O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) tornou-se alvo de um pedido formal de responsabilização criminal devido à sua atuação durante a pandemia de Covid-19. Em uma iniciativa conjunta, o Conselho Nacional de Saúde (CNS) e o Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH) protocolaram um requerimento junto à Procuradoria Geral da República (PGR) para reativar investigações e averiguar as ações e omissões do governo Bolsonaro que, segundo os conselhos, resultaram em consequências devastadoras para a saúde pública e na morte de milhares de brasileiros entre 2020 e 2022.
A solicitação destaca a incompatibilidade entre as políticas adotadas pelo governo Bolsonaro e as orientações científicas da Organização Mundial da Saúde (OMS). “O número exorbitante de casos e óbitos por Covid-19 notificados, sem contar aqueles que não o foram, é notoriamente o resultado da política sanitária adotada pelo governo do ex-Presidente da República Jair Messias Bolsonaro que se posicionou na contramão das orientações da comunidade científica”, diz o documento, sublinhando que Bolsonaro teria agido decisivamente para expandir a disseminação do vírus, seja por ações diretas ou omissões.
Confira requerimento na íntegra
Desacordo com medidas preventivas
Durante o enfrentamento da pandemia, Bolsonaro expressou publicamente sua oposição a práticas como o isolamento social e as campanhas de vacinação, que ele afirmou serem prejudiciais à economia nacional. Além disso, a administração adotou medidas como a promoção de medicamentos sem eficácia comprovada contra a Covid-19 e o incentivo à imunidade de rebanho por contágio, contrariando recomendações científicas. Essas ações são apontadas no requerimento como parte de uma “sabotagem” do governo para limitar o controle e a prevenção da Covid-19.
Compromisso com o direito sanitário e a memória
No encontro realizado em Brasília nesta quinta-feira, representantes do CNS, CNDH, Conecta Direitos Humanos, Associação Vida e Justiça, Associação de Vítimas e Familiares de Vítimas da Covid-19 (Avico Brasil), e Associação dos Servidores da Fundação Oswaldo Cruz (ASFOC-SN) enfatizaram a importância da responsabilização. Fernando Pigatto, presidente do CNS, destacou a relevância do Brasil como signatário de compromissos científicos internacionais, afirmando que “o fortalecimento do Estado brasileiro, assim como da Democracia e do Estado Democrático de Direito, é fundamental”.
Marina Dermmam, presidenta do CNDH, destacou o compromisso dos conselhos em “defender os direitos humanos e a responsabilização dos agentes públicos que foram causadores de milhares de mortes durante a pandemia da Covid-19”. O vice-presidente do CNDH, André Carneiro, ressaltou que o processo será conduzido sob a ótica do direito sanitário, uma abordagem essencial para assegurar que a análise considere o impacto das políticas de saúde pública e sua efetividade.
PGR avaliará medidas
Sílvio Roberto Amorim, procurador regional da República e secretário de relações institucionais da PGR, que recebeu a comitiva em Brasília, defendeu que a PGR atuará observando as particularidades do caso, incluindo a perspectiva de direitos humanos: “O MPF é a casa da garantia dos direitos humanos, e a PGR tem essa dimensão”.
Gabriel Sampaio, diretor da Conecta Direitos Humanos, detalhou que o processo foi elaborado com o apoio da Universidade de São Paulo (USP) e pontua práticas que deverão ser investigadas, incluindo a promoção de aglomerações e a recomendação de medicamentos ineficazes. Segundo Sampaio, a OMS havia estimado que o Brasil tinha infraestrutura para responder adequadamente à crise sanitária, mas o país chegou a 600 mil mortes, 10% das mortes globais por Covid-19. “Se estivesse na média mundial, o Brasil teria registrado cerca de 130 mil mortes”, revela Sampaio, indicando uma grave falha administrativa.
Prevenção da impunidade e fortalecimento do direito sanitário
A preocupação dos conselhos vai além da responsabilização imediata. Eles alertam que a falta de ações judiciais enfraquece o arcabouço jurídico brasileiro, dificultando a resposta a futuras emergências de saúde pública. Com o requerimento na PGR, os conselhos esperam que as investigações avancem no Supremo Tribunal Federal (STF), trazendo justiça às vítimas e garantindo o direito à memória e à verdade para toda a população brasileira.