Ministro do STF mencionou a execução de medidas pelos investigados que levariam à manutenção do ex-presidente no poder.
Nas decisões autorizando operações da Polícia Federal contra alguns dos principais aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, mencionou trechos de investigações sobre a execução de medidas que levariam a manutenção do então mandatário no poder.
Nos três últimos despachos dessa natureza, o magistrado aponta que o entorno do ex-mandatário recorreu a “estratégias de subversão da ordem jurídico-constitucional e adoção de medidas extremas que culminaram na decretação de um Golpe de Estado”, a fim de assegurar a permanência de Bolsonaro no cargo.
Desde janeiro, além do vereador do Rio Carlos Bolsonaro, filho 03 do ex-presidente, também foram alvos das ações da PF militares, ex-ministros do governo passado, e até o dirigente do PL Valdemar Costa Neto.
Veja alguns trechos das decisões de Moraes:
Decretação de golpe de Estado”
Na última quinta-feira, a PF cumpriu 30 mandados de busca e apreensão, quatro de prisão preventiva, além de 48 medidas cautelares que incluem a proibição de manter contato com os demais investigados, proibição de se ausentarem do país, com entrega dos passaportes e suspensão do exercício de funções públicas.
Na decisão de Moraes que deferiu a operação, o ministro enumerou os núcleos de atuação do suposto grupo criminoso identificados pelos investigadores para operacionalizar medidas com o intuito de desacreditar o processo eleitoral, planejar e executar o golpe de Estado e abolir o Estado Democrático de Direito.
“A representação contempla vasto relato de complexa e coordenada atuação de organização criminosa, direcionada a propósito que inviabilizaria a manutenção do arranjo político do país, por meio da adoção de medidas que estipulavam estratégias de subversão da ordem jurídico-constitucional e adoção de medidas extremas que culminaram na decretação de um Golpe de Estado, tudo a fim de assegurar a permanência no poder do então Presidente JAIR MESSIAS BOLSONARO”, afirma Moraes.
“Impedir a posse do presidente legitimamente eleito”
Nesse mesmo despacho, o ministro do STF aponta que, segundo a PF, o grupo atuava também para reverberar a ideia de que as eleições presidenciais de 2022 haviam sido fraudadas, estimulando seus seguidores a “resistirem” na frente de quartéis das Forças Armadas. O inquérito mostra que eles tinham o intuito de criar o ambiente propício para o Golpe de Estado, fazendo circular estudos de conteúdo inverídico.
“Paralelamente à tentativa de reversão do resultado das eleições presidenciais, assinala a autoridade policial que uma segunda linha de atuação era adotada pelo grupo investigado, com planejamento e execução de atos tendentes à subversão do Estado Democrático de Direito, por meio de um golpe Militar, a impedir a posse do Presidente legitimamente eleito, assegurando-se a manutenção do então Presidente JAIR MESSIAS BOLSONARO no poder”, diz o magistrado.
“Inteligência paralela”
Também na última operação, Moraes pondera que, em meio planejamento operacional que se direcionava à concretização do golpe, havia ainda um “sistema de inteligência paralela” inclusive para o fim de monitorar diversas autoridades.
As investigações mostram que a esse núcleo era atribuída a responsabilidade de coletar dados e informações que pudessem auxiliar o ex-presidente Bolsonaro na consumação do referido golpe. Um dos alvos do suposto monitoramento do itinerário, deslocamento e localização foi o próprio Alexandre de Moraes.
“Diálogos mantidos entre MARCELO COSTA CAMARA e MAURO CID, durante o mês de dezembro de 2022, indicam sua atuação no monitoramento de várias autoridades, inclusive desse Ministro relator, que serviria, fundamentalmente, a assegurar que ordem de prisão consignada do decreto golpista pudesse ser cumprida, contexto que evidencia as intenções reais da organização criminosa no sentido de consumar a ruptura institucional com decretação de golpe de Estado e cerceamento à independência do Poder Judiciário”, destaca Moraes.
“Instrumentalização” da Abin
Na decisão que determinou a expedição de um mandado de busca e apreensão contra o ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) Alexandre Ramagem, Moraes afirmou que a pasta teria sido utilizada para “fins ilícitos” durante o governo de Jair Bolsonaro.
“A investigação aponta para o fato de que a alta direção da ABIN, exercida por policiais federais cedidos ao órgão durante a gestão do então Diretor-Geral, ALEXANDRE RAMAGEM RODRIGUES, teria instrumentalizado a mais alta agência de inteligência brasileira para fins ilícitos de monitoramento de alvos de interesse político, bem como de autoridades públicas, sem a necessária autorização judicial”, escreveu o ministro.
“Vinculação de autoridades a organização criminosa”
Nessa mesma decisão, Moraes também citou que servidores públicos realizaram diligências utilizando a estrutura da Abin na tentativa de vincular autoridades a organização criminosa.
“A atuação do NÚCLEO-EVENTO PORTARIA 157 caracteriza outra evidência de instrumentalização da ABIN, pois identificou anotações cujo conteúdo remete à tentativa de associação de Deputados Federais – , bem como Ministros do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, à organização criminosa conhecida como PCC (Primeiro Comando da Capital), conforme se verifica nas provas produzidas”, ressaltou o magistrado.
Monitoramento indevido de “inimigos políticos”
No despacho que culminou com a busca e apreensão contra Carlos Bolsonaro, Moraes destacou a necessidade de “aprofundamento do acervo probatório em especial para trazer à lume os destinatários dos produtos enviesados das ações clandestinas que se valiam do sistema FIRST MILE para monitorar sujeitos antagônicos à Organização Criminosa”.
O ministro fez referência a ferramenta utilizada pela Abin e revelada pelo GLOBO, em março de 2023. O FirstMile permitia rastrear os passos de até dez mil proprietários de celulares a cada 12 meses. Para isso, bastava digitar o número de um contato telefônico no programa e acompanhar em um mapa a última localização conhecida do dono do aparelho.
“Nesta representação específica, ressalta a autoridade policial a identificação do NÚCLEO POLÍTICO, (…), que, sob o comando de ALEXANDRE RAMAGEM, monitorou indevidamente “inimigos políticos” e buscou informações acerca da existência de investigações relacionadas aos filhos do então Presidente da República JAIR MESSIAS BOLSONARO”, aponta o ministro do STF.