Após um ano e nove meses à frente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Luís Roberto Barroso teve de conviver com ataques do presidente Jair Bolsonaro à confiabilidade do sistema eleitoral brasileiro e com insinuações, menos ou mais explícitas, de que poderia não respeitar uma derrota nas urnas.
Antes de passar o bastão ao seu colega Edson Fachin no próximo dia 22, Barroso avalia que a suspensão do aplicativo de mensagens Telegram é uma medida viável durante as eleições deste ano. A plataforma, criada por russos e com sede em Dubai, tem ignorado as tentativas de notificação feitas pelo TSE para cooperar no combate à desinformação.
Em entrevista exclusiva para assinantes, Barroso diz que as investidas do titular do Planalto contra as urnas eletrônicas revelam “limitações cognitivas e baixa civilidade”, enquanto favorecem a atuação de milícias digitais — uma relação investigada pela Polícia Federal.
A seguir, leia trecho da entrevista.
É realmente viável a possibilidade de o Telegram ser banido do Brasil?
Nenhum ator relevante no processo eleitoral pode atuar no país sem que esteja sujeito à legislação e a determinações da Justiça brasileira. Isso vale para qualquer plataforma. O Brasil não é casa da sogra para ter aplicativos que façam apologia ao nazismo, ao terrorismo, que vendam armas ou que sejam sede de ataques à democracia que a nossa geração lutou tanto para construir.
Como já se fez em outras partes do mundo, eu penso que uma plataforma, qualquer que seja, que não queira se submeter às leis brasileiras deva ser simplesmente suspensa. Na minha casa, entra quem eu quero e quem cumpre as minhas regras.
Na abertura do ano Judiciário no TSE, o senhor disse que o presidente da República vazou a estrutura interna da área de Tecnologia da Informação da Corte. Na prática, Bolsonaro cometeu crime?
Eu não tenho que julgar. Eu me referi ao relatório da delegada que conduz o inquérito e que tem uma opinião que merece ser respeitada. A delegada tem estabilidade. E isso dá o tom do que de fato aconteceu. Ainda na gestão anterior do TSE, houve uma tentativa de invasão (do sistema).
Foi instaurado um procedimento sigiloso no TSE, um inquérito sigiloso na Polícia Federal no qual foram requeridas informações sensíveis sobre a arquitetura interna do TSE e esse material foi colocado na rede social do presidente. O presidente facilitou a vida das milícias digitais.