Milton Alves*
Em Curitiba nos círculos políticos à esquerda e à direita uma avaliação é comum: o funeral da Lava Jato, com a aproximação do enterro político dos seus dois principais líderes: o atual senador Sergio Moro e o ex-deputado federal Deltan Dallagnol, que já foi cassado e caminha para uma militância vegetativa na extrema direita —, ressentido acena com uma pregação baseada no mais rasteiro fundamentalismo neopentecostal.
Por sua vez, Sergio Moro começa sentir o bafo quente na nuca do inevitável acerto de contas com o rol de crimes que praticou durante a nefasta operação Lava Jato. Até o panfleto ultra reacionário, conhecido pela alcunha de Gazeta do Povo, “largou os bets”, como se diz por aqui. Articulistas da “Gazeta” avaliam que Moro não vai escapar da “vingança” dos políticos. Dizem que é um jogo jogado, questão de tempo. E o tempo político opera contra Sergio Moro, o antes todo poderoso, amarga atualmente um crescente isolamento político e jurídico.
Nos últimos dias, contando a partir da semana passada, a Lava Jato sofreu três pesados golpes: a cassação do mandato de Deltan Dallagnol, as graves denúncias do empresário e agente infiltrado da força-tarefa de Curitiba, Tony Garcia, e a autorização pelo STF para o depoimento de Tacla Duran na Câmara dos Deputados, ao vivo e a cores.
O cenário adverso para os criminosos da Lava Jato fica ainda mais complicado com a disposição do juiz Eduardo Appio, afastado da 13ª Vara de Curitiba por um golpe urdido por Moro, voltar ao cargo. Ele entrou com um pedido de medida liminar no Conselho Nacional de Justiça alegando que foi afastado em razão de um áudio encaminhado por Moro ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), em Porto Alegre, ameaçando o desembargador federal Marcelo Malucelli. Uma perícia contratada pela defesa de Appio constatou que a voz não é a dele.
No breve período no comando da 13ª Vara de Curitiba, o juiz Appio iniciou um processo de desmonte da caixa preta da Lava Jato, o que incomodou bastante Moro e a sua turma.
O cerco se fecha e Moro isolado
No campo da extrema direita, Sergio Moro também padece de um crescente isolamento político. A facção bolsonarista do Partido Liberal (PL) até formulou um pedido de cassação de seu mandato, alegando abuso de poder econômico e suspeita da utilização de “caixa 2” nas eleições de 2022.
Na ação em curso, em fase de instrução, o PL defende que o jornalista Paulo Martins, que obteve 29,1% dos votos, seja empossado interinamente até a convocação de uma eleição suplementar para o Senado. Um argumento utilizado pelo partido foi o caso da ex-juíza e ex-senadora Selma Arruda, que teve o mandato cassado por abuso de poder econômico — a juíza ficou conhecida no Mato Grosso como a “Moro de saias”.
Uma fala do presidente nacional do PL, Valdemar Costa Neto, na última sexta-feira (9), resume bem o estado de espírito desse espectro político sobre o futuro dos lavajatistas: “Se eles tinham motivos para atacar Lula, era a parte deles. Só que ultrapassaram os limites da lei. Vão pagar caro”, afirmou em atividade partidária em São José dos Campos (SP), no Vale do Paraíba.
Uma outra ação para cassar o mandato de Sergio Moro (União Brasil) é movida pela Federação Brasil da Esperança – integrada pelo PT, PV e PCdoB – que pede a cassação do mandato do ex-juiz também pelo abuso de poder econômico e por gastos realizados ainda na fase de pré-campanha. Moro não prestou contas da pré-campanha presidencial fracassada, que foi impulsionada com recursos financeiros oriundos do Podemos, seu então partido.
E nesta segunda-feira (12), o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Luís Felipe Salomão, corregedor do Conselho Nacional de Justiça, iniciou uma inspeção sobre os depósitos judiciais efetuados por empresas e réus investigados pela operação Lava Jato. A apuração será realizada no TRF-4 e envolve inicialmente o montante de cerca de 300 milhões de reais.
Vale lembrar que Deltan Dallagnol tentou utilizar parte dos recursos dos depósitos judiciais para capitalizar uma esdrúxula Fundação Lava Jato, um projeto de mecanismo político de promoção da imagem dos procuradores e de Sergio Moro. A iniciativa foi barrada pelo ministro do STF, Alexandre de Moraes.
Neste sentido, a correção de rumos iniciada no STF exige medidas concretas para punir e responsabilizar penalmente os crimes cometidos no âmbito da operação Lava Jato. Além disso, é necessária uma ampla investigação do parlamento, com a participação da sociedade, para passar a limpo as ações criminosas perpetradas contra os direitos humanos fundamentais, os direitos políticos, a economia nacional, as ameaças contra as garantias individuais e o estado de direito — o que vai demandar o debate sobre uma reforma democrática do atual Sistema de Justiça, excludente e protetor dos interesses das classes dominantes.
Por último, na ferina e mordaz Boca Maldita, no coração da capital paranaense, bolsas de apostas sobre a duração do mandato de Sergio Moro já estão em plena atividade. “Façam suas apostas”, grita uma voz no improvisado pregão nos arredores dos cafés da Boca.
*Milton Alves é jornalista, escritor e ativista social. É militante do Partido dos Trabalhadores em Curitiba. Autor de ‘Lava Jato, uma conspiração contra o Brasil’ (Editora Kotter, 2021). Faz pós-graduação em Ciência Política.
*Com Esmael de Moraes