Por Milton Alves: O governo do presidente Jair Bolsonaro militarizou o Ministério da Saúde, com a escolha de um integrante do alto escalão do Exército, o general Eduardo Pazuello. A lenda difundida pela caserna dizia que Pazuello era um “especialista” em logística.
Em Manaus, o general não conseguiu evitar o prolongamento de um desastre sanitário de grandes proporções, contribuindo para a morte de centenas de pessoas durante a avassaladora onda de contágio na capital amazonense. Pazuello foi um fracasso retumbante — e potencialmente criminoso.
O então titular da pasta da Saúde, além da conhecida incompetência, operava uma verdadeira usina de cambalachos, favorecendo a ação de rapina de atravessadores, empresas de fachada e de empresários sedentos por negócios bilionários, com a oportunidade aberta pela aquisição de vacinas para o combate à pandemia provocada pelo novo coronavírus.
Ao mesmo tempo, com a providencial ajuda da quadrilha verde oliva, já aboletada no ministério, o governo Bolsonaro propagava o enganoso tratamento precoce para a Covid, com a adoção de um “kit Covid”, que fez encher os bolsos de empresas fornecedoras de cloroquina, ivermectina e de outros fármacos.
O próprio Exército produziu cloroquina em larga escala. Enquanto isso, avançava o número de mortes em todo o país. Uma combinação macabra entre negacionismo e operações nebulosas, para dizer o mínimo, em torno das demandas por mais recursos geradas pela pandemia.
Os trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito [CPI da Covid] do Senado revelam fortes indícios da montagem de um vasto esquema de superfaturamento nos diversos processos de encomendas de vacinas que tramitam no Ministério da Saúde.
As tenebrosas transações ocorreram durante o período em que o ministério foi comandado pelo general Pazuello e por um grupo de coronéis localizados em cargos estratégicos da pasta.
Pazuello na mira da CPI em agosto
Um vídeo divulgado na sexta-feira (16) pelo jornal Folha de São Paulo, material obtido pela CPI da Covid, mostra Pazuello em reunião com um grupo de empresários para tratar da compra de 30 milhões de doses da CoronaVac – cada dose custaria US$ 28, praticamente o dobro do custo da dose contratada pelo governo federal junto ao Instituto Butantan.
Eduardo Pazuello negou o conteúdo de reportagem da Folha sobre uma suposta negociação com intermediários para a compra de doses da vacina contra CoronaVac. “Enquanto estive como ministro da Saúde, em momento algum negociei aquisição de vacinas com empresários”, disse Pazuello em nota.
A Folha revelou também a existência de cópia de uma minuta de contrato entre o ministério e uma empresa de comércio exterior de Santa Catarina, a World Brands, especializada em importações de produtos diversos, incluindo itens médicos. No documento a World Brands Distribuidora S.A se diz representante da Sinovac Biotech Ltd. no Brasil.
Ou seja, a nova denúncia aponta claramente para o envolvimento de Pazuello na corrida macabra pela compra de vacinas com preços exorbitantes e operadas por intermediários de procedências, no mínimo, duvidosas — picaretas que pululam em torno do orçamento bilionário da pasta da Saúde.
Davati, Words Brands, Senah [ong religiosa] e oficiais do Exército Brasileiro tecem em conjunto uma trama eivada de operações escusas e ilegais, o que facilitou a prática de atos continuados de prevaricação das autoridades fardadas no interior do ministério.
Até o moderado e titubeante Omar Aziz (PSD-AM), presidente da CPI, constatou que “o Brasil não via membros do lado podre das Forças Armadas envolvidos com falcatrua dentro do governo”. Uma declaração que provocou uma nota conjunta dos comandantes das três forças militares e do ministro da Defesa, Braga Netto, contendo ameaças aos integrantes da Comissão Parlamentar de Inquérito da Covid-19.
O presidente Jair Bolsonaro e os comandantes das Forças Armadas pretendem assegurar a impunidade total para os crimes cometidos pelos militares, que aparelharam o ministério.
O governo bolsonarista quer fugir das responsabilidades criminais com o avanço das apurações pela CPI, que liga, cada vez mais, os fios entre a negligência do enfrentamento à pandemia e a montagem de um perverso esquema de propinas na compra dos imunizantes e de insumos.
Conclusão: A corrupção também veste a farda verde oliva. E precisa ser punida com todo rigor da lei.
*Milton Alves é ativista político e social. Autor dos livros ‘A Política Além da Notícia e a Guerra Declarada Contra Lula e o PT’ (2019), ‘A Saída é pela Esquerda’ (2020) e de ‘Lava Jato, uma conspiração contra o Brasil’ (2021) – todos pela Kotter Editorial. Escreve semanalmente em diversas mídias progressistas e de esquerda.