Péssima repercussão de manifestação de Lindôra Araújo dominou as rodas de conversa e os grupos de WhatsApp dos integrantes do MPF.
Segundo Malu Gaspar, O Globo, Braço-direito de Augusto Aras, a subprocuradora-geral da República, Lindôra Araújo, deixou chocados integrantes da Procuradoria-Geral da República (PGR) com a sua fala no julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) em que saiu em defesa do Congresso, minimizou a gravidade do orçamento secreto e desdenhou reportagens jornalísticas que revelaram desvios no uso do dinheiro público.
— O Supremo neste momento não é um palco político. Ele não deveria, como foram feitos durante as sustentações, receber apenas uma crítica ao Congresso Nacional, que fez isso. Os políticos estão lá pelo voto popular, que também deve ser respeitado, disse Lindôra em recado aos ministros da Corte.
— A ADPF (tipo de ação apresentada por quatro partidos contra o mecanismo pouco transparente de distribuição de verbas milionárias) foi para colocar transparência que não foi feita do Orçamento Secreto, mas não como palco para dizer que a pobreza é evidente. Isso aí temos há séculos.
A manifestação de cinco minutos deixou perplexos integrantes da PGR ou que ocuparam postos-chave em administrações passadas.
Após o fim da sessão plenária do STF, a péssima repercussão da fala de Lindôra dominou as rodas de conversa e os grupos de WhatsApp dos integrantes do MPF.
Em um deles, um procurador resumiu a postura de Lindôra da seguinte maneira: “Manifestação de improviso e mal elaborada, sem fundamento jurídico, com considerações vagas e genéricas”.
“Foi de se espantar mesmo: uma fala sem fundamentação jurídica”, disse à equipe da coluna um subprocurador-geral da República ouvido reservadamente.
Um segundo integrante do Ministério Público Federal (MPF) ficou particularmente incomodado com a tentativa de Lindôra Araújo de negar a gravidade dos desvios de recursos do esquema do orçamento secreto no Estado do Maranhão, que foram trazidos à tona em reportagens publicadas pela revista piauí.
Um dos casos abordados pela reportagem mostra que o município de Afonso Cunha, a 370 km de São Luís, introduziu informações falsas no sistema do SUS para conseguir mais dinheiro via orçamento secreto. Como, por exemplo, a de que teriam sido realizadas 30 mil ultrassonografias de próstata entre 2020 e 2021 – número que é quatro vezes maior que o total da população da localidade.
“Não pode uma mídia determinar… Não se sabe se o Maranhão errou de fato. Pode não ter errado. Foi falado que a mídia publicou ‘está errado’, não sabemos. Foi apenas dito”, minimizou a aliada de Aras, desconsiderando a atuação do próprio MPF.
Não só no Maranhão, mas também no Rio Grande do Norte, o próprio MPF investigou casos de desvios de verbas das emendas, o que já resultou na abertura de inquéritos e bloqueio de recursos.
Em outubro deste ano, a pedido do MPF, a Justiça Federal maranhense determinou o bloqueio de R$ 78 milhões das contas dos fundos de saúde de 20 municípios do estado.
Os procuradores investigam o esquema que envolve a utilização de dados fraudulentos no Sistema Único de Saúde (SUS) o limite para o recebimento de emendas parlamentares.
“Ou seja, há trabalho do próprio MPF, que é de conhecimento geral. Lindôra menosprezou o trabalho dos nossos colegas. Foi irresponsável”, disse um subprocurador.
Um terceiro integrante do MPF ouvido pela equipe da coluna considera que Aras e Lindôra são “uma dupla que está na contramão do avanço civilizatório da nossa democracia”.
“A regra de uma República, a sua base de formação, é a transparência, principalmente daquilo que eu mais importante para a vida em comum, o orçamento”, defende esse terceiro integrante, que já atuou na cúpula da PGR.
Também chamou a atenção, tanto dentro do MPF quanto no Supremo, a ausência do procurador-geral da República, Augusto Aras, no julgamento.
Procurada pela equipe da coluna na noite desta quarta-feira, a PGR não esclareceu o motivo da ausência de Aras, nem o que ele fazia no horário do julgamento, nem respondeu se Lindôra queria se defender das críticas.