Novos projetos chegam em momento de tarifa em alta, com entrada em vigor este mês da bandeira amarela devido à previsão de média de chuvas cerca de 50% abaixo da registrada nos últimos anos.
Dois projetos de lei que estão em tramitação no Congresso Nacional podem onerar ainda mais a conta de luz da população. A estimativa é que, caso aprovadas, essas propostas envolvendo o estímulo a energias eólicas offshore e microgeração distribuída para a população de baixa renda possam gerar um custo extra de ao menos R$ 28,9 bilhões por ano nas tarifas.
Especialistas advertem que os riscos podem ir além. Há o temor de que os investimentos em segurança e adaptação do sistema interligado não acompanhem o aumento da oferta de energia renovável.
De acordo com a Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee), o impacto do PL das eólicas offshore é de 11% nas tarifas. Já o PL 624 provoca aumento de 2,01% na conta. Segundo Ricardo Brandão, diretor de Regulação da Abradee, ambos os PLs levarão a uma alta estrutural nas tarifas, cujo impacto na conta de energia vai perdurar até 2050.
Os novos projetos chegam em um momento de tarifa em alta. Semana passada, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) informou que este mês vai vigorar a bandeira amarela devido à previsão de uma média de chuvas cerca de 50% abaixo da registrada nos últimos anos e pela expectativa de crescimento de consumo.
É a primeira vez que isso ocorre desde 2022. Sem considerar a adoção da bandeira amarela, a previsão era que as contas das 52 concessionárias do país tivessem aumento médio de 5,6%, cenário que deve se manter em 2025, apontam especialistas.
No caso do projeto das eólicas offshore (PL 11.247), que tramita na Comissão de Infraestrutura do Senado, sob relatoria de Weverton Rocha (PDT-MA), especialistas ressaltam que o texto prevê um conjunto de contratações compulsórias de fontes, como térmicas a gás e pequenas centrais hidrelétricas (PCHs), além da manutenção da operação de usinas a carvão e a construção de plantas de hidrogênio e usinas eólicas na Região Sul.
Além disso, a iniciativa amplia o período de desconto nas tarifas de transmissão para as fontes renováveis. Para Brandão, da Abradee, são contratações desnecessárias, já que o mercado vive um momento de sobreoferta de energia. Como o PL das eólicas offshore é original do Senado e já passou pela Câmara, a palavra final é dos senadores.
Para Clarice Ferraz, professora da Escola de Química da UFRJ e diretora do Instituto Ilumina, os PLs parecem não levar em conta os reais problemas do setor elétrico:
— No caso do PL da eólica offshore, o setor não entende por que dar incentivos para estimular a geração de uma usina no mar, que é três vezes mais cara que aquela em terra.
Já o PL 624 prevê o incentivo da microgeração distribuída, com placas solares, para a população de menor poder aquisitivo, além de criar o Programa Renda Básica Energética (Rebe), em substituição à Tarifa Social.
De acordo com o projeto, na microgeração distribuída a população de baixa renda não pagaria pela energia durante o dia. Já o consumo à noite seria pago, o que, para especialistas, pode acabar aumentando os custos para essas famílias, por causa do impacto dos subsídios nas tarifas. Além disso, o texto amplia o prazo para que esses projetos solares sejam incluídos no regime antigo de subsídios.
— Todos querem estar conectados ao sistema a um custo menor, onerando o sistema. Com mais opções renováveis, há necessidade de investimento em infraestrutura. No caso do PL 624, como será colocada essa geração distribuída para a baixa renda? Esta não terá mais a Tarifa Social. A leitura é que a pessoa vai economizar de dia, mas de noite como fica, já que será uma energia mais cara via distribuidora? Há dúvidas se isso não vai encarecer a conta — questiona Clarice.
O texto tramita na Comissão de Assuntos Sociais do Senado e já tem parecer favorável do relator, o senador Sérgio Petecão (PSD-AC). Depois, segue para a Comissão de Serviços de Infraestrutura (CI). Como o PL é original da Câmara, caso seja alterado no Senado voltará para apreciação dos deputados.
Alexei Vivan, diretor-presidente da Associação Brasileira de Companhias de Energia Elétrica (ABCE), explica que, diferentemente das bandeiras, que funcionam como uma antecipação de cobrança que ocorreria no reajuste tarifário anual da distribuidora, os subsídios são perenes:
— Caso aprovados os PLs, o aumento das tarifas se somará ao custo adicional das bandeiras. Acabam prevalecendo nas Casas Legislativas os interesses regionais ou de grupos específicos, sem uma avaliação mais ampla e prévia de seus impactos.