“A falta de uma estratégia mais assertiva para conter os ataques pode abrir espaço para um golpe ou uma derrota eleitoral em 2026”, alerta João Lister.
O terceiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva enfrenta desafios inéditos e perigosos, orquestrados por uma coalizão que reúne setores do Centrão, grandes veículos da imprensa nacional, o mercado financeiro especulativo, segmentos religiosos conservadores, milícias e organizações criminosas. Essa frente heterogênea, unida por interesses econômicos e políticos específicos, atua em várias frentes para minar a estabilidade do governo e suas promessas de reconstrução social, apresentadas durante a campanha eleitoral de 2022.
O sequestro do Orçamento da União pelo Centrão é emblemático. Projetos de interesse público são frequentemente relegados ao segundo plano, enquanto verbas públicas são canalizadas para esquemas que favorecem currais eleitorais e grupos privilegiados. Paralelamente, segmentos da grande imprensa reforçam uma narrativa desestabilizadora, alinhada aos interesses do mercado especulativo. Esse mercado, por sua vez, pressiona o governo com especulações sobre juros, câmbio e dívida pública, inviabilizando políticas de distribuição de renda e enfraquecendo a percepção de estabilidade econômica.
Outros atores completam o cerco. Setores religiosos conservadores, evangélicos e católicos, instrumentalizam pautas morais para polarizar a sociedade, enquanto milícias e organizações criminosas consolidam territórios de exclusão social, explorando serviços públicos e promovendo a degradação ambiental com queimadas e mineração ilegal. Esses grupos buscam manter a concentração de renda e terra, garantindo que políticas de inclusão social permaneçam travadas.
A estratégia do governo: timidez perigosa – Diante desse cenário, a estratégia do governo Lula tem se mostrado tímida e, em certa medida, conciliatória. O diálogo constante com o Centrão e a tentativa de aprovar pautas relevantes por meio da negociação política parecem reproduzir um modus operandi que já demonstrou limitações no governo Dilma Rousseff. A ex-presidenta foi alvo de um impeachment que, embora revestido de legalidade formal, configurou-se como um golpe branco.
A ausência de uma mobilização popular robusta deixou Dilma vulnerável, especialmente após os protestos de 2013, que marcaram o início de sua impopularidade e subsequente isolamento. Esses atos, inicialmente voltados contra o aumento das tarifas de transporte público, rapidamente foram cooptados por setores que capitalizaram a insatisfação popular. Sem apoio maciço nas ruas, Dilma foi incapaz de resistir ao processo de impeachment, que selou sua queda.
Lula enfrenta um risco semelhante. A falta de uma estratégia mais assertiva para conter os ataques dos setores adversários e a dependência exclusiva de negociações políticas no Congresso podem abrir espaço para um golpe branco ou uma derrota eleitoral em 2026.
Mobilização popular: a chave para reverter o jogo – O terceiro governo Lula precisa aprender com os erros do passado e adotar uma estratégia que vá além da negociação política. O presidente deve recorrer à mobilização popular como instrumento de defesa e avanço de sua pauta política, econômica e social. Isso exige um esforço pessoal de Lula em visitar grandes cidades, promover comícios e criar um clima de engajamento que sensibilize a população sobre os entraves impostos pelos setores adversários.
A internet, embora fundamental, é insuficiente para mobilizar a militância e atingir os milhões de cidadãos prejudicados pelas políticas excludentes promovidas por seus adversários. A mobilização presencial tem o potencial de gerar um impacto emocional e político que a comunicação digital não alcança. A história recente do Brasil demonstra que, sem uma base popular ativa nas ruas, governos progressistas ficam vulneráveis a ataques institucionais e narrativas desestabilizadoras.
Lições de 2013 e a necessidade de antecipação – Os protestos de 2013 devem servir como lição. O governo Dilma foi surpreendido por uma mobilização que, embora inicialmente legítima, tornou-se um catalisador de sua impopularidade e subsequente queda. Lula não pode permitir que a direita e a ultradireita repitam a estratégia de mobilizar a população contra o governo.
Ao contrário, é necessário que o presidente lidere um movimento que antecipe e neutralize essas tentativas, promovendo um ambiente político em que os setores adversários sejam pressionados a recuar. Isso requer uma presença constante nas ruas, consolidando a base de apoio popular e revitalizando a militância que foi decisiva para suas vitórias eleitorais anteriores.
Sem mobilização, não há futuro – Sem uma estratégia de enfrentamento mais ousada, o governo Lula corre o risco de ser engolido pelas forças que buscam sua derrocada. A história recente do Brasil é clara: governos progressistas só sobrevivem a ataques sistemáticos quando contam com uma base popular ativa e mobilizada.
Lula tem o carisma e a experiência necessários para liderar essa mobilização. No entanto, o tempo é curto, e os adversários já estão organizados. É imperativo que o governo mude sua postura e enfrente seus inimigos com a mesma intensidade com que é atacado. Somente assim será possível garantir a continuidade do projeto de reconstrução social e a viabilidade de uma reeleição em 2026.
*João Lister/247