Bolsonaro tenta intimidar o país

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Nos últimos dias, Bolsonaro renovou ameaças e provocações. Impede as Forças Armadas de divulgar relatório e convoca seguidores a cercar seções.

É vergonhoso para as Forças Armadas a não divulgação do relatório da fiscalização da votação, pelo qual tanto se empenharam. Desta forma, elas perdem a credibilidade. Por outro lado, o presidente Jair Bolsonaro convoca seus seguidores a permanecerem nas seções eleitorais após votar. Isso é intimidação do eleitor e pode caracterizar cerceamento do voto. Isso tudo numa semana em que o presidente, o vice-presidente e o líder do governo na Câmara ameaçam interferência no Supremo, com aumento do número de ministros, após as eleições.

As ameaças institucionais continuam diariamente. O filho do presidente, Flávio, e coordenador da campanha, disse ao GLOBO: “Vocês estão vendo o presidente muito mais calmo, a cada dia mais preparado, com a inteligência emocional cada vez melhor.” Evidentemente, ninguém está vendo isso. A campanha quer passar a ideia para afastar os temores que o candidato propaga.

A reportagem da Malu Gaspar, Rafael Moraes Moura e Alice Cravo publicada neste jornal é claríssima. Num esforço dos jornalistas, eles conseguiram ouvir de três generais, dois deles do Alto Comando, que o relatório está pronto e não mostra qualquer problema com as urnas eletrônicas. Mas o presidente da República determinou que não fosse divulgado. O TCU está em cima, felizmente. É vergonhoso, e essa palavra ouvi de alta autoridade brasileira, que as Forças Armadas se deixem usar dessa maneira para atender aos propósitos eleitorais de um candidato. Sim, candidato. Bolsonaro é comandante em chefe das Forças Armadas apenas para as questões do Estado brasileiro. Como um dos que disputam o próximo mandato, não tem essa autoridade. Elas ficarem submissas e subservientes a ele só aumentou o nível da vergonha e a dimensão da perda de credibilidade.

A ameaça de mudar o número de ministros do Supremo foi feita pelo presidente em entrevista à “Veja”, depois repetida por ele em falas sequenciais. O vice-presidente Hamilton Mourão respaldou a ameaça, em entrevista a Julia Duailibi e Tiago Eltz, da Globonews, acrescentando outros detalhes a serem alterados no STF como o mandato dos ministros e as decisões monocráticas. O líder do governo na Câmara, Ricardo Barros, explicou em entrevista a Andréia Sadi, no Estudio i, que era necessário “enquadrar” o Supremo. Pois, apesar dessas abundantes declarações, Bolsonaro, durante campanha em Pelotas, disse para os jornalistas “vocês inventaram isso. Eu falei que isso não estava no plano do governo e botaram na minha conta”. Antes que alguém afirme que ele “recuou” da proposta, quero repetir: Bolsonaro mentiu quando disse que a imprensa inventou. Ele afirmou, repetiu e seu entorno também disse. Mas, seu aliado Arthur Lira alertou: “Não é o momento adequado”. É preciso não se deixar enganar. O plano é esse, e apenas Lira avisa que não é a hora certa de falar isso, antes das eleições de segundo turno. Porém, foi o presidente que iniciou essa conversa.

O professor de Direito da FGV Oscar Vilhena, em esclarecedor artigo ontem na “Folha de S.Paulo”, historiou o assunto. Foi defendida por Hitler em 1930 na escalada nazista. Foi praticada no Brasil pelas ditaduras de Getúlio e dos militares. Foi aplicada por Hugo Chávez. “O general Mourão, que serviu como adido militar brasileiro na Venezuela, certamente conhece o desfecho dessa história”, escreveu o articulista. Foi adotada também por Viktor Orbán, na Hungria, por Recep Erdogan, na Turquia, que, em seguida, determinou a prisão de 2.745 juízes turcos. Esse é o caminho de se destruir a democracia. E foi o que Bolsonaro disse que deixou para depois das eleições.

Enquanto isso, e com efeito imediato, o presidente convoca seus seguidores a ameaçarem as seções eleitorais. “No próximo dia 30, vamos votar, e mais do que isso, vamos permanecer na região da seção eleitoral até a apuração do resultado”, afirmou Bolsonaro e mais uma vez disse que desconfia do resultado das urnas. Os partidos precisam fazer uma representação contra isso, o mais rápido possível. Isso é uma forma de intimidação e pode resultar num cerceamento do direito de voto.

Bolsonaro nunca moderou-se, nunca recuou de seu projeto. Ele quer tumultuar o país se não for reeleito. E se o for, ele seguirá com o seu plano de desmanche das instituições. Como tenho dito aqui, não ver esse risco é o maior dos riscos.

*Miriam Leitão/O Globo

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