Depois de causar constrangimento aos militares ao dizer que eles haviam sugerido ao TSE fazer uma apuração paralela das eleições, Jair Bolsonaro agora vem causando desconforto no próprio partido, o PL.
“A empresa vai pedir ao TSE uma quantidade grande de informações. O que pode acontecer? Essa empresa que faz auditoria no mundo todo, empresa de ponta, pode chegar à conclusão que, dada a documentação que se tem na mão, dado ao que já foi feito, ela pode falar que não foi auditável. Olha a que ponto vamos chegar”, disse Bolsonaro na live.
A ideia da auditoria foi discutida pelo presidente com a cúpula do PL logo após o início da crise com o Supremo. Mas lideranças do partido e mesmo alguns membros da campanha a consideram inoportuna.
“Se Bolsonaro fizer questão, vamos contratar. Mas o PL é um partido da política. Não queremos de jeito nenhum essa briga com o TSE”, afirmou um integrante da direção ouvido reservadamente pela coluna.
Nas equipes de campanha, o anúncio de Bolsonaro foi recebido com surpresa e curiosidade.
Isso porque, embora a possibilidade de os partidos acompanharem a apuração esteja prevista na lei eleitoral, nem mesmo pessoas que estão na linha de frente sabem como o trabalho se dará na prática.
Conforme o grau de exigência de Bolsonaro, a tarefa poderá se tornar impraticável, uma vez que a Justiça Eleitoral conta, atualmente, com um depósito de cerca de 500 mil urnas.
Um interlocutor do presidente admitiu à coluna que a ofensiva deve servir de “justificativa para depois não cumprir o resultado”, caso Bolsonaro seja derrotado nas eleições de outubro.
Os principais institutos de pesquisa preveem hoje uma vitória do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), mas o chefe do Executivo tem conseguido recuperar a popularidade do governo.
A legislação eleitoral prevê que, durante o período de preparação das urnas, será garantida aos representantes do Ministério Público, da OAB e partidos políticos “a conferência dos dados constantes das urnas, assim como a verificação da integridade e autenticidade dos sistemas eleitorais instalados em urnas eletrônicas”.
Nos últimos dias, a equipe da coluna conversou sobre o assunto com três ministros do TSE, que procuraram minimizar as falas do presidente. “Não vejo problema algum. Se ele contratou uma empresa para auditar, é porque reconheceu que o processo de votação eletrônica é auditável. Já é um avanço”, afirmou um ministro.
“Espero que outros partidos façam o mesmo”, acrescentou outro magistrado. Para um terceiro integrante do TSE, não há nada de mais nas declarações do chefe do Executivo sobre a auditoria: “Isso é bobagem.”
Em 2014, o PSDB contratou uma auditoria no sistema eleitoral, mas somente após a derrota apertada de Aécio Neves para Dilma Rousseff, por uma margem de apenas 3,5 milhões de votos. A auditoria contou com a participação de especialistas do Instituto Brasileiro de Peritos (IBP), da USP, do Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA) e do Comitê Multidisciplinar Independente, grupo de especialistas em questões referentes ao voto eletrônico.
Malu Gaspar/O Globo