O Ministério Público do Rio (MP-RJ), antes de reiniciar as investigações sobre a prática de rachadinha no gabinete do então deputado estadual Flávio Bolsonaro, hoje senador pelo PL, quer saber com que provas poderá contar ao longo da ação para fundamentar a nova denúncia e se reorganiza para a retomada do processo.
O gabinete do procurador-geral de Justiça, Luciano Mattos, teme que a decisão tomada em maio pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça, ao rejeitar a denúncia do MP-RJ contra Flávio, invalide a reapresentação de determinadas provas.
Depois que o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Superior Tribunal de Justiça (STJ) anularam algumas das principais provas da denúncia, o MP-RJ requereu ao Tribunal de Justiça a extinção do feito, para recomeçar do zero todo o trabalho. No entanto, o Órgão Especial do TJ-RJ, em vez de acolher o pedido de extinção, optou por rejeitar a denúncia, com base no que prescreve a legislação penal.
Com a rejeição da denúncia, a defesa de Flávio sustenta a tese de que a investigação está encerrada e não pode ser reiniciada. A advogada Luciana Pires disse que, se o MP-RJ tentar pedir nova quebra de sigilos, “incidirá na teoria dos frutos da árvore envenenada”, pois as mesmas provas já foram “consideradas ilícitas”.
O procurador-geral de Justiça, para sanar as dúvidas e se certificar do que é legal, sem incorrer em futuras nulidades, ajuizou embargos de declaração junto ao Órgão Especial. O objetivo é “esclarecer eventuais omissões e contradições na decisão proferida no dia 16 de maio pelo Órgão, que rejeitou a denúncia ajuizada no caso das rachadinhas”.
Fundação de denúncia
Dois dos 25 desembargadores do Órgão consultados pelo GLOBO explicaram que a decisão não impede o reinício das investigações nem o oferecimento de denúncia baseada em novas provas. A questão, porém, é fixar com segurança se provas revalidadas da denúncia anterior fundamentarão a nova denúncia.
— Só quando a nova denúncia for oferecida, o colegiado avaliará a validade das provas — disse um dos desembargadores.
Sob a relatoria do ministro Gilmar Mendes, o STF anulou quatro dos cinco relatórios (RIFs) produzidos pelo então Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) para a investigação contra Flávio. Na ocasião, o ministro alegou, entre outros fatos, que o MP-RJ havia solicitado os quatro RIFs antes mesmo do início oficial da investigação contra o filho mais velho do presidente Jair Bolsonaro, medida considerada ilegal.
Na sequência, o STJ anulou as decisões de quebra de sigilos fiscal e bancário proferidas pelo juiz Flávio Itabaiana, titular de 27ª Vara Criminal da Capital. Os ministros entenderam que o juiz não tinha competência e que as decisões careciam de fundamento.
Das provas poupadas da nulidade, restou, por exemplo, o primeiro relatório produzido pelo Coaf sobre a prática das rachadinhas, no âmbito da Operação Furna da Onça, com 22 deputados envolvidos, incluindo Flávio. A quantia desviada somava, em 2018, cerca de R$ 207 milhões.
A tendência, com a abertura da nova investigação, é de a apuração partir da estaca zero, usando como ponto de partida o primeiro RIF. Na tentativa de validar as provas anuladas, o MP-RJ deverá ajuizar medidas cautelares de quebra de sigilo bancário, fiscal e telemático, além da requisição de outros RIFs, com um período de tempo mais limitado, ao Órgão Especial do TJ.
Como a denúncia anterior, sob a relatoria da desembargadora Maria Augusta Vaz Monteiro de Figueiredo, foi rejeitada, a tendência é que os pedidos sejam redistribuídos.
*Com Folha de Pernambuco