Muita calma nessa hora: pesquisa Quaest mostra Lula com aprovação alta e consolidada

Muita calma nessa hora: pesquisa Quaest mostra Lula com aprovação alta e consolidada

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A queda de seis pontos na aprovação de Lula, apontada pela última pesquisa Quaest, trouxe preocupação aos apoiadores do presidente e animou a oposição de direita.

Os críticos à esquerda do governo, por sua vez, receberam a pesquisa com um sorriso de malícia, por entender que ela comprovaria sua tese sobre a vergonhosa subserviência de Lula às diretrizes do mercado financeiro.

“Haddad vai suicidar o Lula”, disse um amigo, que está convencido que o arcabouço fiscal proposto (e já aprovado no congresso) pelo ministro da fazenda será a ruína política do governo.

Alguns apoiadores mais barulhentos do governo reagiram à pesquisa com críticas dramáticas à comunicação federal, que seria “horrível”.

Humildemente discordo de todas essas posições, e considero que essa pesquisa é, na verdade, extremamente positiva para o governo e para o presidente Lula.

Reitero minha filosofia de que uma pesquisa de opinião deve ser interpretada ao ar livre e à luz do sol. Quer dizer, não se pode olhar para os números de uma pesquisa de maneira isolada, mas relacionando-os a uma série de outros dados. Como os dados econômicos, por exemplo. Uma coisa é enfrentar queda de popularidade quando o país vive um excelente momento econômico, com forte geração de emprego e inflação baixa. Em casos assim, é muito provável que a queda seja antes um ajuste, uma reacomodação, ou normalização da opinião pública. Este parece ser o caso.

Segundo a Quaest, Lula tem hoje 54% de aprovação. É um índice altíssimo, que raros chefes de Estado podem exibir, ainda mais em democracias de massa como a nossa, onde o ambiente é sempre polarizado entre governo e oposição, direita e esquerda, e há intensa e agressiva disputa pelo controle da narrativa.

Lula não se tornou impopular do dia para noite. A pesquisa anterior é que trazia um dado, este sim, fora da curva: Lula havia atingido 60% de aprovação ao final de agosto, resultado de um otimismo talvez um pouco afoito naquele momento.

Esse otimismo hoje caiu bastante, e provavelmente a guerra entre Hamas e Israel, com sua profusão de imagens horríveis de crianças mortas, influenciou essa mudança de humor.

Entretanto, não se nota nenhuma deterioração dramática do quadro econômico, e tampouco a pesquisa traz dados verdadeiramente negativos para o governo.

Por exemplo, o Brasil está vivendo algum pico inflacionário? Não. Há oscilações nos preços de alguns combustíveis, como gasolina e botijão de gás, porém modestas. De agosto a dezembro de 2022, por exemplo, o preço médio nacional de um botijão de gás padrão, de 13 kg, oscilou entre 110 e 111 reais. Hoje, final de outubro de 2023, está em R$ 101,85, segundo dados da Agência Nacional de Petróleo.

A gasolina, por sua vez, subiu em setembro para R$ 5,82 o litro, mas baixou este mês para R$ 5,74, ainda segundo a média nacional da ANP. O diesel enfrentou uma alta expressiva a partir de setembro, mas estabilizou em R$ 6,04 em outubro, contra R$ 7,48 por litro em agosto de 2022.

Um cálculo ainda mais útil, para se medir o peso real desses combustíveis nas finanças do trabalhador, é compará-los ao salário mínimo.

Quantos litros de gasolina se pode adquirir com um salário mínimo?

Quantos botjiões?

Os gráficos abaixo mostram que, desde 2013, houve apenas alguns poucos momentos em que o salário mínimo correspondeu a menos do que 220 litros.

Registrou-se um preço excepcionalmente baixo da gasolina em maio de 2020, no início da pandemia, quando a cotação do petróleo desabou para mínimos históricos, em que um salário mínimo correspondeu a quase 280 litros. Mas quase ninguém podia sair de carro. Lojas e restaurantes estavam fechados. A humanidade lutava contra o vírus usando a estratégia do distanciamento social. Aí não vale.

Vencida a pandemia, houve um período de forte alta nos preços do petróleo, que se estendeu de novembro de 2021 a julho de 2022, em que o poder de compra do salário mínimo, medido em litros de gasolina, chegou a seu pior momento, correspondendo a somente 160 a 180 litros de gasolina. A partir do segundo semestre do ano passado, o preço começou a baixar e o poder de compra do salário, medido em litros de gasolina, começou a subir rapidamente. E se manteve relativamente alto ao longo de 2023.

Quando se olha para o butijão de gás, a energia mais usada domesticamente pelas famílias de baixa renda, houve uma melhora expressiva no poder de compra do salário mínimo a partir do segundo semestre de 2022, o que inclusive deve ter contribuído para que Bolsonaro não desidratasse na campanha eleitoral e tenha registrado um desempenho até mesmo surpreendente.

