no Brasil não tem participação de um arquiteto ou engenheiro. É quase um artigo de luxo”.
Com experiência na área de planejamento urbano, Ermínia arrancou aplausos da plateia ao falar da brutal urbanização sofrida pelo país nos últimos 100 anos e da falta de saneamento básico. “Em 1920, 80% da população vivia no campo, hoje é o inverso. Só 40% do esgoto é tratado e metade das moradias ainda não conta com saneamento básico”, lamentou Ermínia.
Ao final de sua aula, a professora da FAU enfatizou a importância de políticas de inclusão social e racial na Universidade, principalmente na USP. “Quando entrei aqui em 1967, tive um colega negro e uma aluna negra. Em 2022, são pelo menos 80 negros como docentes ou alunos da Faculdade de Arquitetura. É uma marca importante”.
Já a professora Adriana Alves, do Instituto de Geociências, falou de como seu trabalho estuda o impacto da urbanização. “Sou uma das primeiras docentes negras da USP e, enquanto geóloga, estudo eventos de destruição em massa causados pelas mudanças climáticas”. Numa analogia com seu campo de estudo, Adriana diz que o governo Bolsonaro é como pedras, rochas no caminho da democracia”, disse a professora.
“Negros são apenas 16% dos senadores, 24% dos deputados federais, 33% dos prefeitos. No judiciário, o quadro é ainda mais dramático: são apenas 12% dos magistrados são negros. Por outro lado, negros e pardos são 67% dos encarcerados no Brasil”, finalizou Adriana.
*Por DCM