O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), indicou pelo menos R$ 357,4 milhões em emendas do orçamento secreto a municípios de Alagoas nos últimos dois anos. O valor é o equivalente a quase 20 vezes mais do que os deputados tiveram direito de sugerir nas emendas individuais impositivas de 2021, cujo limite era de R$ 16,2 milhões.
A maior parte dos recursos foi pedido para redutos eleitorais de Lira, entre eles o município de Barra de São Miguel, cujo prefeito é Benedito de de Lira (PP), pai do presidente da Câmara. Com cerca de 8,3 mil habitantes, a cidade praiana foi beneficiada com pelo menos R$ 5,5 milhões de empenhos das emendas de relator.
As informações constam em ofícios enviados por Lira ao presidente do Congresso Nacional, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que, por sua vez, os remeteu ao Supremo Tribunal Federal.
Lira não se pronunciou sobre o valor reservado a ele, mas fez uma defesa de que os parlamentares, que “vão e voltam para os seus estados”, têm capacidade para “identificar o que deve ser feito com a infraestrutura (nas suas bases)”.— São R$ 16,5 bilhões do Orçamento que viviam escondidos, que aclaramos e geram versões de que isso é um desmando. Toda lei precisa ter transparência — afirmou ele.
A maior parte dos recursos solicitados por Lira foram destinados a Saúde (R$ 230,6 milhões), enquanto o resto foi dividido entre a Companhia de Desenvolvimento dos Vales São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) e o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE).
Os documentos também mostram que Lira mais do que triplicou as indicações depois que foi eleito presidente da Câmara no início do ano passado. Em 2020, ele indicou R$ 80,9 milhões em emendas, enquanto em 2021 foram R$ 276,5 milhões.
O Senado enviou nesta segunda-feira ao Supremo Tribunal Federal (STF) cerca de cem documentos com informações sobre as indicações de repasses do orçamento secreto. A divulgação dos autores dos repasses havia sido uma exigência da Corte ao Congresso quando liberou os pagamentos, no fim do ano passado. Ao todo, segundo informado pela Casa legislativa, 342 deputados e 64 senadores repassaram informações. Alguns deles, contudo, disseram não terem sido contemplados.
Em dezembro de 2021, o plenário do STF referendou decisão da ministra Rosa Weber e deu prazo de 90 dias para o Congresso dar ampla publicidade ao orçamento secreto. Os documentos enviados agora foram redigidos pelos próprios parlamentares, apontando as verbas que eles tinham indicado.
O orçamento secreto utiliza as chamadas emendas de relator (identificadas pelo código RP-9) para multiplicar, sem transparência, a quantia que parlamentares têm o direito de indicar para seus redutos eleitorais, dificultando o controle do dinheiro público pelos órgãos de fiscalização. As destinações são assinadas pelo relator-geral do Orçamento no Congresso, responsável por registrar os pedidos da verba.
A informação de quem é o verdadeiro padrinho da emenda, porém, não é divulgada na maioria das vezes. Esse sistema motivou a ministra Rosa Weber a determinar que o Congresso informasse os nomes de todos os beneficiários das emendas de relator até 17 de março — prazo que foi descumprido.