O custo relativo da gasolina e do botijão continuou caindo no primeiro semestre de 2023, o que, por sua vez, ajudou Lula iniciar o seu governo com sólidos e crescentes indices de popularidade.

Acho provável, portanto, que a perda de seis pontos na aprovação de Lula tenha sido um movimento mais estatístico do que político.

A análise mais detalhada do relatório parece confirmar essa interpretação. Vamos a ela. A aprovação de Lula hoje (54%) é ligeiramente melhor que a de abril (51%) e ligeiramente pior que a de junho (56%).

Os números não apontam nenhuma tendência de piora, visto que a aprovação vinha subindo a passos largos de abril a agosto.

Quando se olha para os dados estratificados por voto no segundo turno, fica mais claro que o quadro não mudou muita coisa. Lula mantém uma forte aprovação entre seu próprio eleitorado, de 89%, que é maior do que tinha nos primeiros meses de governo.

Entre eleitores de Bolsonaro, Lula hoje tem 21% de aprovação, também superior aos 14% a 15% que tinha nos primeiros meses de 2023.

Entre os eleitores que não foram votar ou anularam seu voto, a aprovação de Lula igualmente permanece alta, de 50%, maior que os 43% que tinha em fevereiro, e bem acima dos 40% que o desaprovam.  É com esse nicho do eleitorado que eu acho que o governo deve ficar mais atento, apesar de que também não se pode ver nenhuma tendência de piora. Ao contrário, a aprovação de Lula junto a esses eleitores vinha crescendo a cada pesquisa, até chegar ao pico de 58% em agosto.

Na estratificação por renda, por sua vez, há um dado, porém, que deveria acender a luz amarela do governo, que é o aumento da rejeição a Lula entre eleitores com renda familiar acima de 5 salários. Este setor é bem perigoso, pela capacidade de atuação em redes sociais. Não me surpreenderia se a nova crise no oriente médio tenha surtido algum efeito negativo junto a essas famílias. A direita bolsonarista passou a disseminar muita fake news, tentando vincular Lula e o PT ao Hamas, e dessa vez houve alguma colaboração de setores da mídia tradicional. Isso pode ter causado algum estrago, em especial na classe média.

A Quaest traz ainda um dado que o governo deveria analisar com muita objetividade. Ele mostra que, entre eleitores de Lula, vem aumentando expressivamente a parcela que se informa sobre política pela televisão. Ou ao menos foi o que se viu agora em outubro, talvez em função da guerra. Apenas 8% dos eleitores de Lula se informam através de sites, blogs e portais de notícias, ao passo que 18% dos eleitores de Bolsonaro se informam por estes meios. O governo Lula deveria investir em estratégias para aumentar o percentual de seus eleitores que se informam por sites, e isso passa, naturalmente, por deslocar menos verba de marketing institucional para TV e mais para a internet.

Perguntados sobre o principal problema do Brasil, a maioria ainda responde que é a economia. No grupo que recebe renda familiar até 2 salários, ou seja, as famílias mais vulneráveis, 28% responderam que a economia é o principal problema do Brasil, uma queda de 3 pontos em relação a agosto. Entre quem ganha de 2 a 5 salários, também oscilou para baixo o percentual dos que consideram a economia como principal problema do país. É um indício de que a queda de popularidade em outubro não foi causada pela economia, o que seria mais perigoso para o governo.

A Quaest fez uma série de perguntas sobre as viagens do presidente. E descobriu que setores numerosos do eleitorado, incluindo eleitores de Lula, começam a ficar irritados com o que entendem como tempo exagerado que ele vem dedicando a agendas internacionais. Um terço dos eleitores de Lula disseram que a quantidade de viagens de Lula ao exterior é “excessiva”.

A pesquisa também questinou o que os eleitores pensam do trabalho do ministro da fazenda, Fernando Haddad.

Ele manteve uma aprovação razoável, de 26%, a mesma de agosto, percentual igual porém aos do que o avaliam negativamente.

Conclusão

A aprovação de Lula na pesquisa Quaest está sintonizada com a que vimos em outras pesquisas. Lula mantém apoio de um pouco mais da metade da população. O seu principal adversário, Jair Bolsonaro, foi condenado no TSE há alguns meses e perdeu seus direitos políticos. Não poderá ser candidato em 2026. Esse é um fato que, indiretamente, fortalece o presidente Lula, porque aumenta as chances dele se reeleger, caso queira disputar novamente. Se mantiver aprovação acima de 50%, ou antes, caso não tenha rejeição superior à metade da população, vai entrar no próximo pleito como favorito.

Mas 2026 ainda está longe. Um teste mais próximo serão as eleições municipais. O mundo político acompanhará com atenção o desempenho dos candidatos alinhados a Lula e os de oposição, em especial nas capitais, onde o debate é mais politizado. Caso as previsões de crescimento econômico acima de 3% para este ano se confirmem, e haja uma boa geração de empregos, Lula será um imporante cabo eleitoral para todos aqueles que aspirarem liderar o executivo de seus municípios.

Cafezinho

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