Eu tinha 10 anos de idade e após um longo período de grande dificuldade familiar e emocional, havia mudado da cidade industrial de Volta Redonda-RJ, onde fica a CSN, para a cidade de Vila Velha, na grande Vitória-ES. Em meio a esses momentos críticos para uma criança, o futebol dos anos 80 e 90 era de uma idolatria desaparecida no tempo, afinal, era primeira Copa do Mundo que conseguia compreender o que realmente é o futebol.
1990, em termos de futebol, era como uma espécie de momento mágico, já que ainda em 1989, assisti no velho e real Maracanã, a vitória emocionante de um improvável Botafogo, que há 21 anos não vencia sequer um campeonato estadual. Um contra-ataque mágico levou o povo, na arquibancada e nas gerais, simplesmente ao êxtase, entre esses mais de 100 mil geraldinos e arquibaldos, eu, um menino de nove anos. Com o Flamengo pressionando e com um conjunto bem melhor que o do Botafogo, um momento mágico de apenas um chute a gol, no segundo tempo fez a vitória simples mágica.
No ano seguinte, a Copa do Mundo, de um Brasil que vinha de uma dupla especial, que venceria a Copa de 94, Bebeto e Romário, brilhavam nas eliminatórias, em jogo épico contra o Uruguai. Sim, o Brasil era favorito na copa, com um futebol maravilhoso, não fosse o técnico desestruturar o time e culminar na dissolução do conjunto. Na Copa, o Brasil era um arremedo de uma seleção, apenas um catado de bons jogadores desarrumados por Lazarone.
Depois de uma primeira fase medíocre, com três vitórias magras contra Costa Rica, Escócia e Suécia, o Brasil chegava desacreditado na segunda fase, que pela primeira vez na história, era uma oitavas e não quartas de final. No caminho, a Argentina de Maradona.
No primeiro tempo, surpreendentemente, o sistema defensivo anulou Maradona. A Argentina, encalacrada no meio campo brasileiro, se perdia sem criatividade e o Brasil criava e perdia diversas chances de gol. Bolas na trave, perdas de gol na cara e o primeiro tempo terminava com uma sensação estranha de que o time medíocre da primeira fase tinha ficado para trás, o Brasil fazia uma de suas melhores partidas em meses.
Mas, enquanto o Brasil tinha finalmente conjunto, esforço, empenho e entrega, a Argentina tinha um gênio. Maradona brilhou apenas um vez em toda a partida, o suficiente para deixar Dunga procurando a bola até a 1994 e servir Canniggia, em passe magistral, enquanto ambos trocavam de posição, cruzando a marcação, que ficou completamente tonta. Aos 36 minutos, gol da Argentina e Ricardo Gomes expulso.
O futebol é belíssimo, por que é irônico. Um time pior, que conte com apenas um gênio ou um momento de brilho, pode vencer um que se apresenta melhor, mesmo que em apenas um jogo. Foi esse o primeiro dia em que Maradona me fez chorar, pelo mesmo motivo ao qual um momento mágico me fez feliz no Maracanã um ano antes, apenas um contra-ataque e gol. O segundo dia em que Maradona fez aquele menino de 10 anos chorar, foi hoje. Adeus ídolo perverso.