A capa do Estado de Minas, bela em sua dramaticidade (abaixo), não denuncia apenas a negligência do governo federal no combate aos incêndios que já destruíram um quarto do Pantanal, muitos de origem sabidamente criminosa, porque ateados por fazendeiros criadores de gado.
A foto é um dedo acusador apontado também contra o próprio jornalismo que, apenas agora, quando já faz tanto tempo que a Amazônia e o Pantanal ardem em chamas, traz a público, e ainda assim num jornal de dimensão regional, o indizível sofrimento e o estado de desespero a que estão sendo submetidos bombeiros, brigadistas, voluntários e veterinários que lutam heroicamente contra as chamas e tentam salvar animais que estão morrendo naquele inferno.
Você está vendo esta capa de um jornal mineiro, mas certamente não viu ainda uma reportagem com imagens o dramáticas como esta no Jornal Nacional.
As emissoras de tevê, sobretudo a Globo e seus principais programas jornalísticos – JN, Fantástico e Globo Repórter -, não tiveram interesse até agora em produzir uma reportagem definitiva sobre o assunto, capaz de causar indignação e, talvez, provocar uma mudança de atitude por parte do governo.
A pauta está caindo de madura, mas o JN limita-se a um interminável desfile diário de imagens dos incêndios, repetitivas, as de hoje muito parecidas com as de ontem, quase monótonas, com escassa dimensão humana e sem olhar atento sobre o sofrimento dos personagens daquele cenário.
É bastante provável que esta reportagem ainda não tenha sido feita porque qualquer VT muito comovente sobre os dramas humanos daquele desastre levará o telespectador a pensar no envolvimento do agronegócio, como causador dos incêndios ou como beneficiário deles.
A Globo está respeitando o limite de sua linha editorial. E a Globo, como se sabe, é Agro, em campanhas publicitárias nos intervalos e em matérias de exaltação nos próprios telejornais.A Globo esconde como pode o sofrimentos dos heróis do Pantanal.
É perceptível que, quando exibe algum VT mais forte sobre os incêndios, o JN dá um jeito de botar no ar alguma matéria paralela, mesmo que em outro bloco, sempre longa, sobre as maravilhas do agronegócio.
Estivesse mesmo interessada em fazer jornalismo com a profundidade de que é capaz, a Globo já teria embarcado um repórter como Marcelo Canelas e um de seus ótimos cinegrafistas ao Pantanal para passar uma semana no local do combate aos incêndios e voltar de lá com reportagens dignas de prêmio para o JN, para o Fantástico e para o Globo Repórter.
Como fez no fim dos anos 1990, mesmo durante o governo FHC, que apoiava, pautando o mesmo Marcelo Canelas para uma série de reportagens que denunciou, enfim, a desgraça da fome no Brasil, e foi premiada pela ONU.
É bem verdade que, naquela ocasião, a reportagem só foi ao ar depois de alguma luta interna no departamento de jornalismo, porque alguns diretores tentaram vetá-la.
Mas isto é outra história, que apenas prova que, seja onde for, é necessário brigar pelo jornalismo.
*Com informações do DCM