Mário Scheffer, Estadão – Após forte mobilização de pacientes e familiares, Senado aprovou nesta segunda projeto de lei que obriga planos de saúde a cobrir tratamentos que estão fora da lista obrigatória de procedimentos estabelecida pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), o chamado rol taxativo; cabe agora ao presidente sancionar ou vetar mudança.
Os planos de saúde, alinhados com a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), sofreram retumbante derrota nesta segunda-feira, 29, no Senado Federal.
Ao aprovar em plenário projeto de lei que obriga as operadoras do setor a fornecer tratamentos não incluídos no rol da ANS, os senadores deram também uma resposta à mixórdia deflagrada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Radical e injusto, o julgamento do STJ impôs restrições assistenciais, mobilizou grupos de pacientes e consumidores, sacudiu o Legislativo em ano eleitoral e pautou o STF, que tem programada para o final de setembro uma audiência pública sobre o tema.
Talvez pela arrogância e desenvoltura com que circulam em Brasília e na mídia, as empresas de planos de saúde e os lobistas que as representam tenham perdido a noção do momento e do tamanho da briga que chamaram para si.
Desta vez mexeram com histórias de vidas que não têm nada a ver com facilidades.
Quem já sofreu com demora no diagnóstico de um filho, com banalização de sintomas, julgamentos cruéis após longas jornadas de pesquisa e peregrinação, quem passou por situações de angústia, batalhas travadas em grande solidão, fontes de sofrimento físico, emocional e social, não tem nada mais a perder.
Nos últimos meses, antes mesmo da decisão do STJ, se fizeram ouvir as famílias e crianças com doenças raras ou condições genéticas que pedem cuidado contínuo e complexo, as pessoas com deficiências, com transtorno do espectro autista e outras situações crônicas de saúde.
O que já estava reservado ao aporrinhamento de um 0800 ( “o plano não cobre, senhor, o procedimento não está no rol” ) se transformou em debate sobre necessidades de saúde e definição de direitos.
Tratamentos experimentais, sem evidência científica, que não tenham sido recomendados por comissão ou órgão de incorporação de tecnologias em saúde continuam, corretamente, fora do rol, é o que se depreende da lei aprovada.
Arautos do caos, a Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge) correu para afirmar que haverá um “colapso sistêmico” da saúde no Brasil, enquanto o presidente da ANS disse que a lei vai “desequilibrar” o setor, colocando em risco 80% das operadoras.
Vamos ver se nas ações que prometem ajuizar contra a decisão do Parlamento, serão capazes de sustentar as mentiras que disseminam.
O repertório de razões do mercado vai aos poucos se esvaindo.
A alegação de que “sua doença não cabe na mensalidade que você paga” não passa mais, até porque, em muitos casos, beira o capacitismo e a discriminação.
Malogrou a solução empresarial de exclusão dos “gastadores”.
A máxima “atendeu-pagou” não se adequa a relações de pré-pagamento e quem tem plano contribui, imperiosamente, para a coletivização do risco.
A frequência dos que precisam de muitos procedimentos ou atendimentos de alto custo é pequena, diferentemente do que fazem divulgar as operadoras. A maioria, que excepcionalmente gera gastos significativos, é solidária.
Aprovado pelo Senado sem alterações, o projeto que veio da Câmara dos Deputados seguiu para a sanção presidencial.
O epílogo do movimento “rol taxativo mata” está agora no colo de Bolsonaro, que terá muito a perder se a sua decisão for pelo veto.