Não é só nos EUA em que a dita “esquerda” adotou o apoio incondicional ao Joe Biden como maneira de combater o que acreditam ser um “mal maior”, numa interpretação ingênua do Mundo. Esta disputa e linha de raciocínio também está presente no Brasil – algo que inclusive antecede as Eleições americanas se considerarmos que por estas bandas rola a tentativa de se emplacar uma “frente amplíssima”, ou seja, uma “corrente pra frente” que aglutina os mais variados setores e cores que incluem – PASMEM – os próprios arquitetos do Golpe de Estado de 2016 em nome do combate ao Bolsonaro. Esta política, além de anistiar os arquitetos da destruição do Brasil de forma escandalosa, coloca a esquerda brasileira no bolso dos Neoliberais que utilizam esta ingenuidade para reforçar o apoio contra a Extrema-Direita, polarizando com esta e transmitindo uma imagem de santidade valiosa no jogo propagandístico controlado pela própria Burguesia. Com esta manobra, os Neoliberais dissimulam uma realidade falsa onde acabam sendo vendidos como “civilizados”.
Não devemos esquecer que os próprios setores que hoje batem em Bolsonaro – uma boa parte deles – endossou ativamente o Bolsonarismo no passado quando este era interessante no caminho de criminalização do PT. Hoje, com os escombros do Golpe de 2016, a manipulação do horizonte de eventos é tamanha que rapidamente estes setores neoliberais se movimentam no sentido de polarizar com o “selvagem” Bolsonaro. Colocam a própria esquerda dentro do seu hall de apoiadores. O objetivo é limpar a cara, não ficar mais com a pecha pública de golpistas mas com a pecha de “civilizados” contra a “barbárie”. Esta narrativa é facilmente detectada como uma enorme farsa e seria, em condições normais de “tempo e temperatura” amplamente denunciada pelas forças progressistas. Não fosse o fato da esquerda pequeno-burguesa ser um fenômeno contrarrevolucionário de peso que passou a integrar o cenário de diversas sociedades Mundo afora. O surgimento da esquerda pequeno-burguesa é um dos grandes assuntos que devem ser tratados de forma cuidadosa dentro da Esquerda mundial porque envolve uma enorme confusão política.
Em primeiro lugar, uma boa parte da esquerda não domina uma série de categorias analíticas fundamentais como “imperialismo”, “correlação de forças”, “luta de classes” e etc. Acreditam que a luta política se dá em torno de debates “morais” e de natureza ligada à estética e à identidade: como gênero, raça, gostos, estilos de vestimenta e etc. Trata-se de uma esquerda incapaz de entender a própria História e o que é a luta de classes. O que explica tamanha ignorância que não a penetração no Brasil de várias vertentes pós-estruturalistas e pós-modernas que tiveram grande ascendência em ambiente acadêmico? Este fenômeno é conhecido. Uma boa parte desta esquerda não consegue se identificar mais como classe trabalhadora de fato. Se identificam como intelectuais que se destacaram por lerem livros mais do que outros trabalhadores, por isso acreditam terem mudado de “status social”. Talvez uma das explicações para este fenômeno seja o fato destes setores integrarem um amplo leque de “colaboradores” no ramo de serviços e terem como benefício um assalariamento advindo de uma redistribuição de mais-valia na própria dinâmica vista dentro do Capitalismo financeiro. Não é de se surpreender, por exemplo, que partidos como o PSOL tentam, o tempo inteiro, desvincular-se da pecha de extremistas – alegando serem favoráveis ao “Socialismo e Liberdade”. Que espécie de socialista é capaz de adjetivar o Socialismo? Para qualquer indivíduo bem informado, Socialismo já é sinônimo de liberdade – não há a necessidade de tentar mostrar uma “cara” de “bonzinho”. Só é capaz de tentar “sair bonito” na foto aquele que acha que a discussão política opera em nível de identidade e, pior do que isso, em nível de Eleições burguesas. A esquerda pós-moderna é linha auxiliar da Burguesia 100% ao acreditar que as instituições burguesas abrem concessões sem ter a menor ideia do que é de fato o Estado e sem o menor senso crítico do que são as instituições burguesas.
