Perdas no ICMS para subsidiar a Petrobras, podem afetar financiamento de universidades estaduais

Perdas no ICMS para subsidiar a Petrobras, podem afetar financiamento de universidades estaduais

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O Projeto de Lei Complementar 11/202, que estabeleceu  uma alíquota única de ICMS para ser cobrada sobre diversos combustíveis, foi sancionado pelo presidente Jair Bolsonaro no último dia 11. No mesmo dia em que o projeto foi sancionado, o coordenador do Fórum Nacional de Governadores, Wellington Dias (PT-PI) anunciou que a entidade irá recorrer ao Supremo Tribunal Federal contra a nova legislação.

“O projeto, do jeito que foi votado, é inconstitucional, e vamos ao STF evitar prejuízo para o nosso povo”, declarou Dias.

Boa parte dos  governadores é crítica da proposta  e afirmam que ela não irá resolver o problema do seguido aumento no preço dos combustíveis. Na semana passada a Petrobras também anunciou na última semana um novo reajuste dos preços nas refinarias, alta de 18,8% na gasolina e 24,9% no diesel.

De acordo com Bolsonaro, a proposta é uma tentativa de frear a disparada no preço dos combustíveis, agravado pela guerra na Ucrânia após a invasão russa. Segundo a proposta, o ICMS unificado incidirá sobre gasolina,  etanol, diesel,  biodiesel e gás liquefeito do petróleo (GLP).

Álvaro Martim Guedes, professor e especialista em administração pública da Unesp em Araraquara, explica que o temor dos estados quanto à possibilidade de perda de recursos por conta de uma reforma tributária que modifique o modelo atual de cobrança  do ICMS é antigo. Nas últimas décadas, têm avançado discussões sobre caminhos para fazer essa reforma sem que ela implique em problemas para o financiamento dos estados.

A questão da reforma do ICMS, com foco numa unificação do tributo, está no centro dos debates sobre reforma tributária travados no Brasil desde a década de 1990. Porém, até agora, nenhuma proposta neste sentido havia conseguido avançar justamente pelo temor de perda de arrecadação por parte de alguns estados com a simplificação e unificação do tributo.

Para o professor Guedes, uma reforma tributária estruturante é importante para dar segurança à sociedade e ao processo de desenvolvimento econômico do país. “Agora, a reforma tributária no aspecto específico de um imposto de circulação de mercadorias, no caso o ICMS, se reveste de peculiaridades fundamentais, por ser um imposto vigoroso que promove uma arrecadação intensa e muito sensível a movimentos de alta, em que pese, alta nos preços e intensificação nas trocas, sendo um tributo para financiar o estado de maneira vigorosa.”

O professor lembra que, quando do Pacto Federativo, coube aos estados ficar com o ICMS entre as parcelas da arrecadação. “Assim, fazer uma reforma tributária que envolva o ICMS significa mexer nesse pacto, o que precisa ser feito com muita calma e cautela.” Ele aponta para os riscos que subfinanciar um estado em detrimento de outros causa instabilidade ou desequilíbrios.

As reformas tributárias, que vinham tramitando no âmbito do Senado e da Câmara, levavam em consideração estes aspectos e apontavam para uma pactuação interessante, na opinião do especialista. “Criavam o imposto de valor adicionado que seria uma federalização do ICMS, mas garantindo a arrecadação dos estados. Durante este governo, sob Paulo Guedes, essa pactuação foi abortada e desarticulada”.

O professor Guedes criticou o modo como o governo atual deixa de conduzir as reformas estruturais. Para o especialista em administração pública, a característica do atual condutor da economia, Paulo Guedes, é a mesma do presidente da República: a lacuna. “Não há proposta, não há o que fazer, não há o que sugerir, criando esse permanente impasse e incerteza. Em que pese uma conjuntura desfavorável por conta da pandemia, o primeiro ano do seu mandato e suas ações subsequentes sempre mostraram que não há uma agenda, não há uma proposta, que leve a algum benefício, principalmente que aponte para reformas estruturantes”.

No caso de São Paulo, onde as universidades estaduais possuem uma autonomia de financiamento que repousa na arrecadação do ICMS, ele pensa que no quadro de uma reforma tributária ampla, esta disposição poderia até ser questionada.

Segundo ele, tudo indica que esta reforma manteria o nível de arrecadação, e, portanto, não afetaria o financiamento das três universidades. No entanto, com o salto que essa mudança representa, o critério da autonomia financeira, obtido em 1989, pode vir a ser questionado em algum momento por alguém. “É pouco provável tendo em vista o peso político que essas três universidades detém”.

E eventualmente se pode colocar a necessidade de repensar a forma como as universidades são geridas. Porém, o ponto de mais importância a ser acompanhado por todos, inclusive a comunidade acadêmica, é o financiamento do estado como um todo, aponta o professor Guedes.

“O financiamento do estado de São Paulo estará sob alça de mira. Com isso, as três universidades podem ter sua gestão orcamentária e financeira questionada, que é apenas uma gestão de caixa, somente isto. No caso da UNESP, que tem um passivo atuarial maior que as outras duas, precisaria prestar atenção a isso, quanto a seu futuro”, alerta ele.

No caso das três universidades seria importantíssimo ter planejamento, perspectiva de longo prazo, o que não tem sido praticado, de acordo com ele. “Enquanto o caixa estiver polpudo, tudo bem, mas precisamos olhar para o futuro com mais seriedade, pois pode vir a tolher o desenvolvimento que pretendemos”.

Pelo modelo atual, o ICMS sobre combustíveis varia em cada estado e é calculado ao longo de toda a cadeia de distribuição. O novo texto estabelece ainda regras sobre a arrecadação do tributo e mecanismos de compensação entre estados relativos às receitas geradas com as operações. Por exemplo: nas operações com os combustíveis derivados de petróleo, o imposto caberá ao estado onde ocorrer o consumo. Em outros casos especificados, os recursos arrecadados serão repartidos entre os estados de origem e de destino dos produtos.

Edição de entrevista ao Podcast Unesp.

* Vermelho

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