Deltan calunia ministro, ataca Lira e finge haver uma saída. Quer o quê?

Deltan calunia ministro, ataca Lira e finge haver uma saída. Quer o quê?

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Reinaldo Azevedo*

Deltan Dallagnol (Podemos-PR), deputado cassado pelo TSE — falta apenas que a Mesa da Câmara declare a perda do mandato —, concedeu mais uma entrevista, desta feita ao Globo. Na terça, foi a vez da Folha. Continua a investir na sua carreira de mártir. Algum pensador apaixonado pelas próprias visões deve lhe ter soprado aos ouvidos que é chegada a hora de iniciar o levante contra o governo Lula, ainda que incipiente, arrancando a bandeira de oposição das mãos dos bolsonaristas. Não seria, por ora, em seu próprio benefício porque ele ficará inelegível por oito anos. Mas pode ser, assim, o profeta da causa.

Só isso explica — ou, então, alguma tendência ao suicídio político, e não parece ser o caso — as duas entrevistas destrambelhadas. Na primeira, acusou o ministro Benedito Gonçalves, do TSE — membro do STJ — de ter entregado a sua cabeça a Lula em troca de uma vaga no Supremo. E os outros seis votos, já que foi cassado por unanimidade? Engrolou uma desculpa qualquer, mas a tese central é que o tal “sistema” está se vingando de gente honrada como ele. Conta que Gonçalves vai processá-lo. Ainda não sei a que diploma legal vai recorrer. Quando menos, estamos diante de um caso explícito de dano moral, conforme Artigo 186 da Código Civil. Só isso? Acho que não.

Transcrevo a acusação:
“Isso fez com que o ministro condutor do voto [Benedito Gonçalves] trouxesse um voto que objetiva entregar a minha cabeça em troca da perspectiva de fortalecer a sua candidatura para uma vaga no STF”.

O ex-procurador e quase cassado está acusando Gonçalves de vender seu voto, o que seria crime análogo à venda de sentença, ainda que a paga não viesse na forma de dinheiro, mas de um cargo. Assim, Deltan acusa o ministro de corrupção passiva. E configurada está a calúnia porque é claro que se ele não tem prova. Sérgio Moro, seu parceirão, resolveu acusar Gilmar Mendes, num vídeo que ele diz ser só uma brincadeira, de vender habeas corpus. A PGR pediu abertura de inquérito. Justamente por calúnia.

Ao Globo, ele reclama de Arthur Lira (PP-AL), que não estaria lhe dando bola. E faz digressão, claro!, sobre ações da Lava Jato contra o deputado e contra o seu pai. Com que propósito? Não sendo uma estratégia (mas qual?), poderia ser burrice. Ou o tal instinto politicamente suicida. Ele acha que pode sensibilizar deputados colocando no alvo o presidente da Câmara?

E continua a fazer juízos realmente muito singulares sobre a lei, o que era prática corriqueira nos tempos de estrela da força-tarefa. Dizia barbaridades, e seus porta-vozes na imprensa as repetiam em jornais e sites noticiosos. Desta feita, ele se saiu com esta sobre o rito de sua cassação:
“De todo modo, essa questão [cassação] vai ser apreciada, a partir da entrega da minha defesa, pela Mesa da Câmara, que é composta por sete deputados e que vão ponderar se vão dar ou não uma ampla defesa nos termos que a Constituição prevê. A Constituição não prevê uma simples execução da decisão judicial (do TSE). Há possibilidade de reapreciar o contexto daquela decisão.”

Hein?

O quê?

“Reapreciar o contexto daquela decisão?”

Qual?

Está sugerindo que a Câmara poderia rever a decisão do TSE e tornar sem efeito a cassação decidida pelo tribunal? Ele sabe que isso é impossível. Em caso de perda do mandato decidida pela Justiça Eleitoral, define o Parágrafo 3º do Artigo 55:
“§ 3º Nos casos previstos nos incisos III a V [cassação pelo TSE], a perda será declarada pela Mesa da Casa respectiva, de ofício ou mediante provocação de qualquer de seus membros, ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa.”

Observem que não há nem mesmo uma dúvida razoável sobre a possibilidade de a Câmara ser corte revisora do TSE. O único que poderia mudar a escrita é o STF. O quase-cassado já andou circulando por lá e constatou ser isso impossível.

ENTÃO O QUÊ?
Tudo indica que, não sendo a simples disposição de dar tiro no pé, o ex-procurador está preparando o terreno para ser o pregador de uma nova verdade revelada na política. Parece um esforço para recriar o bolsonarismo, mas sem Bolsonaro.

E, para tanto, é preciso se comportar como um detrator dos Poderes e das instituições. Entre os culpados por sua cassação estariam o próprio Lula, os ministro do TSE e outros do Supremo. E, a partir da entrevista, também Arthur Lira.

“Lupus pilum mutat, non mentem”. Entre nós, a tradução chegou ainda melhor do que o original: “O lobo muda de pelo, mas não de vício”.

Deltan não me parece especialmente brilhante, mas não é burro o bastante para acreditar que possa haver reversão da cassação. Assim, resta saber qual é a piada. Na hipótese de que já não se saiba.

 

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