A deputada federal Carla Zambelli esbravejou, mas não explicou a fraude em documentos que entregou à Justiça Eleitoral ao prestar contas da campanha do ano passado.
Como mostrou a coluna na semana passada, papéis entregues pela deputada para comprovar serviços supostamente prestados a ela na corrida eleitoral de 2022 incluem dados de um comerciante que afirma jamais ter trabalhado na campanha.
Além disso, a assinatura do comerciante que aparece entre os documentos foi flagrantemente falsificada (confira mais abaixo).
Notas não explicam fraude
Procurada, Zambelli inicialmente limitou-se a explicar como funciona a prestação de contas de serviços prestados voluntariamente em campanhas eleitorais e afirmou que todos os voluntários que a ajudaram em 2022 “assinaram um contrato de cessão gratuita de serviços prestados”.
Habermann, de Ribeirão Preto, no interior paulista, que afirma não ter prestado qualquer serviço à campanha, mas teve seus dados e uma assinatura que seria sua incluídos no papelório enviado por Zambelli à Justiça Eleitoral.
Em nova nota, o escritório de advocacia que defende Zambelli afirmou que “as assinaturas que constam dos termos de voluntariado foram colocadas pelos próprios voluntários, por ocasião do preenchimento” e que Roberto Habermann “participou de evento de divulgação com a presença da então candidata à reeleição Carla Zambelli, no dia 02 de setembro de 2022, em Ribeirão Preto”, “ocasião em que foram prestados serviços voluntários de campanha”.
A nota, vale dizer, não faz qualquer menção à falsificação da assinatura de Habermann.
“Isso é uma mentira”
Entrevistado novamente, o comerciante afirmou tratar-se de uma mentira. Disse que, na data mencionada na nota de Zambelli, estava passando pela praça e apenas parou para cumprimentar amigos que que lá estavam. Afirmou assessores da deputada estavam entregando camisetas, mas que ele próprio não distribuiu nenhum material de campanha. E foi peremptório: não preencheu nem assinou nenhum documento como o que foi incluído na prestação de contas enviada por Zambelli à Justiça Eleitoral.
“Isso é uma mentira. Ela fala (no documento) que eu trabalhei 29 dias para ela. (…) Nesse dia (2 de setembro de 2022), eu estava passando pelo centro da cidade e tinha um pessoal amigo lá. Eu parei, cumprimentei todo mundo, nem vi a Carla. O Camilo (refere-se a Camilo Calandreli, assessor de Zambelli) estava lá. Eles estavam presenteando pessoas na praça com camiseta. Eu passei por lá, cumprimentei as pessoas, me deram a camiseta. Eu peguei a camiseta, falei: ‘Olha, não vou precisar, dá para quem usa. Eu não uso isso, dá pra quem precisa’, e fui embora. Isso é uma inverdade”, afirmou Habermann.
A coluna pediu ao comerciante para enviar imagens de um documento oficial para comparar com a assinatura que consta nos papéis apresentados à Justiça Eleitoral por Carla Zambelli. A diferença é gritante. Ou seja: o documento foi flagrantemente fraudado. Veja:
Diferença gritante: acima, a assinatura que aparece no documento entregue à Justiça Eleitoral por Zambelli. Abaixo, a assinatura verdadeira de Habermann.
Em nova nota, divulgada após a publicação da primeira reportagem, a deputada vociferou. Afirmou tratar-se de fake news e ameaçou processar os jornalistas. “Essa matéria é a típica fake news! Repudio veementemente esse tipo de conduta, e informo que as medidas judiciais para reparação de danos serão adotadas”, afirmou. A nota, divulgada no último sábado, dizia ainda que “após consulta nos arquivos de campanha, foram localizados arquivos que comprovam que o sr. Roberto Habermann prestou serviços de divulgação em pelo menos um evento da campanha de Carla Zambelli, corroborando o Termo de Voluntariado apresentado à Justiça Eleitoral”.
A nova nota, assim como as anteriores, não dava qualquer explicação sobre a falsificação da assinatura.
Deputada pode ser investigada por fraude
Especialistas ouvidos pela coluna explicaram que, em casos de irregularidades na prestação de contas de campanha de candidatos, pedidos de impugnação dos registros de candidatura podem ser feitos em até 15 dias após a diplomação. Depois disso, em situações como a da falsificação do documento apresentado Zambelli resta a possibilidade de ser aberta uma investigação por uso de informações falsas – o que pode ser requisitado às autoridades por qualquer cidadão.