Joaquim de Carvalho*
O inquérito aberto pela Polícia Federal é o único caminho hoje para eliminar todas as dúvidas que cercam o episódio da morte de um homem em Paraisópolis, no dia 17 de outubro do ano passado, durante ato de campanha de Tarcísio de Freitas.
O inquérito realizado pela Polícia Civil em São Paulo terminou sem apontar a autoria do tiro que acertou as costas de Felipe Silva de Lima, de 29 anos.
O Ministério Público do Estado de São Paulo concordou com o relatório da polícia e o inquérito foi arquivado, por decisão do juiz Jair Antonio Pena Junior, do 1º Tribunal do Júri da capital.
“Tem pessoas que viram, colegas meus que viram, e falaram que foi o agente do Tarcísio que atirou no Felipe a cinquenta metros dele”, afirmou Ana Paula Batista de Oliveira, que teve três filhos com a vítima e estava recém-separada dele quando o crime ocorreu.
O agente a que Ana Paula se refere é Danilo Campetti, da Polícia Federal, que aparece em imagens divulgadas no dia com arma na mão e com distintivo da corporação policial.
Perguntado se as testemunhas prestariam depoimento, Ana Paula respondeu que não. “Não, porque ninguém confia. Eu mesma estou dando a minha cara porque, realmente, eu quero justiça. Mas eles são sujos, eles são nojentos, eles matam e acabou”, disse.
Danilo Campelli foi procurado pelo 247 mais de uma vez, e não se manifestou. O governo Tarcísio de Freitas também foi procurado e, em nota, afirmou:
“O caso foi investigado por meio de Inquérito Policial (IP) instaurado pelo Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), sendo relatado à Justiça em dezembro de 2022. O IP não retornou à unidade desde então. Questionamentos devem ser encaminhados ao Poder Judiciário.”
Ana Paula não foi chamada para prestar depoimento nesse inquérito da Polícia Civil e a família não conseguiu sequer reaver os bens apreendidos com Felipe, entre os quais o aparelho de telefone celular e a motocicleta, que ele pilotava no momento em que levou o tiro. A moto está em seu nome e livre de ônus.
O tiro que matou Felipe acertou as suas costas, o que enfraquece a narrativa, divulgada pela campanha à época, de que os policiais militares responderam a um ataque de bandidos em Paraisópolis. Felipe não tinha condenação nem mandado de prisão.
Além disso, não foi apreendida arma com Felipe nem realizado teste em suas mãos que apontasse a presença de elementos químicos próprios de quem efetua disparo.
O homem que aparece em imagens de vídeo na garupa da moto de Felipe gravadas pouco antes deste ser morto, Rafael de Almeida Araújo, até hoje não foi preso. Sua prisão poderia ajudar a esclarecer o que ocorreu naquele final de manhã.
A Polícia Militar também recolheu cápsulas deflagradas, sob alegação de que moradores poderiam alterar a cena do crime. Na verdade, quem alterou foram os próprios policiais.
Felipe também foi retirado do local, embora fotosindiquem que ele já estivesse morto. Mesmo diante desses indícios, o promotor que se manifestou pelo arquivamento do caso, Fábio Tosta Horner, entende que a PM agiu corretamente.
“Os policiais militares usaram os meios necessários para repelir atual e injusta agressão, sem incorrer em excesso, tendo em vista que agiram dentro dos rígidos limites da lei”, afirmou, no texto acolhido pelo juiz.
Talvez seja esta a razão do governo Tarcísio se posicionar contra a investigação da PF. Em nota, a assessoria do governador disse que o caso já foi investigado pela Justiça Eleitoral e a conclusão é que “não houve ingerência política eleitoral no episódio” e, portanto, “não há o que ser averiguado pela Polícia Federal”.
O oficial da Abin Fabiano Cardoso de Paiva, que trabalhou com Tarcísio na campanha e também quando o atual governador de São Paulo era ministro de Jair Bolsonaro, já está sendo investigado em outro escândalo.
Trata-se da operação da PF deflagrada na semana passada, para apurar o uso ilegal de um programa criado em Israel que é capaz de monitorar o deslocamento das pessoas, através de celular.
Segundo a investigação, esse programa foi usado sem autorização judicial, e teve como alvos jornalistas, advogados e adversários de Jair Bolsonaro. Fabiano foi alvo de medida de busca e apreensão.
A campanha de Tarcísio de Freitas em São Paulo, como se vê, contou com a presença de quem transitava pelos subterrâneos da espionagem, como o policial do serviço reservado da PM de São Paulo, ou o próprio Fabiano Cardoso.
O caso de Paraisópolis grita por uma investigação profunda e isenta. O que foi feito até agora está coberto pela nuvem da suspeita. Do que Tarcísio de Freitas tem medo?
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