Ex-cônsul dos EUA no Rio diz que interferência de Bolsonaro nas eleições será alvo de “sanções punitivas”

Ex-cônsul dos EUA no Rio diz que interferência de Bolsonaro nas eleições será alvo de “sanções punitivas”

Compartilhe

O diplomata aposentado do Departamento de Estado dos Estados Unidos, Scott Hamilton, escreveu um artigo para o jornal O Globo neste sábado (30) em que afirma que “os Estados Unidos deveriam deixar claro a Bolsonaro que uma tentativa de interferir na integridade do processo eleitoral brasileiro será objeto de sanções punitivas”. Hamilton foi cônsul-geral no Rio de Janeiro entre 2018 e 2021.

O artigo é intitulado “Defendendo a democracia” e já começa falando sobre a “experiência amarga” que o Brasil teve com a ditadura militar. “Quando a democracia morre, é difícil ressuscitá-la”, diz Scott Hamilton no começo do seu texto. Veja abaixo.

“O Brasil sabe bem, pela experiência amarga com a ditadura militar, que, quando a democracia morre, é difícil ressuscitá-la. O exemplo global do poder e prestígio democráticos brasileiros tem mais valor hoje como contraponto ao crescente avanço da autocracia pelo mundo do que em qualquer momento na História do país. Mas, em meio a ameaças verossímeis às instituições e valores democráticos no Brasil, os Estados Unidos permanecem passivos diante do público. Seria trágico se compensassem sua errônea e abertamente cômoda identificação anterior com o presidente Jair Bolsonaro escondendo-se agora de modo complacente nas sombras.

Como cônsul-geral no Rio entre 2018 e 2021, testemunhei as formas como Bolsonaro e seus apoiadores tentaram sabotar a integridade do processo democrático brasileiro e suas, em geral, espetaculares instituições democráticas independentes — imprensa, ONGs, TSE, STF e o próprio sistema de votação. A intenção é clara e perigosa: minar a fé do público e preparar o palco para o esforço de recusar-se a aceitar seu resultado. Não tenha dúvida, Bolsonaro se enxerga como um enviado de Deus para salvar o Brasil do “comunismo”. É uma visão messiânica impermeável à razão. A presença de Carlos Bolsonaro, seu líder de campanha nas redes sociais, na delegação que em março encontrou Vladimir Putin, presidente de um país que é um sofisticado manipulador digital de eleições, deveria nos deixar com a pulga atrás da orelha.”

O ex-cônsul fez elogios às urnas eletrônicas e ao sistema eleitoral brasileiro, afirmando que é de “de primeira linha — rápido e confiável, com um histórico irretocável e nenhuma brecha para autoridades politicamente motivadas atrasarem a contagem enquanto votos para um candidato que perde são misteriosamente ‘descobertos’”. E ele continua:

“É por isso, claro, que Bolsonaro o repudia. É por que lutou pelo voto em papel, mais fácil de desafiar como contagem partidária, como vimos para nossa infelicidade nos Estados Unidos. É por que contesta a integridade do TSE, de modo a oferecer outra forma de desacreditar a legitimidade dos resultados. É por que pinta a imprensa como parcial, para poder minimizar todas as reportagens que ela possa fazer sobre seus esforços para roubar a eleição. É por que desdenha as ONGs como se estivessem a serviço da esquerda ou de interesses internacionais, para poder sugerir que não são confiáveis. É por que combate o STF, já que os ministros podem vir a decidir sobre sua recusa em deixar a Presidência. E é por que cultiva tanto a Polícia Militar, porque precisa estar pronto a enviá-la às ruas contra manifestações pró-democracia, mesmo contra o desejo da cadeia de comando vinculada aos governadores estaduais.”

Scott Hamilton finaliza o artigo falando sobre a possibilidade de sanções punitivas:

“Em primeiro lugar, os Estados Unidos deveriam deixar claro de modo cristalino ao presidente Bolsonaro que uma tentativa de interferir na integridade do processo eleitoral brasileiro será objeto de repúdio absoluto e de sanções punitivas a todos os envolvidos, impostas simultaneamente por um amplo grupo de países. Segundo, a administração Biden deveria ser mais agressiva ao apoiar as instituições democráticas independentes do Brasil. Finalmente, por ora, a comunidade diplomática afim deveria adotar atividades públicas similares que deixassem claro seu próprio compromisso com as instituições e valores democráticos.

Com a pressão das crises na Ucrânia e no resto do mundo, seria fácil para os formuladores políticos globais perder de vista a importância vital de um Brasil vibrante, pacífico e democrático, um ativo estratégico poderoso para democratas de todas as partes. Nenhum país se aproxima tanto dos Estados Unidos em tamanho, diversidade, pluralismo, valores e impacto democrático. A hora para os Estados Unidos se manifestarem é agora, não quando uma crise estiver em curso ou depois dela.”, escreveu o ex-cônsul no jornal O Globo.

*Por DCM

Compartilhe

%d blogueiros gostam disto: