“O Brasil não vai se acabar dia primeiro”, disse, com fisionomia abatida, tentando consolar os seguidores.
Por cerca de 50 minutos de um discurso no final regado a lágrimas, com reclamações contra a imprensa, a “ideologia” da esquerda, o MST, o TSE, entre outros, e com muitas mentiras e mesmo ameaças, o presidente Jair Bolsonaro finalmente se despediu do Palácio do Planalto nesta sexta-feira (30), na última de suas lives. Depois de quase dois meses da vitória do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, o ainda governante, pela primeira vez, admitiu a derrota eleitoral. “O Brasil não vai se acabar dia primeiro”, disse, tentando consolar os seguidores.
Em alguns trechos do discurso Bolsonaro foi incongruente e errático. “Vencemos esses quatro anos com saldo bastante positivo. Nenhum chefe de Estado enfrentou algo parecido. Se bem que isso foi enfrentado pelo mundo todo, a questão da pandemia e a guerra, isso influencia na vida de todo mundo”, discorreu.
Acrescentou que as mortes provocadas pela covid-19 são “irrecuperáveis”. Mas, nesse contexto, aproveitou para falar contra o que chama de “falta de liberdade” que, segundo ele, persegue os “democratas” como ele. Reclamou que “a falta de liberdade que estamos vivendo prejudica a democracia”. “Isso daí, no futuro, se continuar, vai pegar todo mundo. Nós sempre lutamos por democracia. Por liberdade, respeito às leis, à Constituição. Infelizmente alguns não entendem (e) aplaudem quando alguém perde a liberdade”, disse, sobre apoiadores presos por atacarem o Estado de Direito.
Covid, urnas eletrônicas e armas
Seguiu então na associação entre pandemia de covid-19 e “falta de liberdade”. “Vejo uma nação com medo de mandar um zap, tecer um comentário, mandar um emoji”, protestou. “Cê não podia falar sobre covid, tudo era não-existe-comprovação-científica. Até os médicos foram tolhidas (sic)…”
Com óbvio medo de punição, aproveitou a referência para se defender da acusação da Polícia Federal, divulgada ontem, que concluiu relatório no qual o acusa de cometer incitação ao crime ao relacionar vacina contra covid ao HIV. “Hoje em dia, se falar de vacina, de um estudo de fora do Brasil, você corre o risco de responder um processo. Li um trecho da revista Exame que falava de covid e HIV, li duas linhas, e tô sendo processado, tratado como um criminoso. A revista que mostrou isso daí”.
Também reclamou que “hoje em dia falar em urna você também tem problema sério”. “Tem que lutar contra isso”. Entre as mentiras ideológicas dirigidas a seus eleitores fanáticos, citou o “porte de arma para o homem do campo” como um dos feitos de seu governo. “Levamos a paz para o campo. A questão das armas é uma segurança pra pessoa.”
Comentou o que considera ameaça que o novo governo representa para a liberdade de andar armado. Disse que com revogação de decretos de armas “vai voltar a violência no Brasil”. “Armas de fogo é garantia de paz. Quem quer paz se prepara pra guerra”, sentenciou, em tom de ameaça.
No entanto, o chefe de governo tentou se desvincular de seguidores violentos. Mencionou o assassinato do petista Marcelo Arruda e a tentativa de terrorismo em Brasília dizendo que nada justifica a “tragédia de Foz (do Iguaçu), uma pessoa matar a outra, como nada justifica aqui em Brasília essa tentativa de um ato terrorista”.
Tentando consolar
Aos fanáticos ainda acampados às portas dos quartéis, disse que “temos que respeitar nossas leis, nossa Constituição”, mas como é seu hábito, usou de ambiguidade. “Sim, vamos respeitar. Mas é dever nosso reagir.” Segundo ele, qualquer manifestação, desde que comunicado às autoridades, “é bem-vinda”. “Sei o que passaram nesses dois meses, sol, chuva… não vai ficar perdido.”
Sobre o finalmente reconhecido fim de seu governo, declarou: “Perde-se (sic) batalhas mas não vamos perder a guerra. Muito obrigado a todos vocês por terem proporcionado esses quatro anos à frente da presidência da República. Um bom 2023, Deus abençoe o nosso Brasil”, disse, no seu último pronunciamento como presidente.
Novos comandantes militares
O Diário Oficial da União (DOU) publicou nesta sexta-feira (30), último dia útil de 2022, as nomeações dos novos comandantes da Marinha e da Aeronáutica indicados pelo presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, que toma posse no próximo domingo (1°). Os documentos são assinados pelo ainda chefe de governo Bolsonaro.
Na Marinha, o almirante de Esquadra Marcos Sampaio Olsen assume o comando, no posto de Almir Garnier Santos, a partir deste sábado (31). Olsen ficará no comando da Marinha interinamente e será nomeado definitivamente por Lula após sua posse.
Na Aeronáutica, foi exonerado Carlos de Almeida Baptista Junior e nomeado o tenente-brigadeiro Marcelo Kanitz Damasceno, que chefiará a Força a partir de 2 de janeiro de 2023.
Sem condições de reagir ao andamento da transição, e sem qualquer possibilidade de conseguir apoio a um golpe, Bolsonaro já havia assinado a nomeação do comandante do Exército, responsável pela força a partir de hoje.
*Com Brasil de Fato