No debate de ontem, dia 29, vejo na tela da TV Globo uma figura que se diz padre.
Ao vê-lo e ouvi-lo lembrei-me de Enric Marco.
Marco tornou-se conhecido na Espanha por lutar contra a ditadura de Franco, ter sido deportado e ir para num campo de concentração nazista.
Na militância antinazista, chegou a presidir a Amical de Mauthausen, associação de vítimas do Holocausto.
Por sua história, depois desmascarada, comparecia a eventos e atos políticos, onde dava depoimentos contra o franquismo e o nazismo, até que dias antes da cerimônia dos 60 anos do fim da Segunda Guerra, o historiador Benito Bermejo revelou que Marco nunca tinha sido preso em campo de concentração.
Javier Cercas recolhe essa história e escreve O Impostor, romance não ficcional.
Enric Marco vestiu-se de uma identidade e de uma memória que não lhe pertenciam.
Isso fez com que passasse a ser considerado o maior impostor do mundo.
Enric Marco construiu e incorporou um personagem para denunciar o franquismo e o nazismo.
Já “Padre” Kelmon é o oposto. Usa a impostura – uma indumentária — para defender o fascismo.
Se Marco é considerado o maior impostor do mundo, será que Padre Kelmon é o maior impostor do Brasil?
Certeza tenho: a impostura do Padre Kelmon é mais criminosa que a de Marco.
*Dr. Rosinha é médico pediatra, militante do PT. Pelo PT do Paraná, foi deputado estadual (1991-1998) e federal (1999-2017). De maio de 2017 a dezembro de 2019, presidiu o PT-PR. De 2015 a 2017, ocupou o cargo de Alto Representante Geral do Mercosul.
PS 1 do Viomundo: Padre Kelmon era o vice de Roberto Jefferson (PTB) na disputa à Presidência da República. Porém, no início de sete
mbro, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) barrou a candidatura de Jefferson, que se encontra em prisão domiciliar.
Padre Kelmon foi, então, catapultado à titular da chapa do PTB.
Kelmon Luis da Silva Souza (é o seu nome completo) se apresenta como sacerdote da Igreja Ortodoxa no Brasil.
Nas peças de campanha do PTB, ele aparece em peças de campanha com vestimentas tradicionais da igreja.
O primeiro debate presidencial do qual participou foi no SBT, em 24 de setembro.
Antes disso, em 14 de setembro, a Igreja Sirian Ortodoxa de Antioquia do Brasil, por meio de seu arcebispo, Dom Tito Paulo George Hanna, divulgou uma nota a respeito do candidato à Presidência da República, Padre Kelmon Luís da Silva Souza.
“Chegou ao nosso conhecimento que muitos cidadãos têm questionado membros da nossa igreja a respeito de um candidato à Presidência da República pelo PTB que se auto apresenta como Padre Kelmon, utilizando insígnias de nossa tradição, sobre a veracidade de seu vínculo à nossa Igreja”, diz o documento.
“Diante disso, esclarecemos que, em pleno respeito, mas também gozando da mesma liberdade de pensamento, consciência e religião prevista no 18º artigo da Declaração dos Direitos Humanos e no artigo 5º da Constituição Federal do Brasil, o referido candidato não é membro de nossa Igreja Sirian Ortodoxa de Antioquia do Brasil em nenhuma de suas paróquias, comunidades, missões ou obras sociais”, revela a nota.
Segundo a nota Igreja Sirian Ortodoxa de Antioquia do Brasil, o “padre” nunca foi seminarista ou membro do clero da Igreja em nenhum dos três graus da ordem, quer no Brasil ou em outro país.
Ou seja, Kelmon é um padre de araque.
Mesmo com esse “currículo”, o ”padre” Kelmon participou do último debate presidencial, realizado ontem pela TV Globo.
A propósito:
Por que a Globo não barrou a participação do padre de araque?
Por que nem ao menos a Globo alertou os telespectadores sobre a farsa?
Será por que o sonho global continua ser o de levar a eleição para 2º turno?
Se era para levar alguém com 0% nas pesquisas eleitorais, segundo o Datafolha de 29 de setembro, por que não contemplou a Sofia Manzano (PCB) ou a Vera (PSTU), candidatas de esquerda?
Por que a Globo preferiu Felipe d’Ávila (Novo) e o Padre Kelman (PTB), ambos de direita e com 0% nas pesquisas eleitorais?