Da mesma maneira que essa esquerda acredita ser premiada com a meritocracia por ter lido mais livros que outros trabalhadores e mergulhar num Mundo especial por isso, acreditam também que no Mundo da Realpolitik as coisas funcionariam da mesma forma, ou seja, o empenho propagandístico os levarão rapidamente à lacração no Congresso Nacional. Não nos surpreendamos entretanto que uma boa parte desta esquerda mais dia, menos dia passa a apoiar as mesmas plataformas políticas da Direita Neoliberal no Congresso tendo se fundido organicamente ao sistema da própria Burguesia. Para tal, colecionam-se exemplos dentro e fora do Brasil. A alta burguesia obviamente tira proveito disso, ri da ingenuidade alheia. Mas esta discussão irá longe e embora esteja relacionada à “esquerda colorida” dos EUA e movimentos orbitais, merece uma análise específica e caudalosa.
Psicologia da esquerda pequeno-burguesa à parte, nos atentemos aos fatos: qual é a lógica destas “esquerdas” em apoiar ativamente a eleição de Joe Biden? A lógica seria esta: Joe Biden não é Bernie Sanders mas, apesar dos pesares tem uma “aparência de pessoa civilizada”. Donald Trump é o detentor de todo o mal que o Mundo viu nos últimos tempos, afinal ele seria o responsável por alimentar e retroalimentar os terraplanistas e negacionistas dos EUA. Para estes, o terraplanismo e o negacionismo são mais inaceitáveis que a criminosa política dos Democratas levada adiante nos anos de Barack Obama. Aliás, poucos historiadores fora do eixo da Eurásia têm vindo à tona para denunciar os crimes contra a Humanidade perpetrados na gestão Obama em nível internacional. Espera-se que pouco a pouco, novos e numerosos historiadores façam a devida recuperação da História recente do Mundo justamente para que certas ilusões pequeno-burguesas sejam interceptadas ou mesmo denunciadas. “Mas Trump separou famílias e enjaulou crianças na fronteira México-EUA”, dizem eles. O que poucos sabem é que esta política criminosa tem a sua origem na gestão dos Democratas. Como dar conta de tal? Além do mais, não nos esqueçamos que o Muro na Fronteira com o México começou a ser erguido nos anos de George W. Bush – O MESMÍSSIMO que hoje pede votos a Biden, o “humanitário”. Como explicar tal fato? “Mas Trump espalha Fake News no Twitter”, dizem eles.
Bem, se o problema for Fake News, não devemos nos esquecer que os grandes Conglomerados de Mídia praticam Fake News o tempo inteiro, mesmo antes da onda de Fake News ganhar as redes sociais. Mas se quisermos trazer o assunto para os dias atuais, as famigeradas fotos de crianças enjauladas na fronteira México-EUA foram tiradas em Junho de 2014 e só foram vinculadas à Donald Trump em junho de 2018 quando o cineasta Jon Favreau utilizou as fotos para incriminar a política de tolerância zero na fronteira do México com o Arizona. Quando denunciado, Favreau se desculpou – fato este que não repercutiu na grande imprensa americana e mundial – um caso claro de manipulação de informação. Não quero dizer com isso que Trump não seja favorável à deportação de imigrantes e criminalização destes. A respeito da política racista e xenofóbica de Donald Trump não deve recair nenhuma dúvida, o que nos chama a atenção no entanto é saber que estes mesmos crimes já ocorreram em gestões dos Democratas que hoje posam de “civilizados” diante da “barbárie”. Que esquerda é capaz de não detectar esta falcatrua? Somente a esquerda pequeno-burguesa que acredita que a Política é um tema de aparências. Trump é um homem mau e isso é o bastante.
Mas e quanto à análise crítica sobre o Imperialismo? Inexiste entre a esquerda pequeno-burguesa e muito menos a esquerda norte-americana qualquer conhecimento ou avaliação de uma categoria de análise fundamental como esta. Inclusive, uma boa parte da esquerda por não conhecer esta categoria analítica chamada “Imperialismo” – vinculam-na à discursos extremistas. Acham ingenuamente e de forma flagrantemente ignorante se tratar de um tema menor. Não fazem a menor ideia do quão fundamental é o o conceito de Imperialismo. Talvez a ignorância destes elos da esquerda seja tamanha que possivelmente até mesmo confundam a expressão “Imperialismo” com os Impérios da Antiguidade e o questionam, achando que quem utiliza estas terminologias esteja praticando “anacronismo histórico”. Vejam vocês à que ponto de ignorância nós chegamos! E acreditem, são provenientes do Mundo mágico das Universidades! Ao desconhecerem esta terminologia contemporânea do “Imperialismo”, ficam à margem de uma série de informações e fenômenos econômicos e geopolíticos. A burguesia esboça um enorme sorriso com a vaidade cega da pequeno-burguesia e eventualmente até a apoia, quando necessário. Ou vocês acham que Ocasio-Cortez tornou-se uma deputada influencer por acaso?
