Moisés Mendes – Peões do campo da Fronteira gaúcha sabem o que Lula está tentando fazer com suas falas mais incisivas desta semana. Lula está tentando puxar o tatu pra fora do buraco.
Na quarta e na quinta, em Porto Alegre, Lula bateu com força em Bolsonaro, talvez à espera de uma reação menos óbvia do sujeito que tem sido um agressor previsível e repetitivo.
Na quarta-feira, em reunião com educadores, antes do grande encontro no Pepsi on Stage, Lula disse, sem precisar citar diretamente Bolsonaro:
“Quando a gente não pode se aproximar do governante, quando o governante tem um lado, um lado obscuro, porque a gente não sabe a qualidade de todos os milicianos dele, o que a gente sabe é que gente dele, sabe, não tem pudor de ter matado a Marielle”.
O entorno de Bolsonaro reagiu com gritaria, mas Bolsonaro ficou quieto. Até porque são muitas as suspeitas da ligação de envolvidos no assassinato da vereadora com grupos de milicianos que estão em volta da família.
Na quinta-feira, em encontro com o pessoal da área da cultura, Lula atacou de novo, mais uma vez sem citar o indivíduo, para não ter que pronunciar seu nome:
“Não é que o Alckmin não me criticasse e eu não o criticasse. A gente fazia críticas como amigos que jogam bola. Dá botinada, pisa no pé, chuta a canela, mas a gente é civilizado e continua conversando. É isso que é democracia, que esse fascista que chegou ao poder não exerce”.
Mais adiante, disse:
“Uma pessoa que nunca derramou uma lágrima por 600 mil pessoas que foram vítimas de Covid e que ele tem responsabilidade pelo menos por metade porque foi negacionista. Porque criou no ministério com o general Pazuello uma verdadeira quadrilha de comprar e de negar vacina. Que família esse cidadão está falando?”
E foi indo:
“O que tivemos não foi um presidente, foi uma praga de gafanhotos que tomou conta deste país e que destruiu a cultura, a educação, o emprego e a economia”.
E então atacou diretamente os fascistas:
“Um presidente que não faz um gesto para entregar um livro para uma criança e faz 50 gestos para entregar armas para fascistas e para milicianos”.
Lula decidiu que é o momento de dizer o que pensa, inclusive com recados ao mercado financeiro.
Como disse no encontro no Pepsi on Stage que não tem medo de afirmar que não deseja um Estado fraco, mas um Estado forte que proteja a população.
Ao mercado comprador de estatais disse que os interessados na Petrobras e na Eletrobras terão que “conversar conosco” depois da eleição. Lula deixou claro: quem comprar as duas empresas pode enfrentar problemas mais adiante.
É uma jogada de alto risco, na visão do capitalismo predador, porque Lula quer dizer que pode questionar contratos. E contratos, diz o liberalismo, são os mandamentos dos deuses do mercado. Quando favorecem o mercado.
Mas Lula vem falando tudo. A intenção em relação a Bolsonaro, ao falar tanto de milicianos, é dar um recado político aos que estão ao redor de Bolsonaro, entre os quais os militares.
Lula diz a eles que, ao ficarem ao lado de Bolsonaro de forma incondicional, estão também por perto de milicianos envolvidos com crimes e com a morte.
Ao mercado, Lula manda dizer o que todo mundo sabe. Se o mercado tivesse grande poder de interferência na política numa campanha eleitoral, teria aplainado a pista para a campanha de Henrique Meirelles em 2018.
Mas o mercado não tem voto. Tanto que um cabo, o Cabo Daciolo, teve mais votos em 2018 do que o general Meirelles do mercado financeiro.
Lula sabe que o mercado é muitas vezes apenas um cão latindo.
Publicado no site Jornalistas pela Democracia