“Não é possível que um agente público vá à tribuna, coloque uma peruca, faça um discurso daquele tipo e nada aconteça”, afirma Jandira Feghali.
As bancadas de Psol, PDT, Rede e PSB anunciaram uma representação ao Conselho de Ética da Câmara contra o deputado Nikolas Ferreira (PL-MG). Partidos denunciam o parlamentar de transfobia, após o discurso que causou indignação generalizada ontem (8), Dia Internacional da Mulher. O PT e o PCdoB também representarão, mas ainda avaliam com as demais legendas se uma ação conjunta é o mais adequado. O objetivo final é a cassação de Nikolas Ferreira. “As mulheres estão perdendo seu espaço para homens que se sentem mulheres”, disse o deputado, entre outras agressões.
Além dos partidos, o Ministério Público Federal (MPF) protocolou pedido à Mesa Diretora da Câmara de apuração da conduta do bolsonarista. A transfobia equivale ao crime de racismo desde 2019, após decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). “Se a legitimidade para o requerimento é outorgada a qualquer cidadão, com mais razão, pode o Ministério Público, no exercício das funções de procurador dos direitos do cidadão (art. 12, LC 75/93), adotar tal medida”, escreveu a procuradora Luciana Loureiro, do Distrito Federal.
Por colocar uma peruca e ridicularizar mulheres e transgêneros, e por tabela a própria tribuna do parlamento, Nikolas Ferreira pode ser acusado de crime (passível de prisão) e ainda justificar pedido de cassação de seu mandato. Mas a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) disse à RBA que as duas possibilidades têm competências diferentes e são processualmente muito distintas.
Conselho de Ética
“Estamos entrando com representação no Conselho de Ética, e além disso há a ideia de entrar no STF, onde o crime de transfobia foi equiparado ao de racismo. São duas instâncias e duas coisas diferentes. Uma coisa é considerar crime a atitude de transfobia. É uma questão da Justiça brasileira, e aqui não estamos falando de cassação de mandato, mas de crime. Já a cassação de mandato é uma questão da Câmara. Nesse caso, o Conselho de Ética tem que ser o primeiro a opinar.”
Na legislatura passada, até meados do ano, o Conselho de Ética recebeu 55 representações contra 26 deputados. Dessas, 10 foram contra Eduardo Bolsonaro (PL-SP), o filho 03 do ex-presidente. “Se vai ser cassação, suspensão ou outra punição, é uma discussão que o conselho tem que fazer”, afirma Jandira. No momento, é preciso esperar qual vai ser a composição do conselho, que nem composto está ainda.
“Quando for instalado, vamos ver a tendência, mas vamos pressionar. Não é possível que um agente público vá à tribuna de um poder democrático, coloque uma peruca, faça um discurso daquele tipo e nada aconteça.”
É muito raro os deputados cassarem um colega. Nem mesmo Daniel Silveira, aliado de Bolsonaro, hoje preso, perdeu o mandato.
Lira: “Não admitirei”
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), divulgou nota ainda ontem. “O Plenário da Câmara dos Deputados não é palco para exibicionismo e muito menos discursos preconceituosos. Não admitirei o desrespeito contra ninguém. O deputado Nikolas Ferreira merece minha reprimenda pública por sua atitude no dia de hoje”, escreveu Lira, recado entendido por muitos como risco de cassação iminente.
Entretanto, como observa a deputada fluminense, o responsável por decidir o destino do deputado não é o presidente da Casa, mas o conselho. Por isso, é preciso aguardar. “A atitude de Lira foi de publicamente não concordar com a atitude, mas quem decide é o Conselho de Ética”, diz Jandira.
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Para a deputada federal Maria do Rosário (PT-RS), que estava na presidência da Câmara em exercício no momento da agressão acintosa do bolsonarista, “o deputado agiu de forma desqualificada”.
“Ele não respeita o Brasil, agiu contra a Constituição. A tribuna não é lugar de brincadeira e de desrespeito. Creio que a Câmara dos Deputados deve tomar providências imediatas”, afirma a petista.
Entidades vão ao STF
A Associação Brasileira de Famílias Homotransafetivas (ABRAFH) e a Aliança Nacional LGBTI+ já acionaram o STF. Mas devem pipocar muitas outras ações. Já no caso da cassação, devido ao corporativismo e uma espécie de instinto de autoproteção parlamentar, teme-se que Nikolas Ferreira escape, como foi o caso de tantos outros no passado. O exemplo de Eduardo Bolsonaro é o mais recente.
*Com RBA