A Policia Federal (PF) instaurou na quarta-feira da semana passada o inquérito que vai apurar as declarações dadas pelo presidente Jair Bolsonaro em “live” realizada em 21 de outubro do ano passado. Na época, ele apontou uma ligação entre a vacinação contra a Covid-19 e o desenvolvimento da Aids, o que não é verdade.
A decisão de abrir o inquérito foi tomada no começo de dezembro do ano passado pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), mas a investigação na PF começou apenas na semana passada, e chegou oficialmente ao conhecimento da Corte na última quarta-feira.
Em documento enviado ao Supremo Tribunal Federal (STF), a delegada Lorena Lima Nascimento, responsável pelo inquérito, disse querer a ajuda das autoridades sanitárias do Reino Unido e dos Estados Unidos para auxiliar nas apurações. Ela disse que foi expedido um ofício à Coordenação-Geral de Cooperação Internacional da PF pedindo duas providências.
A primeira delas é procurar o Departamento de Saúde e Assistência Social do Reino Unido para responder se teriam sido divulgadas em sites oficiais do país, conforme chegou a dizer Bolsonaro, a informação de que “os totalmente vacinados […] estão desenvolvendo a síndrome de imunodeficiência adquirida muito mais rápido do que o previsto”.
Ela também quer que seja procurado o Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas – NIAID, dos Estados Unidos. O objetivo é “saber se existe alguma publicação de profissionais que compõem o instituto, em especial do médico imunologista Anthony Fauci do NIAID, concluindo que a maioria das mortes da gripe espanhola tenham acontecido devido a uma pneumonia bacteriana secundária, e que a proliferação essa bactéria esteja associada ao uso de máscaras”. Essa declaração também foi dada por Bolsonaro durante a transmissão ao vivo.
Como medidas iniciais da investigação, a Polícia Federal também vai transcrever o inteiro teor da transmissão ao vivo. Vai ainda identificar e pesquisar a confiabilidade dos sites que serviram de base para as informações replicadas por Bolsonaro, ou seja, “se existem relatos em outras fontes de informação sobre tais sítios serem conhecidos por transmitirem informações verdadeiras ou fake news”. A delegada também pediu ao ministro Alexandre de Moraes, relator do inquérito no STF, o compartilhamento de uma investigação preliminar sobre o assunto conduzida pela PGR.
No documento, a delegada informou que instaurou a investigação, cumprindo decisão tomada por Moraes no começo de dezembro do ano passado. Ele atendeu um pedido da CPI da Covid, que funcionou no Senado em 2021, e determinou a abertura do inquérito. Bolsonaro está sendo investigado pelos crimes de epidemia, de infração de medida sanitária preventiva e de incitação ao crime.
“Não há dúvidas de que as condutas noticiadas do Presidente da República, no sentido de propagação de notícias fraudulentas acerca da vacinação contra o Covid-19 utilizam-se do modus operandi de esquemas de divulgação em massa nas redes sociais, revelando-se imprescindível a adoção de medidas que elucidem os fatos investigados, especialmente diante da existência de uma organização criminosa – identificada no Inquérito 4.781/DF (que justificou a distribuição por prevenção desta Pet) e no Inquérito 4.874/DF”, diz trecho da decisão de Moraes, citando os inquéritos também relatados por ele que apuram ataques ao STF e atos antidemocráticos.
Em manifestação enviada ao STF em 2021, Bolsonaro argumentou que a CPI estaria usurpando atribuições do Ministério Público. Também no ano passado, a Procuradoria-Geral da República (PGR) se manifestou de forma parecida. Moraes, por outro lado, destacou que a CPI pode sim pedir a abertura de inquérito. O Ministério Público, do qual a PGR faz parte, tem exclusividade para conduzir a ação penal, que é uma etapa mais avançado do processo.
Para se posicionar contra o pedido da CPI, a PGR também havia argumentado já conduzir uma investigação interna sobre a “live”. Moraes, porém, ponderou que não basta “a mera alegação de que os fatos já estão sendo apurados internamente”. O ministro argumentou que “é indispensável que sejam informados e apresentados no âmbito do procedimento que aqui tramita, documentos que apontem em quais circunstâncias as investigações estão sendo conduzidas, com a indicação das apurações preliminares e eventuais diligências que já foram e serão realizadas”. E acrescentou: “Apenas dessa forma é possível ter uma noção abrangente e atualizada dos rumos dessa fase da persecução criminal.”