Nesta semana, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), autorizou busca e apreensão na casa de Jair Bolsonaro (PL) em operação que investiga o envolvimento do ex-mandatário em suposto esquema de fraude nos cartões de vacina dele e de sua filha, Laura.
Bolsonaro é alvo de ações no STF, no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e na Polícia Federal. No total, são 22 processos, que envolvem desde abuso de poder político até recebimento ilegal de joias da Arábia Saudita. Dessas ações, seis são conduzidas por Moraes, segundo o Metrópoles.
Apoiadores do ex-presidente usam o número como argumento para defender que há uma “perseguição” do ministro contra Bolsonaro. Trocas de farpas entre os dois se tornaram comuns, principalmente durante o período das eleições, quando Moraes foi responsável por uma série de decisões que afetaram os planos de reeleição do ex-titular do Planalto.
Os questionamentos sobre os “superpoderes” de Moraes e as acusações de perseguição ganharam mais força após a busca e apreensão na casa de Bolsonaro. Isso porque a ação foi solicitada pela Polícia Federal, mas a Procuradoria-Geral da Pública (PGR) foi contra a medida. Segundo Lindôra Araújo, vice-procuradora da República, não haveria provas suficientes para justificar as buscas na residência do ex-chefe do Executivo.
Como Moraes é relator do Inquérito das Milícias Digitais (Inq. 4.874), que já apura suposta fraude ou “peculato digital” de Bolsonaro, foi o ministro quem autorizou as diligências nesse caso.
O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), filho do ex-presidente, afirmou que a operação era “cortina de fumaça” para tentar “assassinar a reputação” de seu pai. “Ficam buscando qualquer coisa que resulte em uma prisão arbitrária dele, ou numa inelegibilidade sem qualquer fundamento”, disse.
Já o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) chamou a operação de “esculacho” e falou em “perseguição da esquerda” contra o pais.
A relatoria de um caso no STF é decidida de forma aleatória, por meio de sorteio, como explica o especialista em direito constitucional e Tribunais Superiores Bryan de Jongh Martins: “Quando uma ação é apresentada ao STF, ela é encaminhada à Secretaria Judiciária. Lá, eles separam essa ação de acordo com o tipo dela, se é uma Aije, uma ADC, um HC, é classificada. E depois é inserida em um sistema eletrônico de distribuição, que realiza um sorteio entre os ministros, e faz essa distribuição dos casos”.
O ministro relator é, então, responsável por elaborar um relatório, um voto e apresentar o caso para julgamento.
Em algumas situações, no entanto, a ação pode ser remetida diretamente a um ministro. Isso acontece quando já há casos conexos tramitando no tribunal que se relacionam ao principal.
“A função desse sistema é garantir a imparcialidade e eficiência na distribuição dos processos. A exceção é em relação a questões conexas, que o processo pode ser distribuído para o juiz que já relata uma ação que guarda íntima relação com a nova ação a ser distribuída”, explica Martins.
Ações no TSE
Bolsonaro responde ainda a 16 Ações de Investigação Judicial Eleitoral (Aijes), no Tribunal Superior Eleitoral. Nesse caso, Moraes não é relator. O ministro sorteado para todos os processos é o corregedor-geral Eleitoral, ministro Benedito Gonçalves.
Ele tem dado andamento às investigações, denúncias, ouvindo testemunhas e colhendo provas nas ações que podem deixar Bolsonaro inelegível.
O caso mais avançado, que está pronto para julgamento, trata de falas do ex-presidente em reunião com embaixadores. Na ocasião, Bolsonaro levantou suspeitas sobre as urnas eletrônicas e repetiu argumentos já desmentidos por órgãos oficiais.
O ato foi interpretado como propaganda antecipada, uma vez que o encontro aconteceu em período eleitoral. Nesse caso, Bolsonaro é investigado pela prática de propaganda antecipada irregular.
Apesar de não relatar nenhuma ação contra Bolsonaro no TSE, Moraes é presidente da Corte e decide quando cada caso vai a julgamento.
Alexandre de Moraes relata processos que envolvem Bolsonaro Apologia ao estupro
O ex-presidente ainda é alvo de duas ações penais, encaminhadas para a 1ª instância após Bolsnaro perder o foro privilegiado.
Ele responde por incitação ao estupro e injúria contra a deputada federal Maria do Rosário (PT). Foi denunciado pela PGR por dizer, no plenário da Câmara dos Deputados, que a deputada “não merecia ser estuprada por ser feia”.
No dia seguinte às afirmações, Bolsonaro enfatizou seu pensamento ao conceder entrevista ao Jornal Zero Hora. Na ocasião, disse que “jamais a estupraria” porque Maria do Rosário “é muito feia, não faz seu gênero”.
Em 2017, as duas ações foram recebidas pelo STF por maioria. No entanto, o ministro Luiz Fux suspendeu o caso, em 2019, por considerar que “o presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções”.
Neste ano, as ações foram remetidas à primeira instância do DF pelo ministro Dias Toffoli.
Ataques a Moraes
Com a concentração de ações na relatoria de Moraes, bolsonaristas passaram a chamar o ministro de “ditador”, repetindo a narrativa de “perseguição” contra o ex-presidente.
Como mostrou o Metrópoles, a ala radical de políticos próximos a Bolsonaro sugeriu ao então presidente, em dezembro do ano passado, a prisão do ministro Alexandre de Moraes, como parte do Estado de Defesa no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
O assunto chegou a ser discutido no Palácio da Alvorada. Um grupo de parlamentares, de duas siglas, defendeu a prisão de Moraes sob alegação de interferência direta no processo eleitoral e, consequentemente, no exercício da democracia. O esquema não foi para frente, sem apoio das lideranças da legenda de Bolsonaro, o Partido Liberal.
No entanto, com a prisão do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, Mauro Cid, a ideia ressurgiu na ala radical da sigla. A justificativa para a prisão de Moraes seria a suposta interferência do magistrado no processo eleitoral.
Na última quinta (4/5), a CNN noticiou que a Polícia Federal detectou áudios nos quais Cid participa de discussão sobre golpe de Estado.