As recentes discussões acaloradas entre o presidente francês Emmanuel Macron e o primeiro-ministro israelense Benyamin Netanyahu, tendo como pano de fundo a ofensiva de Israel no Líbano, mantêm nos bastidores uma polêmica cheia de provocações. Macron solicitou a instauração de uma trégua na região, um pedido que foi mais uma vez rejeitado por Netanyahu antes que o tom se elevasse entre os dois líderes. No tiroteio verbal, sobrou até para as origens da “criação do Estado de Israel”.
A temperatura nas relações bilaterais despencou drasticamente há dez dias, quando Emmanuel Macron pediu o “fim do fornecimento de armas” para os combates em Gaza.
Na terça-feira (15/10), as relações se esfriaram ainda mais com a frase que o presidente francês teria supostamente proferido durante o Conselho de Ministros na França. “Netanyahu não deve esquecer que seu país foi criado por uma decisão da ONU. E, consequentemente, este não é o momento de desconsiderar as decisões da ONU”, teria dito o chefe de estado, uma declaração amplamente repercutida na França e no mundo.
A “decisão” a que Macron se refere é a Resolução 181 adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em novembro de 1947, no pós-Segunda Guerra Mundial, que prevê a criação de um Estado judeu e de um Estado árabe no Oriente Médio.
O presidente francês teria, através da suposta declaração, não desmentida pelo Palácio do Eliseu, feito uma crítica ao polêmico posicionamento do líder israelense na última Assembleia Geral da ONU, quando chegou a desdenhar da organização, e também das declarações de Netanyahu exortando as Nações Unidas a “protegerem suas forças de paz [Unifil] no Oriente Médio”, porque sua presença atrapalharia o “resgate de reféns”.
Reações fortes de Netanyahu e do Crif
Furioso, o primeiro-ministro israelense respondeu imediatamente em um comunicado à imprensa. “Não foi a decisão da ONU que deu origem ao Estado de Israel”, disse Netanyahu, “mas a vitória alcançada na guerra de independência por combatentes heroicos, incluindo muitos sobreviventes do Holocausto, inclusive do regime de Vichy na França”. Uma formulação deliberadamente mordaz acompanhada de uma referência ao doloroso passado dos judeus da França.
O episódio conhecido como o “regime de Vichy”, cuja memória ainda causa desconforto nos franceses, foi o sistema político autoritário e colaboracionista de autoridades francesas da época com a Alemanha nazista, um regime estabelecido na França após sua rendição, em 22 de junho de 1940, durante a Segunda Guerra Mundial, que encerrou a ofensiva alemã sobre o país, a Holanda, a Bélgica e Luxemburgo. Milhares de judeus franceses foram deportados sob o regime de Vichy para os campos de concentração de Hitler, sob o olhar complacente das autoridades francesas da época. “Colaboracionista” continua a ser um termo extremamente pejorativo na França desde então.