Conjur – É possível a utilização de prova ilícita, desde que em benefício do réu. Com esse entendimento, o ministro Reynaldo Soares da Fonseca, do Superior Tribunal de Justiça, determinou que a defesa de dois empresários condenados na operação “lava jato” tenha acesso às mensagens apreendidas na operação “spoofing” que citem seus nomes ou das suas empresas.
As conversas entre procuradores da República e o ex-juiz e senador Sergio Moro foram interceptadas por hackers e apreendidas pela Polícia Federal. A defesa dos empresários pediu acesso ao conteúdo sob o argumento de que as mensagens poderiam demonstrar “a absoluta ilegalidade e a manifesta improcedência da acusação” por crimes de corrupção e lavagem de dinheiro no âmbito da “lava jato”.
O pedido foi negado nas instâncias inferiores, pois a operação “spoofing” tramita em sigilo e ainda há dúvidas quanto à licitude da prova. No entanto, para o ministro Reynaldo Soares da Fonseca, não admitir o uso de provas obtidas por meios ilícitos é uma limitação ao direito de punir do Estado, não havendo óbice à sua utilização em benefício do acusado, haja vista o princípio da proporcionalidade.
“Ao ponderar os princípios em confronto, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Agravo Regimental na Reclamação 43.007/DF, assentou que as decisões proferidas naqueles autos, ‘apenas autorizaram, fundadas no direito constitucional, em verdade, universal, à ampla defesa e ao contraditório, o acesso a conteúdos apreendidos na ‘operação spoofing’ relacionados, direta ou indiretamente, ao reclamante'”.
Na ocasião, o STF autorizou o acesso da defesa do presidente Luiz Inácio Lula da Silva às mensagens, bem como do senador Renan Calheiros. Em outra reclamação, o Supremo concedeu o acesso à defesa do ex-deputado Eduardo Cunha, sempre com supervisão da Polícia Federal e limitado às conversas que mencionem os políticos em questão.
O ministro Fonseca se baseou nesses precedentes do STF para autorizar o acesso da defesa dos empresários às mensagens, mesmo que ainda haja discussão em torno da licitude da prova. Segundo ele, a melhor doutrina autoriza a utilização da prova ilícita, desde que em benefício do réu, o que é exatamente a hipótese dos autos.
“Os recorrentes foram condenados na denominada operação ‘lava jato’ e buscam ter acesso às mensagens trocadas informalmente no âmbito da força-tarefa, as quais podem, eventualmente, auxiliar no exercício da ampla defesa e do contraditório. Justificam a necessidade de acesso aos diálogos em razão de terem tomado conhecimento da existência de graves ilegalidades na condução e celebração de acordos de colaboração premiadas, que teriam sido manipulados para instrumentalizar acusações e amparar condenações judiciais contra os recorrentes.”
Conforme o ministro, não é possível negar que uma eventual confirmação da tese defensiva de que haveria graves ilegalidades na condução e celebração dos acordos de colaboração poderia ser útil como instrumento de defesa em favor dos empresários.
“Destacou-se, ademais, que não se poderia exigir da defesa a comprovação de que o acesso às mencionadas provas lhe seria benéfico, porquanto é exatamente este o objetivo da impetração, ter acesso às mensagens que digam respeito aos recorrentes e às suas empresas, para então aferir o efetivo benefício à defesa”, completou Fonseca.