Afinal de contas, quantos judiciários tem no Brasil?
Não há ingenuidade possível que não sentencie que o sistema de justiça no Brasil faliu.
As engenhosas justificativas para se chegar a esse retrato, são muitas e muito criativas, mas não colaboram, fora do picadeiro humorístico, com a estabilidade institucional do país.
O judiciário, que tão uniformemente se entregou aos desejos da mídia na farsa do mensalão, sofreu uma dilatação tão grande que o ex-juiz Moro, hoje completamente desmoralizado, profissionalizou uma moldura entalhada especialmente para impor suas molecagens jurídicas sem que houvesse qualquer resistência oficial do judiciário. Tudo havia se transformado numa papa só com casca grossa, aonde não penetrava luz.
Assim, o judiciário brasileiro passou a ter um estilo Moro, uma fisionomia lavajatista.
Ali tinha um produto conjugado com farta manipulação dos fatos e, consequentemente da opinião pública, que, na verdade, era o grande objetivo a ser alcançado pela Lava Jato. Isso ficou muito claro no vazamento pelo Intercept, quando Dallagnol diz a Moro que a acusação que tinham contra Lula era extremamente frágil, subjetiva e precisaria passar por um banho de mídia para transformar a condenação de Lula em ação divina.
Ou seja, o sentimento da sociedade tinha quer ser o sentimento de justiça, justiça esta arquitetada nas redações dos grandes jornais em parceria com os foiceiros da Lava Jato.
Foram cinco anos em que a mídia e a república de Curitiba consagraram esse estilo, afastando cada vez mais a justiça da Constituição e aproximando ainda mais a justiça da situação política e, como tal, a negação de um julgamento isento era imperativa.
Com esse estilo histórico da Lava Jato e mídia, Bolsonaro, compreendendo que precisaria recorrer ao mesmo expediente, resolveu filiar-se à mesma matriz com algumas divergências, se sua falange de picaretas já estava queimada na mídia, então o embate deveria ocorrer peito a peito dentro do sistema de justiça, desenhando como uma pintura viva, seu próprio sistema, escrito pelos “pensadores” de seu governo para impor, de forma nua e crua, uma justiça própria que lhe parecesse segura o suficiente para livrar a cara de uma legião de vigaristas da família chamada guanabarinamente de clã Bolsonaro.
O que Bolsonaro precisava, ele conseguiu, uma justiça morna, lenta, lerda que despreza o tempo e atrofia o próprio espaço institucional para, assim, impor brilho próprio nas teias das cortes por onde passam os processos contra os membros do seu clã.
O sentido é o mesmo da Lava Jato, proteger aliados e atacar inimigos.
Só que, depois que a Lava Jato ficou com as tripas à mostra, o judiciário, capacho, precisou de um malabarismo mais engenhoso. Ainda assim, diante de tanta velocidade com que Witzel foi sacado do governo do estado do Rio e Crivella ficou inelegível, numa clara guerra política dentro das cortes, a bondade da justiça com os membros do clã, grita no sentimento coletivo da sociedade.
Todos perguntam, a que horas de fato Flávio Bolsonaro será punido por crimes tão escancaradamente descobertos?
Outra pergunta que ficou no ar e que virou piada nacional, feita por um repórter do Globo “Presidente, por que sua esposa, Michelle, recebeu R$ 89 mil de Queiroz?” segue sem resposta de Bolsonaro e da justiça. O que parece é que esse assunto está censurado no mundo dos Meritíssimos.
O que fica claro, não só pela morosidade, mas também pela ineficiência da justiça, é que Bolsonaro foi um bom aluno de Moro e enxergou aí nessa barafunda jurídica o caminho para atravessar a tormenta literalmente sem ser atormentado pelas leis.
*Carlos Henrique Machado Freitas