Jamil Chade – resultado final do governo de Jair Bolsonaro foi um fracasso na luta contra a corrupção. Durante o mandato do líder da extrema direita, o Brasil se manteve estagnado numa posição ruim no Índice de Percepção da Corrupção (IPC) e seu governo promoveu um “retrocesso sem precedentes” nas instituições.
Trata-se do principal índice no mundo sobre o tema, elaborado pela Transparência Internacional. Para a entidade, o Brasil “teve uma década perdida” no combate à corrupção, caindo cinco pontos e 25 posições no ranking desde 2012.
Em uma escala de 0 a 100, o país alcançou apenas 38 pontos ao final de 2022, mesma nota obtida nas duas edições anteriores do índice.
Apesar da nota inalterada, o país passou da 96ª para a 94ª colocação, entre os 180 países e territórios avaliados. Segundo a entidade, porém, isso não ocorreu pela melhoria da situação do país, e sim pela piora da nota de outros governos.
O Brasil ficou empatado com Argentina, Etiópia, Marrocos e Tanzânia.
Acuado desde antes da posse pela corrupção fartamente comprovada da sua família, a prioridade de Bolsonaro durante todo o seu governo foi garantir sua blindagem, que buscou através da neutralização do aparato institucional e legal que o ameaçava.
“O impacto disso foi muito maior do que a impunidade nos casos de corrupção e lavagem de dinheiro da família. Durante quatro anos, Bolsonaro desmontou o sistema de freios e contrapesos da democracia brasileira, atacando os três pilares de responsabilização que o sustentam: jurídico, político e social”, conclui.
Foi uma destruição institucional muito grave e de difícil reversão.” Orçamento Secreto.
Orçamento Secreto
Entre os aspectos examinados está o “Orçamento Secreto”, considerado pela entidade como o “maior esquema de institucionalização da corrupção que se tem registro no Brasil”, e seus impactos sobre a qualidade de políticas públicas essenciais. Também são mencionadas:
- a pulverização da corrupção nos municípios;
- e, ainda mais grave, a distorção do processo eleitoral, resultando no fortalecimento dos partidos mais fisiológicos e lideranças mais corruptas da política brasileira.
Num comunicado de imprensa, a entidade destaca que o Orçamento Secreto foi identificado como “a principal moeda de compra da blindagem política de Bolsonaro no Congresso, garantida pelo Centrão”.
Maior beneficiário dos recursos secretos, o presidente da Câmara Arthur Lira manteve mais de 140 pedidos de impeachment paralisados e se reelegeu deputado federal, com o dobro de votos que teve na eleição anterior.”Transparência Internacional.
Omissão da PGR para blindar Bolsonaro
Outra peça-chave para a blindagem de Bolsonaro e seus aliados, descrita pelo relatório, foi a “neutralização da Procuradoria-Geral da República”.
“As omissões da PGR em 2022 tiveram graves consequências para a impunidade das condutas criminosas apuradas pela CPI da Pandemia, o desmanche continuado da governança ambiental e de proteção aos direitos indígenas, o avanço desimpedido de movimentos golpistas e ataques às instituições democráticas, além de retaliações a membros do próprio Ministério Público atuantes em casos de corrupção”, destacou.
O vácuo constitucional da PGR foi “preenchido pela exacerbação do papel do STF e do TSE”, segundo o relatório.
“Sem poder contar com a PGR para pedir a instauração de processos ou medidas cautelares nas duas cortes, ministros passaram a agir de ofício e homologar coletivamente heterodoxias frente às graves ameaças e ataques às instituições e à ordem democrática”, disse.
Se esta foi a estratégia possível de sobrevivência das instituições, o relatório da Transparência Internacional – Brasil também alerta que a violação continuada de garantias processuais e direitos individuais trazem consequências perigosas para o Estado de direito e minam, progressivamente, a reserva de autoridade da Justiça.”
Retrocesso sem precedentes
Outro aspecto do informe é a relação entre os temas corrupção, conflito e segurança. De acordo com a entidade, a corrupção diminui a capacidade do Estado de garantir paz e segurança a seus cidadãos, incluindo o combate ao terrorismo.
“O Brasil é um dos principais exemplos hoje no mundo de deterioração democrática e aumento de conflitos associados à corrupção”, afirma a Transparência Internacional.
Eleito sequestrando o discurso anticorrupção, o ex-presidente Bolsonaro promoveu retrocessos e um desmanche institucional sem precedentes, disseminou notícias falsas e discurso de ódio, enalteceu um projeto autoritário e fomentou a violência política, que teve seu ápice no último 8 de janeiro.” Nicole Verilllo, gerente de Apoio e Incidência Anticorrupção
Década perdida
Na avaliação da Transparência Internacional, o Brasil perdeu uma década no combate à corrupção. Desde 2012, o país perdeu 5 pontos e caiu 25 posições no ranking, caindo da 69ª para a 94ª colocação.
“O resultado reflete o desmanche acelerado dos marcos legais e institucionais anticorrupção que o país havia levado décadas para construir”, disse.
Junto com o retrocesso na capacidade de enfrentamento da corrupção, o Brasil sofreu degradação sem precedentes de seu regime democrático.”
No índice que mede o combate à corrupção, o Brasil está abaixo da média global (de 43 pontos), da média dos BRICS (39 pontos), da média regional para a América Latina e o Caribe (43 pontos) e ainda mais distante da média dos países do G20 (53 pontos) e da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, a OCDE (66 pontos).
O ranking é liderado por:
- Dinamarca – 90 pontos
- Finlândia e Nova Zelândia – 87
- Noruega – 84 Singapura e Suécia – 83
No final da fila estão:
- Somália – 12 pontos
- Síria e Sudão do Sul – 13
- Venezuela – 14
Propostas contra a corrupção
Na esperança de voltar a lutar contra a corrupção, a Transparência Internacional – Brasil sugere um pacote de 25 medidas.
Entre elas estão:
- regulamentação do lobby;
- a instituição da lista tríplice vinculante para a nomeação do procurador-geral da República;
- estabelecimento de quarentena para a candidatura eleitoral de membros do Judiciário, Ministério Público, Forças Armadas e polícias; proteção dos denunciantes;
- recuperação do sistema de proteção ambiental e fortalecimento do combate à corrupção ambiental.
“É fundamental que o novo governo demonstre, com ações concretas, que está compromissado com o resgate democrático das pautas de transparência e integridade”, defendeu a entidade.
*Uol