A crítica ao sionismo não implica automaticamente antissemitismo, que é o preconceito ou hostilidade contra judeus como grupo étnico.
A crítica ao sionismo não implica automaticamente antissemitismo, mesmo porque muitos judeus não são sionistas. Ela pode ser direcionada à ideologia ou à política associada ao sionismo, enquanto o antissemitismo é o preconceito ou hostilidade contra judeus como grupo étnico ou religioso.
Nos últimos dias, cresceu a generalização de que qualquer abordagem crítica ao Estado de Israel se trata de antissemitismo, mesmo que de forma criminosa antissemitas estejam usando o massacre impetrado pelo governo do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu na Faixa de Gaza e na Cisjordânia como forma de disseminar o ódio contra os judeus.
O antissemitismo tem raízes profundas e manifestou-se de várias formas ao longo dos séculos, com destaque na Europa e contra o povo judeu. No entanto, considerando a etimologia da palavra, antissemitismo significa aversão aos semitas, cujo termo designa um conjunto linguístico composto por vários povos, entre eles os hebreus e os árabes.
É de se supor que um antissemita, mesmo que destine o foco de seu ódio contra os judeus, tenha aversão aos árabes. Ou que, no mínimo, ao lançar mão de antissemitismo contra os judeus, quer seja sob a justificativa do que o Estado de Israel faz na Faixa de Gaza, por exemplo, esteja segmentando um tipo de ódio nocivo aos judeus em que não há como os árabes escaparem de seus efeitos.
Antissemitismo histórico
Apesar do destino manter judeus e árabes unidos na etimologia da palavra antissemitismo, aos judeus este mal recaiu como ação de Estado em políticas públicas de extermínio, sendo mais notoriamente associado ao Holocausto, durante a Segunda Guerra Mundial, quando milhões de judeus foram sistematicamente perseguidos e exterminados pelos nazistas liderados por Adolf Hitler.
Décadas antes, entre 1881 e 1884, no sul da Rússia Czarista, os pogroms, palavra russa que significa “destruição maciça, destruir violentamente”, promoveram violentos ataques da população não judia contra os judeus sob o silêncio do Império Russo e com o apoio de sua polícia secreta, a Okhrana. O período de terror foi antecedido por uma onda antissemita nos jornais russos.
Portanto, como a história demonstra, é crucial distinguir entre críticas legítimas às políticas de um governo, como as do Estado de Israel, e o antissemitismo. Criticar as políticas de um governo não é, por si só, antissemitismo. No entanto, quando as críticas são baseadas em estereótipos negativos sobre judeus como grupo étnico ou religioso, isso pode ser considerado antissemitismo.
Sionismo
O sionismo, por sua vez, é um movimento político e ideológico que defende o direito à autodeterminação do povo judeu e a criação de um Estado judeu na Terra de Israel. O termo “sionismo” tem origem na palavra “Sião”, que é uma colina em Jerusalém, frequentemente associada à cidade antiga e ao Monte Sião.
O sionismo ganhou destaque no final do século XIX, em resposta ao aumento do antissemitismo na Europa e ao nacionalismo que estava se espalhando naquela época.
Theodor Herzl, um jornalista austríaco-judeu, é muitas vezes considerado o fundador do sionismo moderno. Em seu livro “O Estado Judeu” (Der Judenstaat), publicado em 1896, Herzl argumentou pela criação de um Estado judeu como solução para os problemas enfrentados pelos judeus na Europa.
O movimento sionista teve diferentes correntes ao longo do tempo, incluindo o sionismo político, cultural e religioso. Em 1948, o Estado de Israel foi estabelecido, concretizando em parte a visão sionista.
Por essa razão, o sionismo continua a desempenhar um papel significativo na identidade nacional e na política israelense. Como conceito político, as opiniões sobre ele variam.
Há críticas ao sionismo relativas aos aspectos específicos de sua implementação, especialmente no que diz respeito aos direitos dos palestinos. Dessa maneira, é comum haver grupos antissionistas, o que é diferente do antissemitismo, na medida em que esses grupos se opõem à forma como o Estado de Israel se porta com relação à Palestina, não aos judeus.
Sionismo trabalhista
O sionismo trabalhista ou socialista é a ala de esquerda tradicional da ideologia sionista. Ao contrário da tendência do “sionismo político” fundada por Theodor Herzl e defendida por Chaim Weizmann, eleito presidente de Israel em 16 de fevereiro de 1949 ficando até a sua morte, em 1952.
O sionismo trabalhista não acreditava que o Estado Judaico seria criado simplesmente pelo apelo à comunidade internacional ou a uma nação poderosa como o Reino Unido, a Alemanha ou o Império Otomano.
Em vez disso, os sionistas trabalhistas acreditavam que o Estado Judaico apenas podia ser criado como parte da luta de classes, através dos esforços da classe trabalhadora judaica estabelecendo-se na Palestina e construindo um estado através da criação de kibbutzim no campo e de um proletariado nas cidades.
O sionismo trabalhista cresceu em tamanho e influência solapando o “sionismo político”, ainda nos anos 1930, tanto em nível internacional quanto dentro do Mandato Britânico da Palestina, onde os sionistas trabalhistas dominaram as instituições do Yixuv (assentamentos judeus existentes na Terra Santa antes da criação do Estado de Israel), particularmente a federação sindical conhecida como a Histadrut.
A Haganá (mais tarde a Palmach) – a maior força paramilitar sionista – era uma instituição sionista trabalhista. Desempenhou um papel de liderança na guerra árabe-israelense de 1948 (a guerra de independência de Israel), e os seus antigos membros dominaram o exército israelense durante décadas após a formação do Estado de Israel em 1948.
Alguns dos ideólogos do movimento do sionismo trabalhista foram por exemplo Moses Hess, Nachman Syrkin, Ber Borochov e Aaron David Gordon, tendo o movimento liderado por figuras de amplo conhecimento internacional, como David Ben-Gurion, Golda Meir e Berl Katznelson.
Antissionismo
Algumas críticas ao sionismo político ou ao sionismo trabalhista incluem o impacto nos direitos palestinos. Quem se associa a esse viés crítico muitas vezes se autodenomina antissionista. Isso porque a criação do Estado de Israel resultou na dispersão e deslocamento de comunidades palestinas, gerando refugiados e um longo conflito entre israelenses e palestinos.
No que tange o colonialismo e o nacionalismo, a crítica enxerga o sionismo como um movimento que se assemelha ao colonialismo, argumentando que a colonização europeia influenciou a criação do Estado de Israel. Além disso, algumas análises veem o nacionalismo inerente ao sionismo como um fenômeno que pode levar a conflitos étnicos e agravar as tensões na região.
Críticos alegam que alguns grupos, incluindo os árabes-israelenses, enfrentam desafios significativos em termos de igualdade de direitos e sofrem discriminação, sem que o sionismo consiga ou queira lidar com tais problemas.
Ocorre que nem todos os judeus são sionistas, mostrando aí a variedade de perspectivas dentro da comunidade judaica em relação a essa ideologia. Algumas correntes do judaísmo ortodoxo ou reformista, por exemplo, têm visões distintas sobre o sionismo.
*Renato Santana/GGN