O presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, defendeu, nesta terça-feira (29) que o Fundo Monetário Internacional (FMI) transforme a enorme dívida dos países africanos em obras de infraestrutura, para que, através da geração de riqueza advinda, os países africanos possam crescer e pagar suas obrigações mais tarde. Afirmou também que a expansão do BRICS mudará o equilíbrio de poder no mundo e dará mais influência às economias emergentes. As declarações foram dadas durante o programa “Conversa com o Presidente”, transmitido nas redes sociais. “É verdade que o continente africano é muito pobre. E o problema é que quase todos os países devem muito ao FMI e o valor dos juros que pagam impede-os de investir em qualquer outra coisa”, disse Lula, que destacou os resultados da visita que realizou na semana passada à África do Sul, Angola e São Tomé e Príncipe, e a sua participação na África tanto na Cúpula do BRICS quanto na Comunidade dos Países de Língua Portuguesa. Lula afirmou que, apesar da pobreza, os países da África têm um grande potencial de crescimento, principalmente na agricultura, mas não têm essa oportunidade devido ao enorme endividamento que os sobrecarrega. Afirmou que a dívida dos países africanos ultrapassa os 800 bilhões de dólares, pelo que quase todos os seus rendimentos devem ser utilizados para pagar os juros da dívida. “Por isso propus a ideia de que os países ricos transformem essa dívida (dos africanos) com o FMI em obras de infraestrutura, para que os países africanos possam começar a crescer e depois saldar a sua dívida. Temos que dar-lhes essa oportunidade“, afirmou. Lula disse ainda que o Brasil pode compartilhar com a África as tecnologias agrícolas que lhe permitiram transformar o Cerrado em um dos maiores celeiros do mundo. “A savana africana é muito parecida com o Cerrado e pode se transformar em uma bomba de produção de alimentos não só para a África, mas para o mundo inteiro”. Segundo Lula, “Os BRICS tornaram-se algo mais poderoso, mais forte, mais importante. Acredito que o mundo não será o mesmo depois da expansão dos BRICS, pelo menos nas discussões econômicas globais”, disse o presidente brasileiro, referindo-se à incorporação, ao bloco, da Argentina, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Egito, Etiópia e Irã.
BRICS mais forte permite nova base de negociação, diz Lula
Lula aponta que esta ampliação torna o BRICS um bloco economicamente mais poderoso que o G7, que reúne as sete maiores economias mundiais. “Agora o BRICS é mais forte que o G7. Em 1995, os países do G7 tinham uma participação de 45% no PIB mundial através da paridade de compras e os BRICS de 16%. Agora o BRICS têm 32% e o G7 29%”. De acordo com Lula, esse empoderamento permite que as economias emergentes criem novas bases de negociação nas discussões mundiais e nos organismos multilaterais. Neste sentido, destacou o artigo da declaração final da Cúpula na África do Sul em que o BRICS defende uma reforma do Conselho de Segurança das Nações Unidas e a expansão da organização que atualmente conta apenas com cinco membros permanentes. “Queremos que outros países entrem no Conselho de Segurança para lhe dar representação. A ONU de 1945 já não representa o mundo. Deve ser expandido e há países da América Latina, África e alguns como a Alemanha e a Índia que querem entrar”, disse ele. O presidente brasileiro afirmou que este assunto será um dos que abordará no encontro que terá em setembro próximo com o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, em Nova Iorque. “Insistiremos nisso porque acredito que a ONU perdeu representatividade e que problemas como as alterações climáticas ou a guerra na Ucrânia só podem ser resolvidos com uma governação global forte. A guerra é um problema de falta de comando na ONU, porque só os países do Conselho de Segurança são os que fazem a guerra. Precisamos que outros países controlem”, disse ele. Lula apontou que outra das propostas que apresentou na Cúpula e que foi aceita foi a criação de uma moeda empresarial para que as economias emergentes possam promover o seu comércio sem a necessidade de utilizar o dólar. “Aprovamos um mandato para os ministros das finanças discutirem uma solução este ano para ver se na Cúpula do próximo ano podemos criar uma moeda de referência para as exportações”, disse. Lula esclareceu que a proposta não visa incomodar nenhum país, mas sim favorecer o comércio com países emergentes. “Não é contra o dólar. É a favor do Brasil e do comércio brasileiro”, garantiu.
Íntegra em português da Declaração da Cúpula do BRICS
O autor e tradutor Jair de Souza disponibilizou a íntegra em português da “Declaração de Joanesburgo II”, divulgada no dia 23 de agosto, ao final da Cúpula do BRICS da África do Sul. Um documento histórico que merece ser lido e estudado. Nele, os países do BRICS reafirmam a decisão de juntos contribuírem para a construção de um mundo multipolar, com desenvolvimento compartilhado, respeito à soberania nacional e defesa da paz. No documento, o BRICS, entre outros pontos, conclama a “reestruturação das instituições de Bretton Woods, para possibilitar um papel mais significativo aos países de mercados emergentes e os em desenvolvimento, inclusive em posições de liderança nas instituições de Bretton Woods”; proclama o apoio ao continente africano, reiterando que o princípio de ‘Soluções africanas para os problemas africanos’ “deve continuar a servir de base para a resolução de conflitos”; reafirma a determinação dos países do BRICS de trabalhar “em conjunto para lidar com os riscos e desafios para a economia mundial na consecução da recuperação global e do desenvolvimento sustentável”; compromete-se a “reforçar a cooperação intra-BRICS para intensificar a Parceria do BRICS na Nova Revolução Industrial (PartNIR) e criar novas oportunidades para acelerar o desenvolvimento industrial”; anuncia a intenção de “aumentar a resiliência dos sistemas energéticos, incluindo infraestruturas energéticas críticas, a promover a utilização de opções de energia limpa, a promover a investigação e a inovação em ciência e tecnologia energéticas”; exige a reforma da governança global, anuncia a preparação para que o comércio entre os países do BRICS ocorra sem depender do dólar e aprova a histórica expansão do bloco, “decidimos convidar a República Argentina, a República Árabe do Egito, a República Federal Democrática da Etiópia, a República Islâmica do Irã, o Reino da Arábia Saudita e os Emirados Árabes Unidos a tornarem-se membros de pleno direito do BRICS a partir de 1 de janeiro de 2024”; entre tantos outros pontos fundamentais que um breve resumo como este é incapaz de expressar em sua dimensão e importância. Clique aqui e leia a íntegra do documento.
* Vermelho