O plano apresentado pelo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) para o uso de câmeras corporais por policiais militares em São Paulo reduz o tempo de filmagem pela metade e diminui o prazo obrigatório de armazenamento. A nova licitação de compra é contestada no Supremo Tribunal Federal (STF) pela Defensoria Pública de São Paulo e a ONG Conectas Direitos Humanos. As entidades acionaram a Corte, alertando que o plano de Tarcísio traz uma “série de mudanças sensíveis que podem representar um retrocesso”.
A compra atende a um compromisso firmado em abril pelo governador com o STF, de que os PMs iriam obrigatoriamente usar câmeras corporais durante operações no estado. Convocada pelo presidente do Supremo, Luís Roberto Barroso, a gestão Tarcísio apresentou um cronograma estabelecendo a implementação dos aparelhos até setembro deste ano. Na ocasião, Tarcísio também alegou que aumentaria o número de equipamentos e que substituiria os que já estão em uso por novos.
O acordo atendeu a uma ação da Defensoria e da Conectas que, ano passado, cobraram na Justiça a obrigatoriedade do uso das câmeras pela PM. As entidades chamaram atenção no processo para as denúncias de execuções sumárias, tortura e invasão na Baixada Santista dentro da Operação Escudo. Mas, apesar do compromisso, a licitação de compra de Tarcísio não prevê que os aparelhos tenham autonomia para captar imagens por até 12 horas, como é atualmente.
Retrocesso no plano de Tarcísio
O risco é de que metade do turno policial fique sem captação de imagem nem som, de acordo com a Defensoria e a Conectas. A queixa das entidades no STF se baseia em uma nota técnica elaborada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos da Universidade Federal Fluminense (UFF) e o Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (USP). O documento destaca que a gravação de todo o turno policial garante transparência e proporciona maior proteção tanto para os agentes quanto para a população, diz a RBA.
Ao analisar o plano de Tarcísio, as entidades também contestam a diminuição no prazo obrigatório de armazenamento de imagens obtidas pelas câmeras corporais. O que será reduzindo de 60 para 30 dias no caso de vídeos de rotina. E de um ano para 120 dias se eles forem gravados intencionalmente. “Os prazos para armazenamento devem ser estendidos, e não reduzidos”, afirma a Defensoria e a Conectas ao STF.
As organizações destacam a importância dos registros em casos de operações policiais que resultam em mortes e passam a ser investigadas. O ofício enviado a Barroso também adverte contra a previsão de que as câmeras corporais usem tecnologias de reconhecimento facial. “Não há registro de experiência exitosa anterior em âmbito nacional ou estrangeiro de combinar o uso de câmeras corporais a essas tecnologias, ao contrário. Os algoritmos de reconhecimento facial utilizados ao redor do mundo não passam por testes públicos ou independentes para determinar sua precisão ou identificar possíveis vieses antes de serem implantados”, completam.
Licitação é questionada no STF pela Defensoria Pública de São Paulo e a ONG Conectas, que cobram a implementação dos equipamentos. Para as entidades, proposta do governador representa um retrocesso.
Efetividade das câmeras na PM
A letalidade policial desabou em batalhões do estado de São Paulo após a expansão do programa, em 2021. Segundo levantamento apresentado pelo jornal Folha de S. Paulo, nas 18 unidades da PM em que a proposta foi adotada — na capital, litoral e interior —, o número de mortes em supostos confrontos com agentes diminuiu 85% de junho a dezembro de 2021, comparados ao mesmo período de 2020.
Em março, uma pesquisa Datafolha também mostrou que a maioria da população apoia a implementação dos equipamentos. Praticamente nove em cada dez paulistanos são a favor de câmeras corporais nos uniformes de policiais.