Obama e os democratas são hoje vendidos como “socialistas” – vejam vocês à que ponto chegamos! Por ser de origem étnica distinta do tradicional “WASP” (White Anglo-Saxon Protestant), Obama teve total condição de alimentar atrocidades na Líbia, na Síria, no Egito, na América Latina. Afinal de contas, Obama é negro, se ele é negro então ele é de “esquerda”.
Para que tenhamos uma ideia da cegueira desta esquerda que embarcou no apoio a Joe Biden, devemos observar que todo o Establishment odioso do Deep State americano também embarcou num apoio ativo a Biden. Não devemos nos esquecer – e infelizmente essa esquerda adora esquecer dados – mas Joe Biden conta hoje com apoio de setores dissidentes de Donald Trump dentro do próprio Partido Republicano. Que setores são esses? Nada mais, nada menos que a ala dos Bush! Sim, George W. Bush e familiares apoiam ativamente a candidatura de Joe Biden contra o “malévolo” Donald Trump.
Outra coisa que não fecha nesta conta é a falta de desconfiança que as forças políticas que se declaram de esquerda em relação ao comportamento da Grande imprensa monopolista. Há algo errado e no mínimo suspeito quando quase de forma unânime a imprensa monopolista Mundial fecha um apoio ativo à Joe Biden. Será que a Imprensa Monopolista tornou-se cristã católica? Será que chegaremos à este ponto de ingenuidade? Esse assunto passa completamente despercebido de uma boa parte dos apoiadores esquerdistas de Joe Biden, como se os grandes Conglomerados de mídia fossem “entes” imparciais do Mundo que nada tiveram ou têm a ver com as falcatruas do Grande Capital pelo Planeta Terra. Em que mundo pensam que vivem?
Todos estes fatos nos levam a uma única conclusão, a esquerda pequeno-burguesa é um assunto a ser problematizado, discutido e questionado. Não há mais a possibilidade de convivermos com esse nível de interpretação da realidade em meio à Crise Capitalista. A Burguesia agradece aos céus todos os santos dias pela inoperância e incapacidade analítica de amplos setores de oposição ou que se declaram oposição. As eleições nos EUA são uma lição para o Brasil. Fiquemos atentos porque não será surpresa se setores ativos do Golpe de Estado se apresentarem como “salvadores da Pátria” contra o selvagem Bolsonaro com amplíssimo apoio de toda a esquerda cirandeira. Estará constituído aí um enorme Golpe dentro do Golpe. É necessário mobilizar um enorme programa de agitação política que denuncie TODA a Direita. Bolsonaro é o RESULTADO direto da Operação Lava-jato, da sanha golpista do PSDB e de forma alguma devemos acreditar que estes sejam “civilizados” contra Bolsonaro. O fascismo não é um “ente” que caiu do céu. O fascismo é o próprio instrumental que a Burguesia mobiliza para salvar sua pele nos momentos mais críticos e a Burguesia se desvincula do fascismo sempre quando lhe é conveniente. Não é papel da esquerda que realmente esteja interessada transformar a realidade fazer parte deste teatro de fantoches.
F. Tiger
novembro 5, 2020 at 1:11 amVocê conseguiu fazer um texto crítico, mas sóbrio, sem ataques. É exatamente essa a crise que vive em especial as ciências sociais tupiniquins. Com raríssimas exceções, o pessoar está realmente achando que existirá um “pós-normal” ou qualquer coisa do tipo. E as categorias teóricas do imperialismo ou, tão pior quanto, nacionalismo, parece xingamento. É um paradoxo estar no doutorado e entender mais da história do Brasil, da América Latina e da geopolítica da vida preso em casa em meio a grupos de rede social do que na universidade pública. O bom é que a rede está ativa, mas com pouca influência, já que a competição é muito desigual, quem tem grana manda. Isso porque ainda não proibiram as vozes críticas.
Zezin
novembro 5, 2020 at 9:31 amAHHHHHHHHJ SIMMMMMM, ENTÃO VOU TORCER PRO TRUMP. IGUAL A MEU VIZINHO BOLSONARISTA.