2006. Durante a invasão do Líbano as forças armadas israelitas bombardearam e destruíram completamente o bairro Dahiya, no subúrbio sul de Beirute, onde se alojavam militantes do Hezbollah. Dois anos mais tarde o general Gadi Eizenkot, chefe do comando norte e mais tarde chefe do estado maior, descreveu assim a tática militar: “o que aconteceu no bairro Dahiya… acontecerá em qualquer cidade a partir da qual Israel seja alvejado… Do nosso ponto de vista não são cidades civis, mas bases militares. Isso não é uma recomendação. Isto é um plano. E foi aprovado.” Doutrina Dahiya.
2014. Várias cidades e campos de refugiados foram reduzidos a escombros em mais uma das várias guerras na faixa de Gaza. Em julho, a brigada de elite Golani atacou o bairro Shuja’iyya, na cidade de Gaza, tendo ali encontrado uma resistência feroz. O exército israelita bombardeou o subúrbio com artilharia pesada durante vinte e quatro horas consecutivas. O bairro desapareceu do mapa. Doutrina Dahiya.
2024. Um porta-voz do exército israelita declarou que “a ênfase é no estrago causado, não na precisão”. Um analista próximo dos militares explica que “esta é uma guerra psicológica… para afastar os civis para longe dos alvos do Hamas”. Quando o Ocidente disse que Israel tinha o dever de se defender sabia perfeitamente que estava a apelar à retaliação e à vingança — bombardeiem tudo. Aniquilem. Matem. Destruam. E no entanto todos no Ocidente sabem, pela sua própria experiência nas guerras coloniais, que as guerras de extermínio nunca produziram segurança — só ódio e violência e mais violência. Doutrina Dahiya.
1917 (data da declaração Balfour). Quando chegaram os primeiros judeus à Palestina já lá havia palestinianos. Cem anos depois há palestinianos na Palestina. No futuro continuará a haver palestinianos na Palestina. Cem anos depois a distância da guerra não é apenas a assimetria dos meios de guerra de um lado e do outro, mas a distância moral que se pretende estabelecer entre ambos. A distância que despersonaliza — de um lado, armado e superior, o soldado justo; do outro lado, ao longe e sem defesa, o terrorista, essa “forma inferior de vida”. A doutrina Dahiya é a derrota moral que costuma anteceder a derrota militar.
*Dahiya/ICL