O que o mercado quer não é acertar as projeções, mas acertar a posição do BC
Em 2012, um grupo de grandes bancos se articulou para especular com a taxa Libor – a taxa básica do Banco da Inglaterra. Ela é amplamente utilizada como referência para uma enorme variedade de produtos financeiros – assim como a nossa Selic.
Eram peso pesados, como o Barclays, UBS, Citigroup, JPMorgan Chase, e Deutsche Bank. A manipulação consistia em submeter taxas falsas que beneficiavam as posições de negociação dos bancos e os interesses financeiros dos traders envolvidos.
As investigações financeiras envolveram reguladores de vários países. E constataram que esse jogo foi amplamente praticado de 2005 a 2010.
Como resultado, houve multas bilionárias. O Barclays pagou multa de US$ 450 milhões, o Deutsche Bank foi multado em US$ 2,5 bilhões. E tiveram suas reputações manchadas.
A lógica da política monetária – com pouquíssima relação com a economia real – reflete um pouco os estudos de Pavlov – aquele dos ratinhos com os reflexos condicionados externamente .
No mercado negociam-se papéis de vários prazos. Quando a taxa básica aumenta, há dois movimentos divergentes nas demais taxas:
1. As taxas de curto prazo aumentam, para acompanhar a Selic.
2. As taxas longas diminuem, porque pavlovianamente o mercado supõe que o BC vai combater a inflação, que cairá no médio prazo.
3. Se o mercado acredita que as taxas de inflação vão subir, pedirá mais pelos títulos pré-fixados.
O que o mercado quer não é acertar as projeções, mas acertar a posição do BC. Se errar junto com o BC, o trader ganha.
Por isso mesmo, o comportamento do Banco Central interfere diretamente nas expectativas do mercado, definindo quem ganha ou perde.
Se o presidente do BC dá uma declaração que inverte as expectativas, quem for informado antes, ganha.
O termômetro das expectativas do mercado é a Pesquisa Focus – no qual várias instituições colocam suas projeções, sem se identificar, o que facilita enormemente a manipulação das taxas – ainda mais quando aparece um presidente de Banco Central cúmplice das armações.
Foi o que constatou Eduardo Moreira, do ICL, quando foi conferir as projeções de inflação, e conferiu que a taxa máxima projetada de inflação para 2025 a 2028 era de 8% ao ano – um salto monumental que, por si só, identifica manobras especulativas. Antes dela, o presidente do BC, Campos Neto, já iniciara um processo de reversão das expectativas otimistas com sua fala em evento do BTG em Nova York.
Antes disso, em 30 de março de 2023, mal iniciara o governo Lula, Campos Neto deu entrevista dizendo que, para cumprir a meta de inflação de 2023, a Selic teria que ir para 26,5% ao ano.
Por que isso? Porque se a Selic é alta – e estava em 13,75% – o mercado “lê” uma inflação futura menor, e derruba as taxas longas. Mas Campos Neto acenava com uma inflação infinitamente maior – a ponto de precisar de uma Selic de 26,5% -, justamente para impedir a queda das taxas longas de juros
Agora repete o jogo especulativo. O IPCA está em tendência de baixa. Mesmo assim a curva de juros aponta para uma Selic de 11% em 2025 e de 12% em 2026.
Por que isso? Porque houve o que o mercado chamada de “desancorarem das expectativas”. Ou seja, as expectativas eram todas otimistas. De repente, virou. E o que provocou a virada? Justamente a declaração de Campos Neto de que as turbulências nos Estados Unidos obrigavam a uma redução no ritmo de queda na Selic. As turbulências encerraram-se dias depois, mas ele não refez sua previsão.
Em cima disso, grandes jogadores do mercado passaram a jogar com a taxa de IPCA de 8% mais à frente.
São sinais evidentes de um imenso jogo especulativo, que custa caríssimo ao país. Se a Selic caísse de 13,5% para, digamos, 8% ao ano, ainda haverá uma taxa real (diferença em relação à inflação esperada) altíssima, mas o Tesouro obteria uma economia entre R$ 82,5 bilhões a R$ 137,5 bilhões por ano.
*GGN