Israel fez neste domingo (7) uma desocupação parcial de suas tropas do Sul da Faixa de Gaza depois de seis meses de uma guerra devastadora no território e diante de forte pressão internacional.
A decisão foi tomada devido ao esgotamento de todas as operações de inteligência e combate na região, ressaltou fonte do Exército, negando que tenha sido resultado da exigência feita pelo presidente dos Estados Unidos ao primeiro-ministro Benjamin Netanyahu.
Segundo a agência de notícias Reuters, um porta-voz militar afirmou que apenas uma brigada permanece na região.
“Hoje, domingo, 7 de abril, a 98ª Divisão de Comando das Forças de Defesa de Israel concluiu sua missão em Khan Yunis. A divisão deixou a Faixa de Gaza para se recuperar e se preparar para operações futuras”, afirmou o Exército em comunicado enviado à agência de notícias AFP.
Ainda segundo o oficial, a saída de Khan Yunis permitirá que os palestinos deslocados voltem para suas casas depois de se abrigarem em Rafah. Ele esclareceu, no entanto, que uma “força significativa” continuará operando em outros lugares do território palestino sitiado, capaz de “conduzir operações precisas baseadas em inteligência”.
— Nossa missão era desmantelar a Brigada Khan Yunis do Hamas, e fomos bem-sucedidos nisso —afirmou. — Nossa segunda missão era devolver os reféns, e não conseguimos. A operação no complexo hospitalar de al-Shifa contribuiu para a decisão de mudar nossa percepção em relação aos combates no sul da Faixa.
Em um futuro próximo, as Forças Armadas planejam designar três divisões para a fronteira de Gaza, a partir das quais as forças do exército poderão se deslocar para a Faixa sempre que necessário, disse o oficial. As forças também ficarão estacionadas no Kibbutz de Kissufim, na fronteira com Gaza, informou o jornal israelense Haaretz, segundo O Globo
Para Netanyahu, Israel está a apenas “um passo da vitória” e prometeu que não haverá trégua nos combates até que o Hamas liberte todos os reféns.
— Não haverá cessar-fogo sem o retorno dos reféns. Isso simplesmente não acontecerá — disse o premier israelense ao seu Gabinete, enfatizando que “Israel está pronto para um acordo”, mas “não está pronto para se render”.
A retirada parcial das tropas israelenses do sul da Faixa de Gaza é provavelmente para que seu efetivo possa “descansar e se recondicionar”, em vez de uma movimentação para uma nova operação, declarou a Casa Branca neste domingo.
Os ataques aéreos continuaram a bombardear Khan Yunis e Rafah durante a noite, segundo testemunhas oculares.
A notícia da retirada parcial veio no dia em que se esperava que as negociações para uma trégua e um acordo de libertação de reféns fossem retomadas no Cairo.
O chefe da CIA, Bill Burns, e o primeiro-ministro do Qatar, Sheikh Mohammed bin Abdulrahman bin Jassim al-Thani, se juntarão às autoridades egípcias para conversações indiretas a partir deste domingo entre as delegações israelense e do Hamas, informou o jornal egípcio al-Qahera News.
Netanyahu há muito tempo ameaçava uma ofensiva terrestre na cidade de Rafah, no extremo sul de Gaza, gerando preocupação global, inclusive do principal aliado de Israel, os Estados Unidos.
Cerca de 1,5 milhão de palestinos estão amontoados na área da fronteira egípcia, muitos vivendo em barracas. Dezenas de pessoas deixaram Rafah a pé, em carros e em carroças de burro e retornaram a Khan Yunis neste domingo, após a retirada israelense, segundo imagens da AFP.
Na quinta-feira, o presidente Joe Biden ameaçou pela primeira vez condicionar o apoio dado a Israel à adoção pelo governo de Netanyahu de medidas tangíveis para responder à catástrofe humanitária em Gaza. No primeiro telefonema entre os dois líderes após a morte de sete trabalhadores humanitários em um ataque israelense no enclave palestino, o americano subiu o tom. O democrata também aumentou o tom e pediu que o premier chegasse a um “cessar-fogo imediato” no território palestino, refletindo uma “grande frustração” com o governo do Estado judeu, segundo a Casa Branca.
“O presidente Biden enfatizou que os ataques aos trabalhadores humanitários e a situação humanitária geral são inaceitáveis”, informou a Casa Branca em um comunicado.
A declaração foi a mais incisiva emitida pela Casa Branca nos seis meses de guerra entre Israel e o Hamas, ressaltando a crescente frustração do presidente com Netanyahu, que desafiou a pressão americana para reduzir o sofrimento dos civis em Gaza. Foi a primeira vez também que Biden sugeriu que os EUA poderão condicionar sua assistência a Israel, um importante aliado no Oriente Médio.
Neste domingo, vários caminhões de ajuda humanitária entraram no sul de Gaza pelo cruzamento de Rafah com o Egito, com os motoristas buzinando enquanto multidões corriam atrás deles, segundo imagens da AFP TV.
Israel enfrentou uma tempestade de indignação internacional pela morte de sete trabalhadores humanitários da organização beneficente de alimentos World Central Kitchen, sediada nos EUA, em um ataque aéreo em Gaza no dia 1º de abril.
Muhammad Yunis, de 51 anos, palestino e pai de seis filhos no norte de Gaza, disse à AFP que os 2,4 milhões de habitantes do território precisam desesperadamente de um alívio dos bombardeios e do sofrimento.
— Já se passou meio ano e os bombardeios e a fome continuam — disse o homem de Beit Lahia, que agora é uma paisagem de prédios destruídos. — Ver os corpos magros de nossos filhos nos tira a alma. Sinto-me impotente e humilhado. O bombardeio, a morte e a destruição não são suficientes? Ainda há corpos sob os escombros. Podemos sentir o mau cheiro.
A chefe da UNICEF, Catherine Russell, destacou que mais de 13 mil crianças estariam entre os mortos.
“Casas, escolas e hospitais em ruínas. Professores, médicos e humanitários foram mortos. A fome é iminente”, disse ela no X, antigo Twitter, no sábado. “O nível e a velocidade da destruição são chocantes. As crianças precisam de um cessar-fogo AGORA”.
A guerra de Gaza teve início em 7 de outubro com um ataque de combatentes do Hamas que resultou na morte de 1.170 pessoas, a maioria civis, segundo dados israelenses. Integrantes do Hamas e da Jihad Islâmica também fizeram mais de 250 reféns, e 129 permanecem em Gaza, incluindo 34 que o exército diz estarem mortos.
A ofensiva de retaliação de Israel matou pelo menos 33.175 pessoas em Gaza, a maioria mulheres e crianças, de acordo com o Ministério da Saúde do território administrado pelo Hamas. Vastas áreas de Gaza foram transformadas em terreno baldio repleto de escombros, com sua população presa em uma terrível crise humanitária em meio ao cerco israelense.
Gaza tem recebido apenas ajuda esporádica por meio de uma travessia rodoviária com o Egito, lançamentos aéreos e dois carregamentos marítimos, e as agências de ajuda alertam que as entregas estão muito aquém das necessidades urgentes.
A maioria dos hospitais de Gaza está fora de ação e o maior deles, al-Shifa, é “agora uma concha vazia com sepulturas humanas”, disse o diretor da Organização Mundial da Saúde, Tedros Adhanom Ghebreyesus.