Na reta final do ano passado, nos dias entre o Natal e o Ano Novo, quando Brasília costuma ficar vazia de autoridades, o ministro das Comunicações, Fábio Faria, enviou um ofício ao relator do orçamento, o senador Márcio Bittar (PSL-AC), pedindo que 31 prefeituras do seu estado-natal e berço político, o Rio Grande do Norte, fossem agraciadas com verbas do chamado orçamento secreto, informa Malu Gaspar, O Globo.
As informações constam de um pacote de documentos enviados por Bittar à Comissão Mista de Orçamento. Nele, há pedidos de prefeituras, deputados e senadores com indicações de repasses em emendas de relator.
Até hoje se pensava que as destinações dessas emendas eram feitas pelo relator-geral do Orçamento a partir de uma distribuição feita exclusivamente dentro do Congresso. Com o envio do ofício, ficou claro que até ministros deram um jeito de conseguir enviar dinheiro do orçamento secreto para suas bases.
No dia 27 de dezembro, Faria enviou a Bittar um ofício pedindo a liberação de R$ 25 milhões em emendas parlamentares do RP9, jargão como são chamadas as emendas de relator, para prefeitos do seu estado. Quase a metade das cidades atendidas são governadas por políticos de seu partido, o PSD.
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E embora ele seja ministro das Comunicações, todos os pedidos foram por liberações para a área de saúde.
Faria não estava licenciado do cargo de ministro, como fizeram alguns de seus colegas na Esplanada que foram eleitos deputados, a exemplo de João Roma, ministro da Cidadania, que deixou o cargo por dois dias, em novembro, para reservar recursos do orçamento de 2022 em emendas parlamentares.
O ofício que ele enviou a Bittar foi encaminhado em papel timbrado do Ministério das Comunicações e assinado com a identificação de ministro.
Apesar de ser uma fração perto dos quase R$ 17 bilhões em emendas de relator que deputados e senadores enviaram às suas bases eleitorais em 2021, o documento sugere que carimbar o orçamento secreto não foi exclusividade de parlamentares.
Informações mais detalhadas sobre quem são os autores do repasse de verbas das emendas de relator só se tornaram possíveis após decisão da ministra Rosa Weber, do STF, em novembro, mandando suspender todos os pagamentos desse tipo de emenda parlamentar.
Ela determinou que fossem tornadas públicas todas as informações sobre os parlamentares beneficiados, os locais para onde o dinheiro foi enviado e quais os critérios para a distribuição dos recursos. O plenário do STF confirmou a decisão da ministra por 8 votos a 2.
Como resposta, a cúpula do Congresso baixou uma resolução determinando que todos os repasses feitos a partir de então tivessem seus autores divulgados. Isso destravou o impedimento de Weber. Mas ainda assim, em boa parte das vezes, só aparecem ofícios de prefeitos com pedidos de recursos federais, nada de parlamentares.
O ofício enviado por Fábio Faria a Bittar foi encaminhado à Comissão Mista de Orçamento, como determina a resolução do Congresso, junto com dezenas de outras indicações feitas por parlamentares (deputados e senadores) e pedidos de prefeitos.
pacote de ofícios foi resumido em um documento assinado por Bittar, endereçado à presidente da CMO, Rose de Freitas (MDB-ES), informando que os pedidos serão encaminhados aos devidos ministérios “com as indicações de beneficiários de emendas RP9 ‘Emendas de Relator Geral’, bem como os documentos que baseiam a indicação, para que seja dada a devida publicidade”.
Procurada, a assessoria do ministro Fábio Faria disse que qualquer pessoa pode fazer indicações para o relator do Orçamento.
“O ofício não se refere a uma emenda parlamentar, mas, sim, à emenda do próprio relator do orçamento, o que permite que qualquer pessoa física ou jurídica possa solicitar recursos ao relator”, afirma a nota. “O ofício foi assinado pelo ministro Fábio Faria enquanto ministro por ser o cargo que ocupa atualmente, não havendo nenhum impedimento para o pleito”.
A assessoria do ministro acrescentou que “cabe sempre ao relator deliberar sobre a contemplação dos recursos indicados”.