“Golpe foi consumado por 1h, mas ‘ordem’ não veio”, diz fonte da PF

“Golpe foi consumado por 1h, mas ‘ordem’ não veio”, diz fonte da PF

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Agente que relatou trama golpista à Fórum faz revelações inéditas sobre o 8/1. “Enquanto falava com vocês, das 16h30 às 17h30, militares só esperavam um comando”.

Um ano se passou daquele domingo tenso em que a democracia quase ruiu no Brasil. Um país inteiro, e o mundo, com os olhos no noticiário acompanhando ao vivo um golpe desfechado por uma turba ensandecida de criminosos da extrema direita. A Fórum, em 8 de janeiro de 2023, após denunciar numa série de reportagens a trama engendrada pelo núcleo militar e de arapongagem do governo de Jair Bolsonaro (PL) para derrubar Lula (PT), estava ao vivo nas redes e no YouTube com a fonte da Polícia Federal que havia feito as revelações. Dessa vez, ele estava dentro do Palácio do Planalto em meio ao ataque.

Agora, no primeiro aniversário da tentativa de golpe, a fonte da PF volta a falar com nossa reportagem, trazendo informações inéditas sobre aqueles momentos em que os nervos estavam à flor da pele. O Brasil assistia à barbárie que pretendia implodir um governo constitucional recém-eleito e o agente federal tentava fazer o que estava ao seu alcance dentro da sede do poder Executivo nacional.

“Aquele período eleitoral já demonstrava toda a vontade de realizar um golpe… A trama do golpe não foi feita por uma pessoa só, foi uma rede, era uma cadeia, uma cadeia que foi montada, e a parte central dessa cadeia de comando, por mais que existissem células, em cada local do país, com gente acampada em frente de quartéis, havia uma distribuição centralizada de informação, que é aquilo que eu venho chamando de dissonância cognitiva… Era uma distribuição massiva de informações falsas, criando uma realidade paralela exatamente para que o clima pós-eleição, evidentemente, fosse favorável ao golpismo… E aquilo que nós vimos no 8 de janeiro foi exatamente isso”, começa dizendo o servidor da PF.

“Aquele período eleitoral já demonstrava toda a vontade de realizar um golpe… A trama do golpe não foi feita por uma pessoa só, foi uma rede, era uma cadeia, uma cadeia que foi montada, e a parte central dessa cadeia de comando, por mais que existissem células, em cada local do país, com gente acampada em frente de quartéis, havia uma distribuição centralizada de informação, que é aquilo que eu venho chamando de dissonância cognitiva… Era uma distribuição massiva de informações falsas, criando uma realidade paralela exatamente para que o clima pós-eleição, evidentemente, fosse favorável ao golpismo… E aquilo que nós vimos no 8 de janeiro foi exatamente isso”, começa dizendo o servidor da PF.

Numa afirmação inédita, o policial conta que por pelo menos uma hora o clima dentro do Palácio do Planalto era de que o golpe tinha vingado. Apesar de muita confusão, a inação do BGP (Batalhão da Guarda Presidencial) e a relativa facilidade encontrada pelos criminosos dava a certeza de que tudo corria como o esperado. A surpresa fica por conta, relata ele, do comportamento da tropa que deveria proteger a sede da Presidência da República, que parecia estar de acordo com o levante, embora esperasse uma ordem superior para “liberar geral”.

“Naquele momento em que eu falava com você, enquanto eu estava lá no Planalto, entre 16h30 e 17h30, até a decretação da intervenção federal, o golpe estava consumado lá dentro… As imagens mostram isso, inclusive aquelas imagens usadas pela Fórum, porque os golpistas acreditavam que tinham sido acolhidos pelas Forças Armadas, que lá dentro estavam representadas pelo Batalhão da Guarda Presidencial, e a guarda não fazia nada, era claro que eles esperavam ouvir um comando superior de que estava oficialmente decretada uma GLO, com um pensamento meio ‘ah, agora podemos intervir de fato, porque o comando é nosso’… Era isso, mas só não deu certo porque houve também uma rede do governo para que isso não acontecesse, assim como personagens centrais, como o próprio Dino, a Polícia Federal, enfim”, relembra o PF.

Questionado se de alguma forma se arrependia de ter repassado as informações sobre a trama golpista do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) de Bolsonaro para a Fórum, ainda em dezembro de 2022, o que acendeu todos os alertas no governo que tentava o golpe, que passou então a procurar a “fonte” que vazava o plano, o servidor federal é categórico.

“Eu nunca vou me arrepender de ter apresentado a vocês, passado aí tanto tempo desde a primeira vez que entramos em contato, esses elementos que comprovaram o que estava sendo tramado lá dentro… O que eu contribuí, claro, dentro do que eu podia contribuir, foi no sentido de alertar as pessoas que tinham poder de decisão para o golpe que se avizinhava… Não só alertar, como repassar como isso estava sendo tramado lá dentro, era uma tarefa de juntar as peças para montar algo que mostrasse de fato como aquilo era uma ideia real… E era incrível como o governo eleito à época, o governo de transição, parece que não tinha percebido isso, em meio àquele frenesi do momento, um oba-oba, recebendo tapinha nas costas, como se ter vencido a eleição deixasse tudo… Mas não estava tudo bem”, disse.

Sobre o papel da imprensa na manutenção da democracia, usando uma voz que pode ser poderosa em momentos de instabilidade e convulsão como aquele período de transição, o servidor da PF afirma que sem essa ferramenta dos jornais, revistas, portais e emissoras, não teria sido possível conter o que se desenrolava.

“Eu acho que a Fórum, e esse trabalho profissional de vocês no jornalismo, foi essencial naquele momento… O que vocês fizeram foi pioneiro em relação a isso, e aquelas matérias, o teor dos relatos e a divulgação, elas foram essenciais… É preciso que haja essa valorização, de todos, de vocês e de toda a imprensa”, concluiu.

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